"Penso no que as pessoas da congregação vão achar", diz atriz trans de Euphoria
Desde que estreou na HBO, há duas semanas, a série Euphoria tem causado polêmica (e angariado fãs) por mostrar cenas explícitas de sexo e violência. Inspirada pela série israelense de mesmo nome, acompanhamos a jornada de Rue, uma jovem de 17 anos que luta contra o vício em drogas e procura uma forma de estabilizar sua vida em meio a dúvidas sobre sexualidade, trauma, amizade, amor e mídias sociais.
Tudo isso exibido sem pudor. Em um só episódio, Rue (papel de Zendaya) teve uma overdose; um pai de família (Eric Dane) apareceu em nu frontal, com o pênis ereto, antes de transar com uma adolescente trans; dois jovens protagonizaram uma transa com estrangulamento; e o bullying e o compartilhamento de imagens íntimas correram soltos.
Em entrevista concedida um pouco antes da estreia da série, as atrizes Hunter Schafer (a Jules) e Barbie Ferreira (a Kat), que é filha de brasileira, falaram sobre a suas conexões com as personagens e a importância de uma série adolescente com uma pegada mais real. Veja os principais trechos da entrevista:
O que atraiu vocês para a série e como vocês se envolveram com a trama?
Hunter Schafer: Desde o início tudo parecia muito real e preciso, e podia ter grande repercussão, assim como os personagens. Esta é a minha primeira série. Eu vi o anúncio do teste que algumas mulheres trans estavam compartilhando e uns dias depois a agência de modelos que me representa colocou o meu nome. Veio de lá.
Barbie Ferreira: Eu me lembro que quando eu li [a sinopse] pensei: "Não quero ser pretensiosa, mas eu preciso desse papel". Foi muito estressante para mim porque eu me senti muito conectada com a Kat. Muita gente amiga estava participando dos testes e havia muita pressão, mas eu queria muito essa personagem. Eu pensava: "Essa sou eu, é isso, é isso". Eu gosto de coisas completamente surpreendentes e inesperadas. O roteiro era realmente especial.
Qual é a diferença entre esta série e outras séries sobre adolescentes?
Barbie Ferreira: Não há manipulação. Eu acho que isso é o mais especial. É sobre adolescentes, mas não é um retrato sensacionalista, é bem autêntico e real.
Hunter Schafer: Nós podemos ser complexos em todos os aspectos. A série mostra um nível de conexão dos jovens com a internet como eu acho que ainda não tínhamos visto.
Como são os personagens de vocês e o que eles estão enfrentando?
Hunter Schafer: A Jules é nova na cidade, vai começar o desafio do ensino médio e rapidamente encontra uma melhor amiga, a Rue. A Jules tem uma rotina em função da sexualidade dela. Ela quer se sentir bem consigo mesma, então desenvolveu uma rotina para isso, por exemplo se relacionar com homens brancos mais velhos, casados e cisgênero para afirmar a sua feminilidade. Mas esse caminho não é saudável, é tóxico. Então, quando ela chega a esta cidade, tem a oportunidade de mudar esse comportamento.
Barbie Ferreira: A Kat gosta de passar despercebida na vida real, mas tem uma vida dupla na internet, com um blog de fanfiction e até webcam. Ela tem pavor de não ser aceita como é, então encontra na internet uma saída para ser vista como um ser sexual; ela deixa de ser a amiga em quem ninguém presta atenção e se sente importante. Eu acho que é isso que muitos adolescentes querem: se sentir importantes, ou dignos. Todos os amigos da Kat têm uma beleza convencional, são magros. É realmente muito difícil quando você não corresponde ao que os seus colegas de escola acham atraente. Nós vemos a personalidade da Kat aflorando. Ela é muito sarcástica e engraçada.
Quanto vocês usaram das experiências pessoais da adolescência para compor os personagens?
Hunter Schafer: Eu não tive uma experiência comparável à da Jules, mas incorporando o que ela sentiu, precisando afirmar a feminilidade e vendo como isso afetou até o subconsciente dela, eu entendi. Eu estava lá inteira. Eu não vivi isso, mas pude usar esse sentimento para compor a personagem.
Barbie Ferreira: Eu cresci em um ambiente muito aberto. Entrevistei dominatrizes para um programa da Vice e gostaria de explorar essas coisas, então estou mais fascinada do que assustada. Eu acho que fetiches e trabalhos sexuais de modo geral são muito interessantes, porque têm a ver com instintos primários, humilhações. É muito complexo, como a mente humana, em sua forma bruta, sem regras sociais.
Quais são as vantagens de fazer parte de um elenco majoritariamente jovem?
Hunter Schafer: Devido ao nível emocional que devíamos atingir, tivemos que procurar um espaço no qual nos sentíssemos realmente à vontade uns com os outros, para ser real.
Barbie Ferreira: Parte do elenco era de atores experientes e outra grande parte nunca tinha atuado antes, mas estava todo mundo em busca da mesma coisa. Todo mundo estava realmente dedicado. Foi muito bom conviver com essas pessoas durante oito meses. Eu não sei quais serão os nossos próximos trabalhos, mas eu acho que não serão tão divertidos!
Como vocês estão se sentindo perto do lançamento da série?
Barbie Ferreira: Eu estou empolgada, assustada e nervosa. Nunca me senti assim. Eu venho de uma família com a cabeça muito aberta, então é a minha mãe que me tranquiliza. Eu a alertei várias vezes [sobre o conteúdo] e ela repetia: "E daí se você fez cenas de sexo? Isso é arte!".
Hunter Schafer: A minha situação é diferente. A minha família mora na Carolina do Norte, em um universo muito religioso. O meu pai é pastor de uma igreja. Os meus pais estão a par, mas eu fico pensando no que as pessoas da congregação vão achar. É meio estranho, porque eu cresci com elas e agora elas vão ver um lado meu que ninguém na igreja conhece. Também é muito legal. Eu espero que dê tudo certo.
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