Presença de Anitta

Com show da maior representante do gênero, funk pediu passagem e se instalou no Rock in Rio

Renata Nogueira Do UOL, no Rio de Janeiro Wallace Teixeira/Futura Press/Estadão Conteúdo

"O nosso grito de socorro está ecoando, está sendo ouvido"

Cidinho, da dupla Cidinho e Doca, resume o sentimento dos artistas de funk que tiveram a primeira oportunidade de mostrar sua arte no Rock in Rio. Autores do Rap da Felicidade, uma das músicas que apresentou o funk carioca ao Brasil com o refrão "eu só quero é ser feliz...", a dupla pode ver seus versos ecoarem em pelo menos três palcos do festival no mesmo dia.

Nascidos no Rio de Janeiro, o Rock in Rio e funk sempre estiveram próximos. O festival teve sua primeira edição em 1985, enquanto o ritmo chegaria quatro anos depois, em 1989, com o lançamento do primeiro LP de DJ Marlboro. Mas levou 30 anos para que eles se encontrassem.

Em 2019 o Rock in Rio abraçou Anitta, abriu suas portas para as comunidades com o Espaço Favela e finalmente se rendeu ao funk que é hoje o ritmo mais ouvido do Brasil. Misturado e renovado, ele soube conversar com as atrações internacionais e tradicionais.

A renovação também pode ser vista no público muito mais diverso, colorido e aberto à novas ideias. Com exceção do Dia do Metal, com uma multidão de camisas pretas, o UOL viu o ritmo ser consumido no festival todos os dias.

Wallace Teixeira/Futura Press/Estadão Conteúdo
Luciola Villela/ UOL

Funk, funk e funk: Em todos os lugares do Rock in Rio

Anitta chegou ao Rock in Rio muito antes de se apresentar no Palco Mundo. Desde o primeiro fim de semana de festival sua música era garantia de atenção e interação em ativações das patrocinadoras, como a Coca-Cola, que montou um palco próprio e não economizou nos funks para atrair o público. Deu certo.

A condição de Anitta em manter suas raízes para entrar no Rock in Rio ainda abriu as portas para que outros artistas ganhassem atenção sem moderação. Kevin O Chris não esteve fisicamente no festival, mas seus hits 150 BPM também dominaram nos espaços de marcas parceiras e no show do Heavy Baile. O coletivo também lembrou a poderosa no Espaço Favela ao tocar Onda Diferente e já faz campanha por mais espaço para o ritmo no festival.

O funk é o gênero que mais representa o Brasil. Por ser tão forte, ele precisa ocupar outros palcos MC Thai, do Heavy Baile

Para Sabrina Ginga, fica impossível fechar os olhos para a vontade da nova geração. "O funk é o gênero contemporâneo brasileiro mais ouvido, mais impulsionador da juventude, da transição de gerações mesmo", disse a bailarina.

Ivete Sangalo ousou e também fez questão de levar funk para o seu show que aconteceu seis dias antes do de Anitta. A baiana fez um medley de hits com Onda Diferente, de Anitta, Ludmilla e Snoop Dogg, além de trechos de Cerol na Mão, do Bonde do Tigrão, e Vai Lacraia, de MC Serginho.

Bruna Prado/UOL Bruna Prado/UOL
Divulgação

No dia de seu show, Anitta ainda viu suas músicas em por outros palcos. Ludmilla, que com ela tem Favela Chegou e Onda Diferente, cantou as duas músicas no Sunset na homenagem aos 30 anos do funk. O duo Tropkillaz, que gravou com Anitta Vai Malandra e Bola Rebola, foi uma das atrações do New Dance Order, o palco eletrônico do Rock in Rio. Projota, de Cobertor, e Vitão, da recém-lançada Complicado, também tocaram no Sunset. E Kevinho, que cancelou em cima da hora, ainda assim garantiu Terremoto no show do Funk Orquestra, que também teve Show das Poderosas, Bang e Sua Cara horas antes de elas serem repetidas no Palco Mundo. De quebra, ainda se apresentou com o Black Eyed Peas.

