"Crônicas de San Francisco" é um presentão da Netflix para o mês do orgulho LGBTQ+
A jornada de "Crônicas de San Francisco" para chegar à Netflix foi longa. A minissérie, que estreou seus dez episódios na última sexta-feira na plataforma, foi criada originalmente em 1978, pelo escritor Armistead Maupin. Inicialmente publicado em forma de capítulos na coluna de Maupin no jornal "San Francisco Chronicle", o primeiro livro dos nove que eventualmente formariam a saga "Tales of the City" logo se mostrou uma obra revolucionária.
É isso mesmo: "Crônicas de San Francisco" se baseia em uma série de nove livros. Escritos entre 1978 e 2014 por Maupin, eles se focam no grupo de residentes da pensão localizada em Barbary Lane, nº 28, na cidade norte-americana de San Francisco, considerada uma espécie de "porto seguro" para a população LGBTQ+ do país.
Os livros cobrem mais ou menos o mesmo período em que foram lançados, e se tornaram uma espécie de documento histórico. "Tales of the City" é um dos principais relatos literários da geração que passou pela epidemia da HIV/AIDS, além de ter sido pioneira em trazer uma protagonista (Anna Madrigal) transgênero.
Nos anos 1990, os três primeiros livros foram adaptados para a TV, pelas emissoras Channel 4 e Showtime. Estas minisséries são a base de onde parte a nova "Crônicas de San Francisco" —e, embora a nova produção possa ser entendida até por quem não assistiu as originais, preparamos um rápido guia dos personagens e acontecimentos que vão te ajudar a aproveitar esse presentão da Netflix para junho, o mês do orgulho LGBTQ+.
43 anos atrás...
Apesar de ter ido ao ar em 1993, a primeira minissérie de "Tales of the City" se passa em 1976. Na San Francisco pós-movimento hippie, a garota do interior Mary Ann Singleton (Laura Linney) decide estender a visita que deveria ser de apenas algumas semanas para morar definitivamente na cidade. Ela logo encontra lugar para morar em Barbary Lane, na pensão de Anna Madrigal (Olympia Dukakis).
Outra residente por lá é Mona Ramsey (Chloe Webb), uma jovem de espírito livre que arranja um trabalho para Mary Ann como secretária do poderoso executivo de publicidade Edgar Halcyon (Donald Moffat). Na segunda minissérie, "More Tales of the City" (lançada em 1998), descobrimos que Mona é na verdade a filha que Anna teve antes de fazer a transição para o gênero feminino.
No novo trabalho, Mary Ann se envolve com o genro do chefe, o arrogante Beauchamp Day (Thomas Gibson), um homem gay em negação que regularmente trai a sua mulher, DeDe (Barbara Garrick). Beauchamp morre em um acidente de carro na segunda minissérie, enquanto DeDe tem filhos com um amante e, depois, engata um romance com D'Orothea Wilson (Françoise Robertson).
Outro residente de Barbary Lane é Michael "Mouse" Tolliver, vivido por Marcus D'Amico e Paul Hopkins nas produções originais. Mouse é um homem gay com um lado sarcástico e um lado romântico, que forma um laço intenso de amizade com Mary Ann, se envolve com o médico Jon Fielding (William Campbell) e eventualmente contrai o vírus da AIDS, se tornando um símbolo de sobrevivência à epidemia para os leitores de "Tales of the City".
O grupo central é completado por Brian Hawkins, que foi interpretado tanto por Paul Gross quanto por Whip Hubley. Um advogado heterossexual com um passado de ativismo, ele flerta com Mary Ann desde sua chegada em Barbary Lane, eventualmente conquistando-a na terceira minissérie, "Further Tales of the City" (de 2001), que termina com o casamento dos dois e com Mouse descobrindo os primeiros sinais do HIV.
Uma nova (e inclusiva) geração
"Crônicas de San Francisco" começa quase 40 anos depois dos eventos de "Further Tales of the City", que se passava em 1981. Descobrimos que Mary Ann e Brian adotaram uma filha, que se tornou Shawna (Elliot Page), agora residente de Barbary Lane. Após dois anos criando a garota, Mary Ann se mudou para Nova York para perseguir uma carreira como apresentadora de TV, chamando Brian para se juntar a ela, mas decidindo ir mesmo quando ele se recusou.
Ela volta para San Francisco para o aniversário de 90 anos de Anna. Com uma filha e um ex-marido que têm profundos ressentimentos em relação a ela, Mary Ann ao menos ainda conta com a amizade de Michael (agora vivido por Murray Bartlett, de "Looking"), que ainda mora na mesma pensão, segue o tratamento da AIDS e namora um rapaz mais novo chamado Ben (Charlie Barnett).
A nova encarnação de "Tales of the City" explica que Mona morreu alguns anos antes da retomada da história, e traz DeDe vivendo um surpreendente novo romance. Nas mãos da roteirista Lauren Morelli ("Orange is the New Black"), este retorno tem o mesmo gostinho do original: com um toque de mistério que empurra a série para o território do "novelão", mas um olhar afiado para a abordagem de causas sociais, é uma série divertida e importante ao mesmo tempo.
Um grande tema de "Crônicas", por exemplo, é a convivência entre os personagens que já conhecemos e a nova geração de pessoas LGBTQ+ de San Francisco. A trama introduz novos residentes ou frequentadores de Barbary Lane, como Shawna, Ben, o rapaz transgênero Jake (Garcia) e sua namorada, a artista Margot (May Hong). Através deles, diversifica e moderniza o cenário pintado por "Tales of the City".
Um episódio em especial, "The Price of Oil" (1x04), faz excelente trabalho em confrontar os personagens mais jovens com a história de luta do movimento LGBTQ+, seja na época do HIV ou mesmo antes, nas primeiras rebeliões por direitos civis. O capítulo assinado pelo roteirista Andy Park foge da tentação de demonizar um dos lados desse confronto, ao invés disso costurando a intersecção entre eles, e suas sabedorias distintas, com delicadeza.
Já outro dos episódios da série, "Days of Small Surrenders" (1x08), explora o passado da nonagenária Anna e traz um grupo formidável de atrizes transgênero para interpretar as mulheres com quem ela conviveu em sua juventude. Jen Richards ("Better Things", "Blindspot") vive Anna, e Daniela Vega ("Uma Mulher Fantástica") estreia em Hollywood no papel de Ysela.
Neste e em outros pequenos e grandes momentos, "Crônicas de San Francisco" mostra que, 41 anos depois de sua criação, "Tales of the City" continua reinventando a roda, contando grandes histórias e abrindo caminhos inéditos para a comunidade LGBTQ+.
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