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Dia do Escritor: nossa literatura precisa de mais leitores - e os merece

Garota lendo no sofá - Isaac Israels
Garota lendo no sofá Imagem: Isaac Israels

Colunista do UOL

25/07/2020 10h17

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Hoje, aqui no Brasil, é Dia do Escritor. Temos o que comemorar. A literatura brasileira vai bem. Não encontramos livros fabulosos em cada prateleira da estante de contemporâneos, é verdade. O ótimo e o magnífico são raridades em qualquer lugar e em qualquer tempo. Mas há bastante coisa boa sendo produzida e publicada por editoras dos mais diferentes portes. Há diversidade, há representatividade dos muitos brasis, há pujança. Basta olhar para fora da bolha (seja lá qual for sua bolha) para encontrar poetas, contistas, romancistas e outros tipos das letras que merecem atenção. É só passear pelo histórico da coluna para achar exemplos.

Por outro lado, o mercado editorial vai mal, muito mal. Se as principais redes de livrarias já vinham numa pindaíba tremenda que refletia no caixa das editoras, a pandemia deixou o buraco bem maior. O coronavírus também impregnou no pulmão de empresas que mantinham alguma saúde. Hoje, gente do setor precisa lidar com quedas de até 80% no faturamento enquanto bancos e governo viram a cara para quem integra um ramo da economia capenga há tempos. Aparentemente, esses CNPJs podem morrer numa boa, sem que ministro ou presidente se compadeça.

Num cenário mais amplo, há o acelerado processo de desmonte cultural. Quantos festivais literários nós perdemos nos últimos tempos? Todo mundo que persiste olha para as contas e não sabe bem o que fazer. Alguns tentam salvar o próprio bolso entuchando mais problemas no esvaziado bolso alheio; pelo que ouço, calotes disfarçados de renegociações é tendência preste a virar moda.

Nesse Dia do Escritor, a boa literatura contemporânea e a penúria do nosso mercado editorial convergem num ponto: ambos precisam com urgência de mais leitores. Não dá para acharmos aceitável alguém passar dois, três anos escrevendo um livro para vender mil exemplares, comemorar se bater os três mil e fazer festa das boas se alcançar os 20, 30 mil vendidos. É essa a realidade do escritor brasileiro, ainda que exceções existam em nichos como fantasia e sacanagem domesticada.

Isso converge com a pindaíba do mercado porque, no limite, o que falta mesmo para que livrarias, editoras e toda a cadeia relacionada ao livro tenha uma vida saudável são mais leitores. Todas as ações do setor deveriam partir do mesmo pressuposto: o Brasil precisa de mais gente lendo. A nossa literatura merece isso. Nossos escritores merecem ver seus contos, romances, poemas, ensaios... pautando debates públicos, sendo comentados em salões de beleza e provocando discussões com bafo de cerveja nas mesas enferrujadas de um botecão qualquer.

Está fácil? Não, não está. Aliás, beira a utopia. No entanto, o conformismo, o "literatura é para poucos mesmo", só contribui para que o buraco já gigantesco siga crescendo. Convido a pensar com grandeza. Se a coisa está horrorosa, miremos no que há de mais impressionante para tentar construir algo. Na França, Michel Houellebecq esgota tiragem de 320 mil exemplares em poucos dias, enquanto Leila Slimani já deve estar beirando o milhão de livros vendidos. E falo de autores com obras reconhecidas pela qualidade.

Podemos e precisamos discutir centenas de coisas, mas há o ponto fundamental que deve permear todas as outras discussões: a literatura brasileira e os escritores brasileiros precisam de mais leitores - e os merecem.

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