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"A vida privada deve prevalecer", diz Gilberto Gil sobre biografias

Do UOL, em São Paulo

15/10/2013 11h32

Após a polêmica sobre a proibição de biografias não autorizadas ganhar repercussão, o cantor Gilberto Gil saiu, pela primeira vez, em defesa do grupo a favor da proibição de biografias não autorizadas. A articulação é liderada pelo grupo Procure Saber, que reúne nomes como Roberto Carlos, Caetano Veloso, Chico Buarque, Djavan e Milton Nascimento.

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Ex-ministro da Cultura, Gil se posicionou nesta terça-feira (15) em artigo publicado no jornal “O Globo”. Falando em nome do associação, ele defende que o direito à privacidade é um “elo importante da cidadania” e afirma que na discussão entre a ANEL (Associação Nacional dos Editores de Livros), que é contra o artigo do Código Civil que prevê a autorização para biografias comercializadas, e a Procure Saber, “a soberania decisória sobre a vida privada que deve prevalecer”.

Para Gil, quando o STF julgar a ação de inconstitucionalidade, os juízes estarão entre “A liberdade de expressão de um lado e o direito à privacidade do outro”. O compositor deixa clara sua posição ao citar o que a escolha pelo grupo que pede privacidade acarretaria. “Se a estes contemplarem com seu voto, estarão contrariando os primeiros, os grandes interessados em que vidas pessoais sejam livremente retratadas, transformadas em ativos comerciais de grande valor para a montagem do espetáculo midiático que está, hoje em dia, para muito além do interesse público na circulação da informação, o jornalismo.”

O baiano, que lançou recentemente sua biografia "Gilberto Bem Perto", coescrito por Regina Zappa, ainda afirma que busca “profundo debate” em torno do tema da privacidade e “o que ela significa o que ainda é possível fazer para que ela tenha sentido, para que os que ainda nela creem e confiam possam encontrar nas regras, nas normas e nas leis alguma garantia”.

“O debate afinal toma corpo, podendo contribuir para posicionamentos mais conscientes, mais maduros e mais equilibrados sobre que tipo de vida queremos e podemos viver, se os indivíduos nos confins de suas vidas privadas ainda devem ser levados em conta, ainda reconhecidos e respeitados em seus direitos ou se já não importam mais”, observa Gil no artigo.

“Temos tido sempre justificado apreço pelos que, ao longo da História, se mostram capazes de compreender os dilemas e contradições da vida em sociedade e que, apesar da dor e do sofrimento dessa condição trágica, estão dispostos a reconhecer de que lado estão. Como disse Francisco Bosco referindo-se ao dilema entre o interesse público e o privado, em seu escrito neste jornal, semana passada, é o princípio da soberania decisória sobre a vida privada que deve prevalecer. É a mesma, nossa opinião”.

Entenda o caso
Embora a Constituição preveja a liberdade de expressão, o Código Civil brasileiro possui artigos que vedam a comercialização de biografias não autorizadas. Atualmente, tramita no Congresso um projeto para mudar o Código, do deputado Newton Lima (PT-SP) e, no STF (Superior Tribunal Federal), uma Ação Direta de Inconstitucionalidade referente aos artigos do Código Civil que interferem na questão. O Procure Saber é contra as mudanças.

Segundo o grupo, o posicionamento não tem a ver com censura prévia, mas com a preservação de direitos. "A Procure Saber pretende apresentar proposta de alteração do Código Civil, de forma a acomodar interesses comerciais de todas as partes — escritores, editoras, biografados e seus herdeiros —, cuidando de preservar a intimidade e a vida privada do biografado, que não podem ser subjugados para proteger outros direitos que, de fato, não estão sendo prejudicados ou violados", publicou a empresária Paula Lavigne, que gerencia a carreira de Caetano Veloso.

O grupo é o mesmo que, em julho, conseguiu pressionar o Senado a colocar em pauta e aprovar o projeto de lei que modifica as regras de arrecadação e distribuição de direitos autorais musicais.

Nesta segunda, o presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, afirmou ser a favor da publicação de biografias não autorizadas. "Não acho razoável a retirada do livro do mercado. O ideal seria a liberdade total, mas cada um que assuma os riscos. Se violou o direito de alguém vai ter que responder financeiramente por isso", disse Barbosa, durante debate na Conferência Global de Jornalismo Investigativo, no Rio.

Diversos escritores e artistas também já se manifestaram contra a proibição de biografias. Entre eles, Ruy Castro, Paulo César de Araújo, Alceu Valença e a filha de Adoniran Barbosa.

O STF anunciou que fará audiências, previstas para os dias 20 e 21 de novembro, para discutir a validade dos artigos 20 e 21 do Código Civil. É este trecho da lei que dá margem à proibição de biografias não autorizadas, ao prever que "a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais".