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Museus devem se reinventar para não morrer, diz crítico de arte espanhol

Museu Nacional, localizado na Quinta da Boa Vista, no Rio de Janeiro, antes do incêndio que o destruiu - Pedro Teixeira/Agência O Globo
Museu Nacional, localizado na Quinta da Boa Vista, no Rio de Janeiro, antes do incêndio que o destruiu
Imagem: Pedro Teixeira/Agência O Globo

María Angélica Troncoso

Do Rio

09/07/2019 20h24

Os museus no Brasil e de todo o mundo precisam ter uma visão aberta, um reinvestimento constante e exposições temporárias permanentes para não morrerem no futuro, mas também precisam transcender e abrir espaço para campos que antes não eram considerados, como a fotografia.

Essa é a opinião de Juan Manuel Bonet, poeta, crítico de arte, gestor cultural e escritor espanhol, um dos convidados especiais da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) - que começa nesta quarta-feira - e que conversou com a Agência Efe nesta terça-feira.

Bonet, que já esteve à frente do Instituto Valenciano de Arte Moderna (Ivam); do Museu Nacional Centro de Arte Reina Sofia e foi diretor-geral do Instituto Cervantes, fará parte do grupo de especialistas que conversarão sobre o futuro dos museus no festival literário que acontece até o próximo dia 14 na cidade histórica de Paraty, que na semana passada recebeu o título de Patrimônio Mundial da Unesco.

Tomando como ponto de partida a tragédia do incêndio ocorrido em setembro do ano passado no Museu Nacional do Rio de Janeiro, que destruiu 90% de um dos acervos mais importantes da América Latina, a Flip - em associação com a Casa Europa - organizou uma série de conversas com especialistas no tema de diversos países que acontecerão no centro histórico de Paraty.

Para o gestor cultural espanhol, o incêndio no Museu Nacional "foi uma desgraça". Mas Bonet também foi enfático ao afirmar que não quer "sangrar o Brasil" falando dessa tragédia, pois "(a catedral de) Notre-Dame (em Paris) também pegou fogo" e uma catástrofe dessas caraterísticas "é algo do qual ninguém está a salvo".

Como um aperitivo da programação que será desenvolvida na Flip, Bonet falou das fragilidades e da força dos museus, mas sobretudo dos desafios que essas instituições devem enfrentar se quiserem sobreviver em um mundo em constante transformação.

Segundo o espanhol, o museu é o lugar onde permanece a memória e, por isso mesmo, deve ser considerado como "um conservatório que acumula a riqueza cultural de um país".

Assim, os museus devem se reinventar continuamente, abrir novos espaços e criar mais conexões com outras artes.

"Tenho interesse nas fronteiras entre as artes, acredito que é muito interessante que um museu faça uma exposição sobre um poeta ou um escritor. Esse diálogo é a razão própria da criação na qual confluem as diversas artes", afirmou.

Comunicar-se com os avanços da tecnologia e promover seu caráter itinerante também são fatores que devem ser levados em conta pelos museus, segundo Bonet, que os entende como caminhos pedagógicos com os quais essas instituições ganharão mais adeptos e que permitirão sua expansão para o interior de seus países de origem e para o mundo.

"Os museus devem usar a tecnologia para divulgar seu conteúdo, atrair o público e mostrar o que não se vê, porque nem tudo que existe em um museu pode ser exibido", explicou.

Para isso, o gestor cultural considera que é importante que os museus contem com sistemas modernos de digitalização de obras e com programas didáticos que aproximem seu acervo do público, que também tenham boas relações com outras instituições e sejam mais itinerantes para se tornarem conhecidos.

Para o espanhol, a vida dos museus está nas mostras temporárias. "Se um museu não tem exposições temporárias, ele morre", opinou.

Bonet também ressaltou que entre as atividades constantes que um museu deve realizar estão: fazer boas aquisições, estar muito atento ao mercado, às heranças familiares e às oportunidades de obter uma boa coleção, além de atender a campos que antes não eram considerados, como a fotografia - "algo para o qual o Moma (Museu de Arte Moderna) de Nova York já mostrou o caminho", disse.

Curador de exposições sobre o ultraísmo, o construtivismo polonês e o surrealismo, assim como de retrospectivas de pintores como os espanhóis Picasso e Juan Gris, o americano Alex Katz, e a brasileira Tarsila do Amaral, Bonet também foi autor de vários trabalhos e livros sobre poesia e arte.

Entre suas obras estão "Via Labirinto", que reúne vários poemas, o "Diccionario de las Vanguardias en España", e livros sobre Ramón Gómez de la Serna e Julio Cortázar.

Amante da arte e da arquitetura brasileiras, das quais destacou os trabalhos de Oscar Niemeyer, do paisagista Roberto Burle Marx e de Lina Bo Bardi, Bonet também publicou um livro sobre São Paulo ("Fervor da Metrópole", Pinacoteca Do Estado, 2010) com José María Ballester, fotógrafo com quem deve lançar outro livro sobre o Rio de Janeiro.