Wilton Junior/Estadão Conteúdo

Show da Poderosa

Anitta preparou o terreno em 2017, ganhou seu espaço em 2018 e chegou com o pé na porta em sua estreia em terras cariocas depois de cantar em Lisboa. Cria do funk, a cantora celebrou suas raízes no palco Mundo e deixou seu lado pop em segundo plano, justamente o que havia sido pedido pra ela em suas primeiras conversas com o festival.

Meu sonho era ter o funk reconhecido. Desde o meu início, por ser uma artista de funk, o tratamento sempre era diferente. Era de qualquer jeito, sem estrutura. Eu sempre quis trabalhar para que isso mudasse.

Anitta levou um paredão da Furacão 2000 para o seu cenário e fez três trocas de roupa durante uma hora de show. Ela ainda voltou para cantar com os americanos do Black Eyed Peas - com quem tem uma parceria gravada - e se apresentou no palco de um dos patrocinadores no mesmo dia.

Para abrir seu show, a poderosa mandou o recado ao entregar o microfone para MC Andinho. Figurão da cena funk do Rio de Janeiro desde os anos 90, ele deu início à apresentação ao som do famigerado Rap das Armas emendado com o aclamado Rap da Felicidade, de Cidinho e Doca, da Cidade de Deus. Ainda que Anitta tenha inúmeras parcerias com artistas nacionais e internacionais, o MC de Duque de Caxias foi o único convidado a subir no palco dela. O recado foi dado.

"A Anitta é uma das maiores representantes do funk internacional. Ela que começou a levar o funk lá pra fora. Hoje em dia a Sabrina [Ginga, bailarina] viaja para fora pra trampar e a gente vê muita influência do funk e com certeza tem muito da mão dela. Ela pegou nossa sementinha e levou", comenta MC Thai, do coletivo Heavy Baile, que fez um dos shows mais pesadões do Rock in Rio já no primeiro dia de festival.

Que o show da Anitta seja hoje um beliscão em muita gente

Doca, que momentos depois presenciaria sua música abrindo o show da cantora, nascida apenas um ano antes do Rap da Felicidade

ROBERTO FILHO / BRAZIL NEWS

O funk raiz mandou seu recado

Fernanda Abreu voltou ao Rock in Rio para celebrar 30 anos do funk, o gênero que ela também representa. Isso 34 anos depois de cantar pela primeira vez no festival com a banda Blitz. Mas dessa vez ela viu o morro subir naquele palco junto com ela. Durante o show, Buchecha olhou para o céu e avisou Claudinho: chegou a nossa vez, irmão!

A garota carioca ainda fez questão de exaltar DJ Marlboro, que tocaria horas depois com o DJ Meme no New Dance Order. O DJ carioca de 56 anos lançou o EP Funk Brasil em 1989, data que marca o início do gênero com a forma que ele tomou até hoje.

Tati Quebra Barraco quebrou tudo com o coletivo Heavy Baile logo no primeiro dia de festival, relembrando hits de décadas passadas como Dako é Bom e Boladona. Da nova geração, a niteroiense MC Carol se juntou à mamãe e também levantou o Espaço Favela com suas letras poderosas e feministas.

Cidinho, do Rap da Felicidade, resume a sensação de chegar ao Rock in Rio:

Para a gente estar aqui hoje é mais do que uma representação do funk brasileiro. Estamos representando os carregadores de caixa, os MCs que não vieram, os DJ's, muita gente. Agradecer ainda é pouco. Espero que na próxima edição isso tudo possa acontecer de novo.

Folhapress

Rennan da Penha presente

Nem só de gritos contra o presidente Jair Bolsonaro foram feitos os protestos do Rock in Rio. O mundo do funk segue defendendo uma causa há cinco meses: o pedido de liberdade para o DJ Rennan da Penha, criador do Baile da Gaiola.

Organizador da festa de funk que acontecia no Complexo da Penha, o DJ está preso há cinco meses por associação ao tráfico - o que ele e os artistas que o conhecem desmentem.

"Hoje o funk pode tocar em qualquer lugar, mas ele não pode porque está privado de sua liberdade. Porque a Justiça rascista e fascista quer isso. Liberdade para Rennan da Penha", pediu Tchelinho, do Heavy Baile. Dias depois, Emicida reforçou o coro por Rennan da Penha com uma mensagem pedindo a liberdade dele no Palco Sunset do Rock in Rio enquanto cantava Libre.

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