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Showrunner de 'Grey's Anatomy' encarou 26h de parto por medo de anestesia

A autora Krista Vernoff - Phillip Faraone / Correspondente/Getty Images
A autora Krista Vernoff Imagem: Phillip Faraone / Correspondente/Getty Images

Guilherme Machado

Do UOL, em Pasadena, Califórnia*

10/04/2020 04h00

Krista Vernoff assumiu a posição de showrunner e principal roteirista de "Grey's Anatomy" em 2007 até deixar o posto em 2011. Em 2014, ela estava de volta, e hoje segue no comando de um dos maiores fenômenos mundiais da televisão. Durante seus muitos anos na série, a autora, que substituiu a poderosa Shonda Rhimes numa das séries mais bem-sucedidas da TV americana, já leu todo o tipo de artigo médico e já entrou em contato com os mais sérios casos, o que a fez, nas palavras dela, "desenvolver um medo real a qualquer tipo de doença".

Eu brinco constantemente, mas não é uma piada, é verdade: eu me tornei realmente uma hipocondríaca nas duas primeiras temporadas de 'Grey's Anatomy.' Você tem que ler sobre tudo o que já deu de errado com alguém na medicina

Essa espécie de "especialização" em medicina ajudou não só em seu trabalho, mas também influenciou em sua vida pessoa.

Tive um parto natural de 26 horas porque fiquei com medo da anestesia peridural. Li muitas histórias de anestesias que deram errado. Eu tinha pavor de hospitais

Braço direito de Shonda, Krista conversou com o UOL durante evento da Television Critics Association (TCA), que ocorreu no início do ano em Pasadena, no estado norte-americano da Califórnia. Atualmente, ela também atua como showrunner de "Station 19", spin-off de "Grey's Anatomy" que se passa em posto do corpo de bombeiros.

Agora eu tenho que ler todas as histórias de todos os lugares que já pegaram fogo, e sobre como eles pegaram fogo...

A situação chegou a tal ponto, que ela configurou seu telefone para receber automaticamente atualizações sobre todos os desastres que ocorrem ao redor do mundo. Ontem, a 16ª temporada de "Grey's Anatomy" se encerrou nos Estados Unidos (no Brasil ela é exibida pelo Sony Channel com semanas de atraso) após ser encurtada em quatro capítulos por conta da pandemia de coronavírus.

Quando sentou com a reportagem, a realidade da pandemia ainda era distante, mas a autora relatou que busca histórias dramáticas da vida real para inspirar o seriado.

Quando uma notícia me faz chorar, eu penso: Esse é o gancho. Esse tipo de verdade que é mais estranha do que a ficção inspira nossas histórias, certamente

E as histórias parecem realmente fazer o público chorar também: após quase duas décadas, "Grey's" continua cativando espectadores ao redor do mundo com seus personagens, dramas hospitalares e romances complicados.

Para a escritora, o surgimento de serviços de streaming como a Netflix, que tem a série no catálogo, impulsionou o seriado, o permitindo atingir novos púbicos, com diferentes idades. Ela também vê que os roteiristas e produtores conseguiram criar uma montanha-russa de emoções, na qual todos querem andar.

Os amigos da minha filha são obcecados por 'Grey's Anatomy' e minha filha tem quase 13 anos. Eu acabei de permitir que ela assista à série [risos]. Mas isso é o streaming, a Netflix. Estão descobrindo como se fosse uma série nova. Acho que contamos histórias muito boas. Enquanto outras séries médicas são mais procedimentais, focando na medicina e meio que recomeçando toda semana, 'Grey's' foca nos personagens desde o começo. As pessoas se apaixonam por eles como se fossem amigos, e não conseguem ir embora antes de a história acabar.

Medo e novos desafios

Sanra Oh e Ellen Pompeo em "Grey's Anatomy" - Divulgação - Divulgação
Cristina Yang (Sandra Oh) e Meredith Grey (Ellen Pompeo), personagens criadas por Shonda Rhimes, formaram uma amizade icônica em 'Grey's Anatomy'
Imagem: Divulgação

"Grey's Anatomy" é uma criação de Shonda Rhimes, um dos nomes mais importantes da teledramaturgia norte-americana, que criou um império com sua produtora Shondaland, responsável por outros sucessos como "Scandal" e "How To Get Away With Murder". Krista confessa que teve medo quando a colega pediu para que assumisse o comando de "Grey's", mas que o sentimento acabou sendo saudável.

"Eu amo essa sensação. Não vale muito a pena fazer algo se isso não me assusta um pouquinho. Como ser humano, você quer permanecer vivo, e eu não quero ficar muito confortável, não quero ficar preguiçosa, quero assumir desafios assim. Foi assustador e animador. Eu sabia que Shonda tinha fé em mim. Foi um voto de confiança tão grande que não tinha como interpretar senão como um elogio épico e saber que eu teria o apoio dela", afirmou.

Ela também destaca que ainda há histórias que quer contar em "Grey's Anatomy", que tratam de temas pesados, mas que ainda não descobriu a forma de abordá-las.

"Tem histórias que quis contar e que ainda não descobri muito bem como decifrar. Coisas como abuso sexual de crianças. Tem coisas que discutimos na sala de roteiristas e falamos: vamos apenas traumatizar todo mundo retratando isso? Eu sempre acredito que uma hora vai rolar. Tem meia dezena de assuntos sobre os quais falamos 'isso é ótimo', e não conseguimos descobrir como fazer. Mas nós vamos!", relata.

Comandar duas séries tem sido um enorme desafio muito animador, não se parece com nada que já vivi. Eu trabalho como escritora e produtora há vinte anos. Integro meu trabalho à minha vida, levo cenas da série e assisto com as crianças. Minha filha joga pingue-pongue na sala dos roteiristas. É legal ser a chefe!

*O jornalista viajou a convite da Sony Pictures