Como um time só de diretoras mudou a nova temporada de "Jessica Jones"
Desde sua primeira temporada, em 2015, “Jessica Jones” se propôs a ser mais do que uma mera série de heróis. Como a primeira produção do Universo Cinematográfico da Marvel a ser protagonizada por uma super-heroína, “Jessica” trouxe uma protagonista carismática e cheia de defeitos e discutiu temas que afetam a vida de várias mulheres, como abuso psicológico, estupro e aborto. E para sua segunda temporada, que segue explorando os traumas e as cicatrizes da detetive particular, a série resolveu dar um passo adiante e contratou apenas diretoras para conduzir os novos episódios.
Dessa vez, são 13 cineastas mulheres, contra apenas três da temporada anterior. Um pedido da própria criadora da série, Melissa Rosenberg. “Ela nos disse que queria aumentar o número de diretoras e apoiamos essa visão”, explicou Allie Goss, vice-presidente de séries originais da Netflix durante evento da empresa em Los Angeles, no qual UOL estava presente.
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“Essa decisão foi tomada com base em uma decisão criativa. Quando você vê a história da segunda temporada, Jessica tem uma relação muito próxima da personagem de Janet McTeer. E por causa disso, fazia sentido trazer diretoras, que poderiam trazer uma perspectiva e uma visão para isso”, completou.
A presença de diretoras se refletiu inclusive na relação com as atrizes durante as filmagens – principalmente para a protagonista, Krysten Ritter. “Para as cenas que tínhamos que fazer, a vulnerabilidade que era necessária e o contexto sexual que temos, ter essas conversas com uma mulher em vez de um homem é mais fácil para mim”, contou ela ao UOL. “Há uma densidade e uma crueza nessas conversas que, para mim, é incrível e se conecta com a dinâmica da nossa série”.
Até o clima no set era diferente, segundo a atriz. “A energia é muito convidativa e afetuosa. É uma energia positiva, empolgante; é muito feminina, não tem ego. Nós tocamos música, nós dançamos, nós abraçamos isso! Nós nossos meninas e abraçamos isso mesmo fazendo ação e sendo duronas. Ainda estamos nos divertindo, e mantendo o clima leve”.
As parcerias entre mulheres ao longo do trabalho também se sobressaíram para Jet Wilkinson, que dirigiu o sexto episódio da temporada. “A série fala sobre amizade feminina, mulheres se apoiando. E acho que isso não estava apenas na tela, mas também no set”.
Sem cotas
Para as diretoras envolvidas, foi diferente a sensação de ser escalada para um projeto comandado apenas por mulheres – algo ainda raro em Hollywood. Entre 2016 e 2017, apenas 17% dos diretores da TV americana eram mulheres, de acordo com uma pesquisa conduzida pela Universidade de San Diego.
“Uma das coisas que realmente gosto de termos apenas diretoras mulheres é que eu sinto que estávamos lá por uma escolha criativa, e não por uma ordem”, analisou Deborah Chow, que dirigiu o quarto episódio da nova temporada e já havia trabalhado em produções como “Punho de Ferro” e “Mr. Robot”. “Em muitas ocasiões, você sente que as diretoras mulheres estão lá apenas para cumprir tabela, mas aqui não senti que eles estavam contratando para preencher uma cota. Eles estavam contratando porque achavam que era o certo para a série.”
De acordo, Wilkinson ressaltou que as cineastas querem ser escolhidas por seus próprios méritos – e não apenas por serem mulheres. “Você quer ser contratada por quem você é e pelo seu trabalho. E você pode preencher requisitos ou ser algo que eles procuram na superfície, mas no fim das contas você tem que trazer o seu melhor e ser contratada pelo seu talento. Acho que é assim que você deve vivenciar sua carreira”, opinou ela, que também trabalhou em “Justiceiro” e “How To Get Away With Murder”.
Na tela, a opção por trazer mulheres – incluindo latinas, negras e de origem asiática – ao comando das narrativas se traduziu em outro olhar sobre o universo de “Jessica Jones”, com atenção a detalhes que poderiam passar despercebidos. Deborah citou como exemplo a cena em que Jessica está em um grupo de terapia de controle de raiva, dividindo o espaço com um grupo bem diverso de personagens.
“Nós fomos muito específicos na hora de escolher. Queríamos representar Nova York, então tínhamos que ter um certo número de etnias e fugir do lugar-comum. Então foi muito divertido, porque começamos a criar personagens para esses figurantes. É algo pequeno, mas pessoas como nós estamos pensando muito mais nessas coisas agora”.
O impacto da história
Mesclando empoderamento e discussões sobre o abuso psicológico, a primeira temporada de “Jessica Jones” deu início a uma conversa pouco tida tanto na TV quanto na sociedade. E a segunda chega em um momento ainda mais propício, após Hollywood ter consolidado movimentos contra o assédio sexual e a discriminação de gênero, na esteira de denúncias contra nomes poderosos da indústria cinematográfica como Harvey Weinstein e Kevin Spacey.
Nada disso é uma mera coincidência para as mulheres envolvidas na produção. “Da criação do quadrinho à nossa série, esses temas de empoderamento, superação de trauma, coragem e a dicotomia entre a personalidade e a força de super-heroína têm sido intrínsecos a quem Jessica Jones é desde o primeiro dia”, disse Samantha Thomas, vice-presidente de programação original da Marvel.
“Não quero chamar a relevância que a série tem hoje de ‘acidente’. Nossa história se encaixa em um mundo que está pronto para falar disso. Estamos muito orgulhosos do ponto de vista e da forma como retratamos as mulheres nas nossas séries, e nessa em particular”.
Allie Goss, a vice-presidente de séries originais da Netflix, reconheceu que “Jessica Jones” foi de certa forma amplificada pelo contexto atual. “Realmente, é só agora que essas histórias e essas criadoras que estão contando as histórias de mulheres reais estão repercutindo dessa forma e chamando mais atenção do que chamariam antes”, refletiu a executiva, que também comemorou o fato de o mundo estar pronto para falar sobre essas tramas.
*A jornalista viajou a convite da Netflix
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