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Em Pico da Neblina, da HBO, legalização da maconha prejudica traficantes de drogas

Biriba e Salim em cena da série Pico da Neblina, da HBO - Divulgação/HBO
Biriba e Salim em cena da série Pico da Neblina, da HBO Imagem: Divulgação/HBO

Felipe Branco Cruz

Do UOL, em São Paulo

04/08/2019 04h00

Biriba vende maconha como ninguém. Logo na primeira cena de Pico da Neblina, série brasileira da HBO que estreia hoje, às 21h, descobrimos a sua tática. A boa lábia ajuda a convencer os clientes a comprarem o seu produto, mas é a qualidade da erva que faz sucesso com os consumidores.

No primeiro episódio, de 1 hora de duração, o traficante surge ajoelhado ao lado de uma banheira, numa cena que quase nos remete a um ritual religioso. Ele está desmanchando na água um tablete prensado da erva. Ao fundo, ouve-se Assim Falou Zaratustra, de Strauss, em ritmo de reggae. Com uma peneira, ele retira as melhores partes e descarta insetos, lixos e outras impurezas que acompanham a maconha vendida ilegalmente no Brasil.

Na série Pico da Neblina, da HBO, a maconha é legalizada no Brasil - Divulgação - Divulgação
Na série Pico da Neblina, da HBO, a maconha é legalizada no Brasil
Imagem: Divulgação

Uma reviravolta na política muda todo o seu esquema. O Congresso Nacional legalizou o uso recreativo da maconha, o que é uma péssima notícia para os traficantes, mas ótima para Biriba, que vê uma oportunidade de expandir os seus negócios e vender o seu excelente produto de forma legalizada.

A série imagina como seria o Brasil se a maconha fosse legalizada, mas o resultado não é tão simples. Segundo o diretor Quico Meirelles, Pico da Neblina não se posiciona nem contra, nem a favor da legalização, mas a mudança na lei terá desdobramentos para a economia, política e também entre os traficantes que serão apresentados nos outros episódios -- serão dez capítulos na primeira temporada.

A atração é protagonizada pelos atores e amigos de infância Luis Navarro, que interpreta o Biriba, e Henrique Santana, que dá vida a Salim, o dono da boca de fumo da área. Os dois atores, nascidos e criados na Zona Leste de São Paulo, foram escolhidos para atuar na série pelo cineasta Fernando Meirelles (que produz a atração) e seu filho, o diretor Quico Meirelles. A amizade deles na vida real transparece em todas as cenas do primeiro episódio e dá ainda mais verossimilhança aos personagens.

Logo no primeiro episódio somos apresentados ao enredo geral da série. Biriba decide abandonar o crime e vender sua erva legalmente junto com um sócio investidor nada experiente (o humorista Daniel Furlan). Mas Salim resolve seguir como traficante à moda antiga: na ilegalidade.

Protagonista negro

A maioria dos atores de Pico da Neblina são negros e estão ocupando papéis de destaque. É o caso, por exemplo, da família de Biriba, apresentada também no primeiro episódio.

A mãe Irene é interpretada por Teca Pereira. Ela dá vida a uma mulher com um passado tenebroso, marcado pela relação com o marido, o pai de Biriba, que foi um mega traficante e morreu assassinado. Há também a atriz e cantora Leilah Moreno, que interpreta a irmã de Biriba, uma mulher de personalidade forte e mãe solteira de duas crianças. Assim como muitas famílias brasileiras, todos vivem na mesma casa.

A diferença é que o dinheiro para sustentá-las vem da maconha que, pelo menos na ficção, está legalizada.

Biriba e Salim em cena da série Pico da Neblina - Divulgação/HBO - Divulgação/HBO
Elenco principal de Pico da Neblina é predominantemente negro
Imagem: Divulgação/HBO

Ajudinha dos amigos

Embora a série seja dramática, o episódio traz alguns bons escapes cômicos, especialmente na relação de Biriba com seu cliente, o Vini, interpretado pelo humorista do Choque de Cultura, Daniel Furlan.

Vini é um playboy frustrado que vê na legalização da maconha uma oportunidade de criar um negócio de sucesso. Ele sugere a Biriba uma parceria em que ele entraria com know-how e ex-traficante com a erva.

Os dois últimos empreendimentos de Vini, no entanto, foram um fiasco. O primeiro foi uma lan house. "Como eu ia imaginar que a internet ia chegar com tudo", justifica o personagem. E o segundo empreendimento foi uma paleteria (picolés mexicanos) que também não deu certo.

Originalmente, segundo Daniel Furlan, seu personagem não era para ser engraçado, mas a sua interpretação tragicômica para o desastrado empresário deu uma providencial leveza para a série.

Biriba e Salim em cena da série Pico da Neblina - Divulgação - Divulgação
Biriba e Salim em cena da série Pico da Neblina
Imagem: Divulgação

Quando Pico da Neblina estava sendo produzida, em 2015, o diretor Quico Meirelles imaginou que, quando a série fosse lançada, em 2019, a maconha já tivesse sido legalizada no Brasil. Mas o que ele viu foi uma guinada na direção contrária, com as discussões paralisadas no Congresso.

Restou ao diretor apenas imaginar como seria esse hipotético Brasil, tendo como base experiências de outros países que já legalizaram a erva, como parte da Europa, Uruguai, Canadá e Estados Unidos. No primeiro episódio, fica claro que o modelo de legalização adotado pelo Brasil é bastante parecido com o dos Estados Unidos, com um livre comércio regulando as vendas, sem muita interferência do estado.

A única coisa que a série não precisou imaginar foram os dramas sociais, como a pobreza, o preconceito e a violência, esses, sim, ainda são muito presentes no Brasil de hoje.

Trailer de Pico da Neblina

UOL Entretenimento