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Tarantino se irrita com pergunta sobre sexismo ao falar de "Era uma vez em Hollywood"

Brad Pitt, Quentin Tarantino, Margot Robbie e Leonardo DiCaprio promovem "Era uma vez em Hollywood", no Festival de Cannes - George Pimentel/WireImage/Getty Images
Brad Pitt, Quentin Tarantino, Margot Robbie e Leonardo DiCaprio promovem "Era uma vez em Hollywood", no Festival de Cannes Imagem: George Pimentel/WireImage/Getty Images

Bruno Ghetti

Colaboração para o UOL, em Cannes

22/05/2019 08h09

Quentin Tarantino, Brad Pitt, Leonardo DiCaprio e Margot Robbie formaram a mesa de entrevistas mais estrelada deste Festival de Cannes até o momento, na conversa com a imprensa da manhã de hoje sobre "Era Uma Vez em Hollywood". Disputando a Palma de Ouro, o longa de Tarantino teve na noite de ontem uma sessão de gala aclamadora (ainda que não unânime de crítica). E, durante a conversa com a imprensa, o diretor se irritou com uma pergunta de um jornalista.

Quando indagado sobre o tratamento dado a mulheres (há cenas bem violentas contra personagens femininas, que em geral têm poucas cenas ativas no longa), o cineasta preferiu fazer o que sempre tem feito ao longo dos anos: fugir do assunto. "Não concordo", disse, quando ouviu insinuações de uma repórter de que seu trabalho tivesse elementos sexistas e que ele desse poucas falas às atrizes.

Veja a pergunta da repórter (em inglês):

"Era Uma Vez em Hollywood" se passa em Los Angeles, em 1969, mostrando a história da amizade entre Rick (Leonardo DiCaprio), um ator de TV decadente, e seu dublê Cliff (Brad Pitt), sujeito que já tentou a carreira de ator, mas que hoje se contenta em ficar à sombra dos astros. Os personagens são fictícios, mas o longa mostra, também, pessoas que viveram a Hollywood daquela época, como a atriz Sharon Tate (Margot Robbie), então casada com o diretor Roman Polanski - logo no início do filme, o casal se muda para a casa vizinha à de Rick.

Na vida real, Tate (então grávida de Polanski) e mais três amigos seriam assassinados naquele local por alguns jovens hippies da gangue de Charles Manson, em um dos crimes mais brutais da história de Hollywood. Os meses que antecedem o crime servem de pano de fundo para grande parte da história.

"Pesquisei muito sobre isso [o assassinato de Tate], e como ele levou aquelas pessoas a cometer aquilo. E francamente, quanto mais você se informa, nada fica mais claro, ao contrário: tudo parece mais absurdo. A falta de compreensão que temos sobre o que levou a tudo aquilo é que garante nosso contínuo fascínio por essa história", disse Tarantino, justificando seu interesse pelo tema.

O cineasta contou que admira Polanski, mas que nunca teve muito contato com ele. "Já o encontrei umas duas vezes. Ele era o diretor mais quente de Hollywood naquela época. Sou fã do trabalho dele, em particular de 'O Bebê de Rosemary'." Mas ao ser indagado sobre se conversou com Polanski sobre detalhes ou a visão do diretor sobre a trágica noite da morte de Tate, Tarantino foi monossilábico: "Não!".

Já Margot Robbie diz que fez muita pesquisa, mas buscou também certa distância para compor Sharon. "Pesquisei e li muito sobre ela, mas ao mesmo tempo o que mais procurei fazer foi entender o propósito dessa personagem no filme: isso foi o mais importante. Sharon é a batida de coração do longa, só queria que ela tivesse leveza, quis fazer a personagem de maneira a honrar a memória de Tate, que era uma pessoa especial", disse a atriz.

Parte das cenas se passam no rancho onde os seguidores da seita de Manson viviam, em uma rotina estranha e cheia de regras. "Era uma comunidade muito esquisita. Mas, apesar desse aspecto sinistro, tentei mostrar a rotina deles ali. Então você vê as pessoas no dia a dia, algumas ganhando dinheiro fazendo visitas guiadas sobre cavalos nos arredores da região". Tarantino contou que, na infância, ele e a mãe já participaram de uma visita em cavalos por ali. "Não sei se fomos especificamente àquele rancho, mas gosto de pensar que talvez tenhamos ido lá", revelou

Era uma vez - Divulgação/VF - Divulgação/VF
Pitt e DiCaprio contracenam com Al Pacino
Imagem: Divulgação/VF

Brad Pitt contou que pensa no assassinato de Tate e seus amigos em termos metafóricos: teria sido o fim de uma era. "Vejo como um assassinado contra a inocência", disse Pitt. "Havia um clima de muita esperança, paz e amor naquela época. Quando o crime aconteceu, aquela tragédia, mostrou o lado mais obscuro da natureza humana. É por isso que o evento nos assusta ainda hoje, e é a isso que o filme belamente se refere."

Leonardo DiCaprio e Brad Pitt oferecem uma excelente parceria nas cenas em que aparecem juntos. Segundo DiCaprio, isso não se deu à toa. "Surgimos mais ou menos na mesma época. É uma historia de amizade, naquela era de Hollywood, e isso se juntou ao conforto que temos um com o outro. É incrivelmente fácil trabalhar com Brad", contou o ator.

Pitt devolveu a gentileza. "Concordo: foi bem divertido, ri muito. É algo que você já sabe dentro de você mesmo. Nós temos as mesmas referências e experiências... Queria muito repetir tudo isso."

O filme traz uma série de referências a diversas obras que fazem parte do imaginário cinéfilo de Tarantino, sobretudo os westerns spaghetti do cinema italiano dos anos 1960. Mas não faltam também citações a obras anteriores do próprio Tarantino.

"O filme não pretendia ser tão autorreferente, muitas das coisas que estão ali simplesmente apareceram", disse o diretor. "As primeiras pessoas que leram o roteiro disseram: 'Então este é o seu nono filme? Pois é como se fossem os outros oito colocados juntos."

Brad Pitt, Leonardo DiCaprio, Quentin Tarantino e Margot Robbie na coletiva de "Era uma vez em Hollywood" - John Phillips/Getty Images - John Phillips/Getty Images
Imagem: John Phillips/Getty Images

DiCaprio se disse admirado com a cultura geral de Tarantino. "Há poucas pessoas que possuem o conhecimento coletivo de história do cinema, TV e música como Tarantino. Ele é um computador com uma base de dados ambulante. Acho que o filme é sua declaração de amor para a indústria do entretenimento", disse o astro. "É sobre outsiders na indústria. Uma homenagem a todos esses atores [de séries e filmes B da TV] que Tarantino admira em termos artísticos, é sua carta de amor aos outsiders da indústria. Isso é o que mais me emocionou na história."

Sobre a explicação do seu saudosismo pela época retratada no longa, Tarantino deu uma resposta bem-humorada: "Eu prefiro qualquer época anterior aos telefones celulares". Os anos passam, mas Tarantino, pelo que se percebe, continua o mesmo - tanto em termos de estilo como de visão de mundo.