Disputa de integrantes da banda Gangrena Gasosa vira caso de polícia
Autointitulada "única banda de saravá metal do mundo", a Gangrena Gasosa fez fama nos anos 1990 com seus integrantes fantasiados de entidades, levando despachos aos shows e contando histórias com quê de sobrenatural. Mas há dois anos uma disputa entre os atuais e antigos integrantes do grupo virou briga e acabou indo parar na polícia.
A Gangrena foi fundada em 1990, mas sempre teve diversas mudanças na formação. E o entrave veio da alta rotatividade na banda: em 2016, alguns ex-integrantes começaram a vender um show com a formação antiga da banda para tocar na íntegra o álbum de estreia, "Welcome to Terreiro".
Enquanto posts em redes sociais já vendiam a apresentação, o baterista Cid Mesquita (integrante da formação original) informou ao atual vocalista, Angelo Arede, sobre a intenção dos antigos membros de realizarem o show. Angelo acusou Cid, Paulo Roberto (ex-vocalista da banda Paulão) e o ex-guitarrista Vladimir Rodriguez de, além de negociarem pelas costas da atual banda, espalharem ofensas e calúnias contra ele e os companheiros da Gangrena.
O show comemorativo
Em 2018, "Welcome to Terreiro" --uma brincadeira com o clássico do Guns N' Roses "Welcome to the Jungle"-- completa 25 anos. Segundo Cid, "rolaram convites, os próprios fãs pediram muito para termos a formação original tocando o 'Welcome'".
Tanto Angelo quanto Cid dizem que tentaram negociar um show com várias fases da banda presentes, revezando-se no palco. Angelo afirma que pediu um tempo para resolver com os atuais membros da Gangrena a situação, mas diz que recebeu ofensas nas redes sociais até o ponto de ser comunicado de que os antigos integrantes se juntariam, sob o nome da Gangrena, para um show, sem a presença dos atuais, por conta de desavenças de alguns deles com Angelo.
"Eu falei: 'E vocês estão ligando só pra me comunicar?'. Eu ofereci de fazer show junto, sempre dei moral pra todo mundo, exaltei todo mundo", diz Angelo. "E eles me falaram que iam fazer, e que se botasse eles no pau, eles iriam colocar a identidade no bolso e ir para o fórum resolver."
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O registro da marca
A grande disputa hoje é pela marca Gangrena Gasosa. Angelo diz que foi neste ponto da rixa que resolveu fazer algo que nunca fora feito na banda: registrar o nome para uso nas funções que lhe coubessem no INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial). O vocalista alega ter feito o aviso aos ex-integrantes de que registraria a marca, para seguir trabalhando e fazendo shows sob o nome da Gangrena.
Cid, por outro lado, diz ter sido traído por Angelo. "Sempre acreditei na Gangrena como uma 'open source', uma marca que não tem dono, então descobri por terceiros que o Angelo entrou com um registro para uma marca que ele não criou", afirma o ex-baterista da banda, que deixou a Gangrena no fim dos anos 90. Cid criou o logo e foi responsável por diversas músicas, personagens e artes da Gangrena no início. "Isso não só me deixou chateado, como todos os membros fundadores da banda."
O registro no INPI feito por Angelo aconteceu em 20 de outubro de 2016 e requer os direitos de uso do nome da Gangrena para "apresentação de espetáculos ao vivo; organização de espetáculos, produção de shows; serviços de entretenimento", entre outros, que dizem respeito aos shows e lançamentos de discos que a banda seguiu praticando nos últimos anos. Cid entrou com oposição em 15 de dezembro do mesmo ano. O INPI ainda não divulgou uma resolução, mas, para que Cid tenha ganho da causa, ele precisa ter feito uso da marca da Gangrena, como banda, no período de seis meses anterior ao pedido de Angelo.
"O registro não é para definir quem inventa, mas para quem usa. Não é uma patente, não quero dizer que inventei, ainda mais nesta classe que entrei com o pedido", diz Angelo. "Fiz um filme [o documentário 'Desagradável', de 2013] dizendo isso, chamei as pessoas, mostrei a importância do Cid e de todo mundo. Assim como esse mesmo filme mostra o Cid falando que ficou 7 anos na banda, não conseguiu ganhar dinheiro e decidiu que ia sair."
Outra troca de acusações diz respeito a um "acordo de cavalheiros", nunca assinado. Enquanto os antigos músicos dizem que o combinado era que ninguém registraria a marca da Gangrena, Angelo diz que ele previa que quem saísse da banda não "encheria o saco" com esse tipo assunto.
Queixa-crime
Com os ânimos ainda mais acirrados por conta do pedido de registro da marca, Angelo afirma que as ofensas por parte de antigos membros da banda, como Cid, Paulão (que deixou a banda nos anos 90) e Vlad (fora desde 2010), aumentaram. Os atuais integrantes da Gangrena Gasosa divulgaram um longo texto (assinado pela percussionista Ge Gaizeu) e um vídeo explicando a situação, em que mostram prints de conversas virtuais sobre o show comemorativo e as ofensas dos outros integrantes.
Angelo afirma que resolveu levar o caso à polícia quando as acusações ficaram mais intensas e percebeu que sua integridade física e seu trabalho fora da Gangrena começaram a ser afetados por isso.
"O negócio começou a ficar muito pesado. Aí eu falei: 'Vou me proteger'. Entrei com uma queixa-crime por calúnia e difamação, por estar sendo chamado de ladrão, usurpador. Eles passaram de me chamar de 'Nutella' e 'bichinha' para 'ladrão' e a instigar fãs a irem nos shows criar confusão. Me vi obrigado, e a polícia acatou. Isso já tem dois meses, mas é insuportável", diz Angelo, que só abriu a disputa aos fãs quando a página do Facebook da Gangrena Gasosa foi denunciada e derrubada, e que os antigos integrantes criaram uma fan page chamada "Gangrena Gasosa Raiz", promovendo o retorno da formação original.
Cid nega as acusações. "Não caluniei ninguém, eu só mostrei os fatos. Ele fez muita coisa no silêncio [o registro da marca], enquanto eu falava com as pessoas para se juntarem num grande show. A partir daí perdi o contato com ele e procurei um advogado."
Futuro
Enquanto a disputa pela marca segue no INPI e a Justiça analisa as denúncias de Angelo, Cid e os antigos integrantes da Gangrena afirmam que têm um contrato que lhes dá direito a relançar o disco "Welcome to Terreiro" e ainda negociam um primeiro show de reunião.
"A gente tem algumas propostas que recebemos de produtores do Rio para tocar. A Gangrena nunca foi o tipo de banda que costuma obedecer ordens, então provavelmente rolem shows; o relançamento do 'Welcome' é certo. O resto é com a Justiça", diz Cid.
Angelo diz que não se opõe ao relançamento, mas que não aceita que existam duas bandas se chamando Gangrena Gasosa. E que os rivais criaram factoides, para pressionar e influenciar os fãs.
"Que toquem, mas não podem existir duas bandas de mesmo nome, não faz sentido", diz Angelo, que por enquanto tem mais três shows marcados com a Gangrena em 2018, seguindo com a divulgação do disco "Gente Ruim Só Manda Lembrança pra Quem Não Presta", lançado no começo deste ano.
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