Banquete na rua e enchente "amiga": quem são os fãs que fazem tudo pelo BTS
Tempestade na cabeça, roupas molhadas, noites mal dormidas e improviso para necessidades básicas, como comer e usar o banheiro. Nada disso é novidade para o grupo que está acampando há três semanas nos arredores do Allianz Parque, na zona oeste de São Paulo. O estádio recebe o show do BTS em 25 de maio e, enquanto o dia da apresentação não chega, centenas de fãs do grupo de k-pop se esforçam para conseguir o melhor lugar possível.
O septeto sul-coreano é hoje o principal representante do k-pop, fenômeno musical que vem ganhando força na América Latina nos últimos anos. Mesmo com números milionários e o reconhecimento até mesmo do Grammy, que os convidou para a cerimônia desse ano em Los Angeles, o BTS ainda é uma incógnita para parte do público no Brasil. Mas o clima no Allianz Parque na última segunda-feira, quando os ingressos para o primeiro show se esgotaram, prova que a tendência é que cada vez mais gente saiba "o que é BTS".
Diferentemente dos artistas pop tradicionais, o BTS atrai um público mais diverso e genuinamente interessado no que cada um dos integrantes têm a oferecer. São crianças a partir de 10 anos até adultos com mais de 30. A dedicação acaba despertando a curiosidade e envolvendo também pais e avós na cultura dos idols, e é recíproca. Essa já é a quarta vez que o grupo vem ao Brasil, e a cada visita estão maiores. Parte do crescimento é também um reflexo do reconhecimento internacional, valorizado no mercado de entretenimento sul-coreano. Dados da Deezer mostram que o Brasil é o segundo país que mais ouve BTS no serviço de streaming. São Paulo também ocupa a segunda posição entre as cidades que mais escutam o grupo no mundo. A maior parte dos ouvintes tem entre 18 e 25 anos.
A dedicação quase militar dos artistas coreanos para alcançar o sucesso reflete no comportamento dos fãs que se organizam para prestigiá-los em São Paulo nos shows únicos na América Latina (um show extra acontece em 26 de maio). Até agora, são seis barracas montadas perto do estádio. Os integrantes carregam orgulhosos adesivos no peito (B1, B2, B3, B4, B5 e B6) e, para não perder aulas na escola ou faculdade e dias no trabalho, se organizam em turnos para manter o acampamento funcionando 24 horas por dia. Até 60 pessoas se revezam em cada barraca. Pelo menos duas pessoas dormem no local a cada noite. Uma rotina que se repete há anos para alguns deles.
As pioneiras
Taya Souza, de 31 anos, é oficialmente a primeira da fila do BTS no Brasil. Ela chegou no Allianz Parque no dia 18 de fevereiro, um dia antes de o show ser anunciado nas contas oficiais do grupo. Ainda assim, prefere não aparecer nas fotos. Evangélica, é uma das pioneiras dos acampamentos de k-pop, mas tem medo da represália do pastor. Os pais, com quem mora em Alphaville quando não está na fila de algum show importante, também desaprovam o "vício" da filha. Mas o trabalho como analista operacional garante os ingressos que já a levaram até outros países para ver seus ídolos coreanos.
"Eu trabalho para isso. Recentemente fui assistir a um show no Chile do SM Town. Se soubesse que teria o BTS aqui não tinha ido. Mas consegui guardar dinheiro. Um mês compensa o outro. O salário desse mês, por exemplo, metade já ficou aqui para o ingresso e as despesas do acampamento. Por dia a gente não gasta menos de R$ 100, mas até agora já gastamos um pouco mais de R$ 3000. Até porque tivemos que comprar barraca, lona, tem colchão que estraga, molha... E temos que nos alimentar", diz.
A tempestade que inundou vários pontos e cidades da Grande São Paulo no domingo foi um dos dias mais difíceis no acampamento. Ao mesmo tempo foi positivo para o grupo, pois muita gente não precisou trabalhar na segunda-feira por causa dos pontos intransitáveis. Era dia de comprar os ingressos e, coincidentemente, o único que demandava que todas estivessem ali. "Hoje como teve a enchente de madrugada facilitou porque muita gente não teve que ir trabalhar cedo."
"Quando anunciaram viemos correndo pro Allianz porque a gente tinha certeza que ia chegar aqui e já teria gente. Conseguimos ser as primeiras, mas deu meia hora já tinha gente aqui", explica a professora Micaela Souza, de 23 anos. A analista de SAC Amanda Araújo, 21, e a estudante Thais Correa, 20, contam que elas ainda estão se dividindo entre o local e o Espaço das Américas, que em julho recebe o show do grupo Monsta X. Uma rotina para o grupo que acampa desde 2013 nas portas de shows k-pop.
