Carnaval invade o reduto indie: Ilê Aiyê é uma das atrações do Popload
Já faz tempo que os indies invadiram o Carnaval de rua das grandes cidades com muito glitter, plumas e paetês. Agora é a vez de o Carnaval tradicional invadir o reduto indie. Uma das atrações do Popload Festival, que acontece no feriado de 15 de novembro, em São Paulo, o bloco baiano Ilê Aiyê abre os trabalhos com um cortejo que vai acompanhar a apresentação da conterrânea Luedji Luna.
Apesar de ostentar 45 anos de história e luta, alguém desavisado pode chegar cedo ao Memorial da América Latina e se perguntar "que bloco é esse?". A gente responde essa pergunta aqui.
"O mais belo dos belos"
Cantado por Caetano Veloso em Um Canto de Afoxé para o Bloco do Ilê, do álbum Cores, Nomes, de 1982, e gravado por Gilberto Gil em Ilê Aiyê (de Paulinho Camafeu), no disco Refavela, de 1977, o bloco carrega em suas costas parte importante da história do Carnaval de Salvador.
Não à toa, é conhecido como "o mais belo dos belos". Além da força musical dos desfiles que arrastam multidões ao sair das ladeiras do Curuzu, bairro da capital baiana onde foi criado em 1974, o Ilê, como é chamado pelos íntimos, tem desde seu primeiro desfile a missão de combater o racismo através do empoderamento do povo negro, que até então era vetado de participar dos festejos carnavalescos - naquela época, manifestações populares negras eram perseguidas e abafadas pela Ditadura Militar.
Ah, sim, e em tempos de intolerância religiosa, vale lembrar que o Ilê nasceu no terreiro Ilê Axé Jitolu, de Mãe Hilda, que se tornou sede oficial do bloco por quase 20 anos. Mãe Hilda é mãe biológica de Antonio Carlos dos Santos, o Vovô do Ilê, o fundador do bloco, à frente de suas atividades até hoje.
Refúgio para os negros
"Ilê" e "Aiê" significam "casa" e "terra" em iorubá, e o Ilê nasceu para ser um refúgio para os negros. Formado exclusivamente por artistas afrodescendentes, o bloco cujo aniversário oficial se comemora no próximo dia 1º de novembro, às vésperas do festival, foge da receita da axé music, cuja trajetória de sucesso ajudou a pavimentar com seu chamado samba afro, embalado por muitos tambores.
Os desfiles, coloridos de branco, preto, amarelo e vermelho (que representam, respectivamente, a paz, a cor da pele, a riqueza cultural e a beleza, e o sangue derramado na luta pela libertação), trazem como tema a história de países africanos e de revoltas negras brasileiras, responsáveis pela construção da identidade e da autoestima do povo negro brasileiro - o Curuzu, em Salvador, aliás, é o bairro que concentra a maior população negra do Brasil, com cerca de 16 mil habitantes. Tudo no Ilê tem símbolo, história e propósito.
Desde sua primeira caminhada pelas ladeiras e vielas do Curuzu, o Ilê usou a cultura para fazer política, protestando contra o racismo - e fora espinafrado pela imprensa, que criticou seu desfile de estreia alegando não haver racismo no Brasil (sei?) e seus integrantes "todos de cor" (segundo o jornal A Tarde, um dos mais importantes da Bahia), que estariam importando ideias não-originais dos Panteras Negras e do movimento Black Power dos Estados Unidos que não faziam sentido no contexto brasileiro, onde o racismo age, muitas vezes, de forma silenciosa.
Isso não foi o bastante para calar a voz do Ilê, que continuou cantando ainda mais alto e forte nos carnavais posteriores, e conquistando multidões pelo Brasil e pelo mundo, em suas diversas turnês internacionais. Hoje, o Ilê Aiyê conta com 3 mil associados e atua para além do carnaval, investindo em projetos pedagógicos e sociais.
POPLOAD FESTIVAL 2019
Com shows de Patti Smith, The Raconteurs, Hot Chip, Tove Lo, Cansei de Ser Sexy, Little Simz, Khruangbin, Boy Pablo, Luedji Luna e o bloco Ilê Aiyê
Quando: 15 de novembro
Onde: Memorial da América Latina (Av. Auro Soares de Moura Andrade, 664 - Barra Funda, São Paulo)
Horários: Abertura dos portões às 10h; início dos shows às 10h45
Ingressos: pista R$ 580 (inteira), pista premium R$ 800 (inteira)
Onde comprar: www.ticketload.com e bilheteria do Unimed Hall
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