Topo

Por que o novo Mary Poppins vai contra o que a criadora da personagem queria

Emily Blunt em "O Retorno de Mary Poppins"  - Divulgação
Emily Blunt em "O Retorno de Mary Poppins" Imagem: Divulgação

Caio Coletti

Colaboração para o UOL

21/12/2018 04h00

A nostalgia está em alta nos cinemas brasileiros desde quinta-feira (20), com a estreia de "O Retorno de Mary Poppins", continuação do clássico filme de 1964 que, para muitos, é a "joia da coroa" da Disney e de seu fundador, Walt.

Na trama do novo longa, dirigido por Rob Marshall ("Chicago"), a mágica babá Mary Poppins (Emily Blunt, no papel que foi de Julie Andrews no clássico) retorna à casa da família Banks em um momento difícil, para ajudar as crianças do filme original, agora crescidas e vividas por Ben Whishaw e Emily Mortimer, a cuidar de seus próprios filhos.

A volta aos cinemas da personagem, mais de 50 anos depois do sucesso estonteante do primeiro filme, vem a despeito dos desejos de P.L. Travers, que criou Poppins em sua série de oito livros, publicada a partir de 1934.

Travers, que morreu em 1996, aos 96 anos de idade, odiava o filme da Disney. A história de sua relação complicada com Walt durante a produção do longa está por trás da relutância da autora em autorizar uma continuação enquanto estava viva.

Versão "açucarada"

Para Travers, que nasceu na Austrália, mas viveu quase toda a sua vida na Inglaterra, "Mary Poppins" era tanto sobre disciplina e obediência quanto sobre imaginação e diversão. Por isso, a "magia Disney" do filme, e a suavização da personalidade da personagem título, não lhe caíram bem.

A escritora P.L. Travers - Divulgação - Divulgação
A escritora P.L. Travers
Imagem: Divulgação

Walt, que lia "Mary Poppins" para suas próprias filhas, tentou por vinte anos comprar os direitos dos livros de Travers, fazendo visitas regulares a ela na Inglaterra. Quando ela finalmente concordou, no começo da década de 1960, foi apenas com a condição de servir como consultora na roteirização do filme.

Travers desgostava das músicas originais compostas pelos irmãos Sherman, e brigou com Disney pela exclusão das cenas que misturavam desenho animado e live-action. O chefe do estúdio, no entanto, tinha a palavra final, e a versão de Walt Disney foi a que chegou aos cinemas, para o desgosto da autora.

O desentendimento entre ela e Disney, inclusive, foi o motivo pelo qual Travers não foi inicialmente convidada para a première de "Mary Poppins" em Los Angeles. A escritora, que não era de levar desaforo para casa, teve que insistir ao telefone com funcionários do estúdio e acabou por conseguir um convite.

Mágoa duradoura

A relação de Travers e Disney foi parar no filme "Walt nos Bastidores de Mary Poppins", lançado em 2013. Com Emma Thompson no papel da autora e Tom Hanks na pele de Disney, o filme tem suas próprias virtudes, mas se desvia da história real ao mostrar a escritora emocionada com o filme durante a estreia.

Se Travers chorou durante sua sessão de "Mary Poppins" em 1964, tudo indica que foi de desgosto. A melhor coisa que a escritora disse em vida sobre o filme foi em uma entrevista de 1977, onde contou que tinha "aprendido a viver com ele, mas que não tinha nada a ver com suas obras".

Emma Thompson vive Travers em "Walt nos Bastidores de Mary Poppins" (2013) - Divulgação/IMDb - Divulgação/IMDb
Emma Thompson vive Travers em "Walt nos Bastidores de Mary Poppins" (2013)
Imagem: Divulgação/IMDb

Nos anos 1990, o produtor teatral Cameron Mackintosh contatou a escritora para a montagem de um musical inspirado em sua criação. Travers concordou, desde que ninguém do filme original estivesse envolvido na produção, especialmente os irmãos Sherman.

Estes mesmos termos foram parar em seu testamento, como condições para qualquer adaptação de sua obra. "O Retorno de Mary Poppins" contorna isso ao não adaptar nenhum dos livros diretamente, usando a personagem (da qual a Disney tem os direitos) para criar uma nova história.