Tudo pelo BTS
"Faltei hoje na Etec, recebi oito faltas e a falta geral do dia. Como estou aqui o final de semana inteiro, desde sexta, não fiz seminário, não fiz trabalho, pra estar aqui. Faço Secretariado junto com o Ensino Médio. Você tem que ter 75% de presença, mas essa é a minha primeira falta do ano, por um motivo especial (comprar os ingressos). É que um dia que eu falto, recebo oito faltas. Estou acampando desde o primeiro dia", revela Ana Paula de Camargo, de 17 anos.
A sortuda
Enquanto aguardava a bilheteria abrir, o que aconteceria ao meio-dia, Izabelle Camille recebeu uma ligação. Ela chorava e vibrava no telefone. "Tem certeza que é pra mim? Posso sair daqui?". Uma amiga confirmava a compra de um disputado ingresso para ela na internet. A venda online abriu duas horas antes da física. Apesar da sorte, a menina segue acampada com o grupo. E a sorte não é só com os ingressos. Ela conta com o apoio dos pais, que também "cuidam" dos outros integrantes do acampamento. "Esses dias minha mãe veio com uma panela de macarrão pra todo mundo", conta sobre o banquete na rua. "Meu pai também já veio e trouxe produtos de limpeza pra gente". Afinal, organização e limpeza estão entre as regras mais rígidas do acampamento.
Mamãe army
Gabriela Zvir, empresária de 41 anos, enfrentava a fila do BTS para render a filha Pietra, de 17 anos, exausta da tempestade no dia anterior. "Hoje eu vim às 6h da manhã porque ontem ela pegou muita chuva na cabeça e estava exausta. Não deixei faltar na escola. Ela foi revezando com o pessoal e vinha à noite que era a hora que ela podia. Eu fiz recentemente uma cirurgia e não pude vir no acampamento, mas hoje vim por causa do ingresso. Estou tentando ingresso do soundcheck para ela. Eu não preciso, mas gostaria muito de vir porque sou fã junto. Mas pelo valor (R$ 950 inteira/R$ 600 meia) não dá. A não ser que eu chegue a tempo de pegar meia-entrada, aí vou pegar para mim e para ela. Tudo o que vier agora é lucro. As pernas a gente já nem sente mais, então se eu conseguir até meia-noite em casa já estou feliz."
"No começo achava eles todos iguais"
"Passamos a noite, tomamos chuva, fiquei sentada com o guarda-chuva, mas me molhei toda. Tiveram que trazer roupa seca. Mas estou aqui pela minha neta e pela minha filha", conta Rosângela Barreto, de 52 anos, mãe de Ariadne, 28, e avó de Giovana, 12. Todas army (nome do fandom do BTS). "Minha neta está na escola e minha filha está aguardando do lado de fora da fila se der algum problema com o cartão. Elas são army e eu também. Eu curto demais o jeito de eles dançarem. Quem começou foi a Giovana, aí envolveu a mãe e as duas passaram a acompanhar. Depois disso passou para mim. Comecei a curtir porque minha neta ficava comigo à tarde e ela coloca no YouTube. Assistia aos vídeos com ela e fui curtindo. No começo achava eles todos iguais. Mas depois comecei a entender e me apaixonar. Hoje já sei o nome deles e tudo. Não consigo cantar ainda, mas a gente enrola. Hoje aos 52 anos estou fazendo essa loucura por mim também. Eu nunca fui a um show em estádio, é o meu primeiro, e já estou curtindo. Vamos as três no soundcheck (setor de R$ 950 o ingresso). Já que é pra estourar, vamos estourar. Vamos parcelar no cartão, depois a gente vê como paga."
Quem são eles
Formado em Seul em 2013, o BTS, também conhecido como Bangtan Boys, tem seis álbuns de estúdio e já passou três vezes pelo Brasil, em turnês em 2014, 2015 e 2017. O grupo é composto por sete membros: Jin, Suga, J-Hope, RM, Jimin, V e Jungkook. O grupo, que vem ficando cada vez mais popular no Brasil, é um dos mais cultuados do k-pop, o pop sul-coreano, com milhões de visualizações na internet e provocando nos fãs histeria comparada pela revista "Billboard" à dos Beatles nos anos 1960.
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