Em versão "business", Anitta rouba a cena em evento sobre Brasil em Harvard
Foi literalmente o show da poderosa.
Entre um pelotão de figurões da política e do empresariado, incluindo o ex-presidente do Banco Central, Gustavo Franco, o presidenciável Ciro Gomes (PDT-CE) e o CEO da maior cervejaria do mundo, Carlos Brito (Inbev), a personalidade mais aplaudida desta sexta-feira na Universidade Harvard, nos EUA, foi Anitta.
A carioca de 25 anos encerrou o primeiro dia da Brazil Conference, organizada por Harvard e pelo MIT, que há quatro anos trazem aos Estados Unidos alguns dos principais nomes do noticiário brasileiro - de Sérgio Moro e Dilma Rousseff, aos juízes Luis Roberto Barroso e Gilmar Mendes.
Em um ambiente diferente de sua audiência habitual, repleto de ternos e tailleurs escuros e embalado por linguajar corporativo (um palestrante insistia em dizer "insertar" em vez de colocar), Anitta apareceu de casaco dourado e salto agulha para defender a "música como instrumento de transformação", tema oficial de sua fala.
Por quase uma hora, deu lições de empreendedorismo e gestão de carreira para a plateia mais cheia do evento. Dono de uma fortuna de R$ 93,3 bilhões, o homem mais rico do Brasil, Jorge Paulo Lemann, assistiu da primeira fila - ele não quis falar com a imprensa, mas bateu palmas de pé e seguiu a cantora para o camarim.
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Anitta abriu a noite narrando a infância pobre em Rocha Miranda, "quase, quase na favela", e os primeiros passos da carreira em bailes funk, quando o cachê não ultrapassava R$ 150 (hoje ele pode superar R$ 200 mil).
Foi interrompida pelo menos quatro vezes por aplausos. A primeira leva veio quando ela defendeu o ritmo carioca - que chegou a ser alvo de debates no Senado sobre eventual criminalização, no ano passado.
"Antes de cantar, eu nunca tinha ido à zona sul do Rio de Janeiro. Então é muito difícil você cantar o 'barquinho vai, a tardinha cai' (referência à Bossa Nova) se você nunca viu essas coisas", disse.
"O funkeiro canta a realidade dele. Se ele acorda, abre a janela e vê gente armada e se drogando, gente se prostituindo, essa é a realidade dele", continuou. "Para mudar as letras do funk, você tem que mudar antes a realidade de quem está naquela área."
Da "balada" para a sala de reuniões
Mas os olhos da plateia brilharam mesmo quando a cantora narrou suas estratégias para ganhar dinheiro e conquistar o público internacional.
Oito anos depois dos primeiros passos na trupe funkeira "Furacão 2000", Anitta é listada pela revista Vogue como uma das 100 pessoas mais influentes e criativas do mundo, pela Billboard dos EUA como a 10ª artista mais relevante do planeta em redes sociais e comemora mais de 240 milhões de visualizações do clipe Vai Malandra, que por semanas foi alvo de elogios apaixonados e críticas ferozes, de Bogotá a Nova York.
A virada veio quando ela demitiu sua empresária para construir a carreira por conta própria (a ex-colega hoje move um processo judicial contra Anitta).
"Antes, tinha uma equipe comigo e eu era só artista. Mas não concordava com o modelo de negócio, o dinheiro era mal investido. Abri minha empresa na cara e na coragem aos 21 anos. Eu achava que chegaria aonde queria no Brasil aos 30 e poucos. Aí, aos 22, já estava superbem."
Plano antigo, a carreira internacional foi antecipada.
"Fui sozinha para a Espanha conversar com empresários e produtores. Aí decidi ir para a rua. Comecei a pesquisar com o povo, na balada, perguntava quais sons eram aqueles, quem cantava, conversava com o DJ."
Repetiu a estratégia em Los Angeles, nos Estados Unidos, por meses. "Nessas baladas eu conheci vários artistas com quem depois cantei ou ainda vou cantar", lembrou.
Dormir não era prioridade. "Chegava da balada, tomava um banho e ia para a reunião com os produtores."
A uma plateia que se mostrava surpresa com a fluência da cantora sobre estratégias complexas de negócios, Anitta revelou passos calculados às paradas de sucesso estrangeiras em três idiomas.
"Vi que os três grandes mercados digitais são os de língua inglesa, língua espanhola e o português, porque o Brasil é muito grande. Eu pensei: se eu conseguir unir os números (de audiência) do Brasil e da América Latina, vou me equiparar aos do público em inglês", disse.
Se caísse no gosto dos brasileiros e dos vizinhos hispânicos, calculou, teria cacife - e público - suficiente para emplacar a carreira também nos Estados Unidos.
Os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro aceleraram as passadas mais uma vez.
"Caetano e Gil me chamaram para tocar na abertura da Olimpíada. Falei: vou cantar, claro, é um evento mundial, vai estar cheio de gringo no Brasil (...) Então, me programei para fazer uma música metade em inglês, metade em espanhol."
Anitta já se mantinha contato com fenômenos de audiência latino-americanos, como os colombianos J. Balvin e Maluma, com quem gravou duetos "que só fizeram sucesso anos depois".
"Quando as pessoas ouviam a voz deles, os reconheciam (porque eram famosos internacionalmente) e, automaticamente, também chegavam ao meu trabalho", contou.
Principal ritmo comercial dos vizinhos latino-americanos, o reggaeton (uma mistura de hiphop, reggae e ritmos latinos como a salsa) era novidade para a brasileira.
"Fui a Pedro Alvares Cabral do raggaeton", brincou. "O ritmo já estava lá, mas eu não conhecia".
"20 centavos fazem muita diferença"
Formada em Administração, Anitta relembrou os primeiros passos como mulher de negócios, quando estagiou na mineradora Vale, onde "cuidava de seguros e garantias internacionais".
Dividia o vale-transporte com o irmão, aprovado no vestibular da UFRJ.
"Ele passou, mas a gente nao tinha dinheiro para pagar a passagem. Muita gente não entendeu os protestos (de 2013), mas esses 20 centavos faziam muita diferença. Esses 20 centavos poderiam impedir meu irmão de ir para a faculdade", disse - novamente aplaudida.
Aos 17 anos, ouviu dos chefes uma proposta de contratação. Mas eles também queriam saber se ela se dedicaria 100% ao mundo corporativo.
"Falei, olha, eu prefiro tentar a minha carreira", lembrou. "Liguei para a minha mãe e contei. Ela apoiou e disse que viraria até faxineira para me ajudar. Meu pai ficou com ódio louco, disse que eu ia "rebolar para bandido'."
Ela continua, levando a plateia as gargalhadas. "Mas, depois que eu comecei a ganhar dinheiro, meu pai ficou ótimo. Agora jura de pé junto que estimulou desde o primeiro dia", brincou.
Após cantar à capela versos de "Downtown" (sucesso em espanhol com mais de 200 milhões de visualizações no YouTube), Anitta agradeceu e deixou o salão ainda sob assovios e palmas.
Fora do anfiteatro, uma estudante de Harvard guardava lugar em uma fila enorme, onde estava boa parte da plateia que havia pouco aplaudira a funkeira.
A jovem contou que esperava ali sua vez de ganhar autógrafos ou fotos com Anitta.
A reportagem precisou desapontá-la. Aquela era a fila da chapelaria.
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