Luedji Luna conta por que não quer ser vista como "porta-voz de uma causa"
Luedji Luna é mais que um corpo no mundo. Há cerca de dois anos, Um Corpo no Mundo, um de seus hits, vem sendo cantado pelo público que lota seus shows (como o que faz no Festival Popload, em São Paulo, no dia 15 de novembro), encantado com a serenidade da voz e a poesia das letras da cantora e compositora baiana.
Filha de militantes do movimento negro - o pai é historiador, a mãe é economista - Luedji estudou Direito, como que num "projeto político" para ocupar espaços de poder, historicamente negados ao povo negro no Brasil. A música veio como uma função tardia: aos 25 anos, engavetou o diploma para se dedicar a compor e cantar, coisa que nunca tinha feito para valer na vida.
Aos 30, já tendo trocado sua Salvador Natal por São Paulo, a cantora batizada em homenagem à rainha africana Lueji A'Nkonde lançou seu primeiro disco (Um Corpo no Mundo, 2017) e foi indicada à artista revelação no Prêmio Multishow. Hoje, aos 32, ela segue colhendo os frutos de uma carreira em ascensão para compensar todo o tempo em que viveu distanciada da arte.
"Eu neguei a música por tanto tempo porque eu não me via possível. Eu tinha poucas referências de compositoras pretas com visibilidade e sucesso no Brasil, vim de uma família que não era de artistas, não tinha nenhuma referência em casa. Para mim sempre foi algo restrito ao campo dos sonhos", conta Luedji, em entrevista ao UOL.
"Foi bom por um lado, porque eu cheguei na música madura, quando eu já sabia o que eu queria dizer. Eu já não era mais novinha, não estava mais experimentando a vida, já não tinha tempo a perder. Por outro lado, passei um longo período distante do meu caminho, perdi saúde, contentamento, mas agora eu estou bem", conta.
Poesia x gritos de guerra
Apesar de ter sido criada num ambiente de muita militância e consciência política, e de ter surgido na carreira artística num momento delicado para a cultura no Brasil, na hora de compor, Luedji prefere a poesia às frases de efeito, as metáforas ao grito de guerra. Ela nem de longe quer ser vista como uma "heroína" ou "porta-voz de uma causa".
"Ser mulher negra é uma condição imutável para mim, o mundo é que tem que mudar. É claro que as opressões todas que sofri atravessam meu corpo, minha existência, mas minha música não nasce a serviço de uma bandeira, de uma pauta específica. Não trago essa narrativa da mulher negra pobre, que não teve família, que passou fome, essa não é a minha história. E acho importante falar isso para mostrar que existe a pluralidade de narrativas entre o povo negro", explica.
Minha música é mais do que resposta a uma violência específica, eu gosto da poesia. Apesar de eu ter surgido na música nesse contexto em que a arte é muito política, eu prefiro seguir outros caminhos, mais poéticos. Desde que o mundo é mundo, o machismo e o racismo estão aí, e a despeito dessa violência toda, a Luedji Luna está aqui existindo. É claro que ser uma mulher negra com voz é uma responsabilidade grande, sim, mas ser adulto é isso, né? É ter responsabilidade.
E, para ela, a responsabilidade passa por carregar a história do povo negro. Em suas canções, ela mistura música brasileira e africana, passeando por MPB, jazz, samba e reggae. Conta também com uma banda multiétnica: o queniano Kato Change (guitarra), o filho de congoleses François Muleka (violão), o cubano Aniel Somellian (baixo elétrico), o baiano Rudson Daniel e o sueco Sebastian Notini (ambos na percussão) têm acompanhado Luedji pelo Brasil e pelo mundo.
Frequentadora do bloco Ilê Aiyê nos carnavais da Bahia, Luedji convidou os integrantes para uma espécie de show de abertura da apresentação que faz no Popload, por sugestão da própria organização do festival.
"Vou cantar algumas músicas com eles, minhas próprias canções e releituras de compositoras baianas", diz, sem querer dar "muito spoiler", inclusive sobre seus próximos passos na carreira. "Já estou começando a pensar no próximo disco, que provavelmente sai em 2020. Um Corpo no Mundo tem uma proposta muito original e autêntica, que teve uma receptividade enorme, então não espere nada diferente de mim", adianta.
POPLOAD FESTIVAL 2019
Com shows de Patti Smith, The Raconteurs, Hot Chip, Tove Lo, Cansei de Ser Sexy, Little Simz, Khruangbin, Boy Pablo, Luedji Luna e o bloco Ilê Aiyê
Quando: 15 de novembro
Onde: Memorial da América Latina (Av. Auro Soares de Moura Andrade, 664 - Barra Funda, São Paulo)
Horários: Abertura dos portões às 10h; início dos shows às 10h45
Ingressos: pista R$ 580 (inteira), pista premium R$ 800 (inteira)
Onde comprar: www.ticketload.com e bilheteria do Unimed Hall
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