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Onde o novo ministro da Educação pode encontrar sexo sem limites

Nada de limites em "Jardim das Delícias Terrenas", pintura do século 16. - Hieronymus Bosch
Nada de limites em "Jardim das Delícias Terrenas", pintura do século 16. Imagem: Hieronymus Bosch

Colunista do UOL

14/07/2020 09h28

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Um se apresentou como doutor sem nunca ter concluído o doutorado. Outra bancou ser mestre em educação graças ao tal mestrado bíblico. O indivíduo que está abrindo a porteira para a boiada trucidar a Amazônia também fez mestrado imaginário. Já o ex-ministro que vazou para os Estados Unidos garantia que plantações de maconha tomavam conta de universidades pelo país.

O povo do governo Bolsonaro tem uma relação de conflito e delírio com o ensino superior, sabemos. O novo ministro da Educação, pelo visto, segue a toada de boa parte dos seus colegas. Milton Ribeiro, advogado, pastor presbiteriano e vice-reitor do Mackenzie, declarou em 2018 que os alunos aprendem nas universidades uma "prática totalmente sem limites do sexo". Isso se daria por meio do ensinamento do pensamento existencialista.

Independentemente do que prega ou não o existencialismo, há distância enorme entre falar sobre uma corrente de ideias e apontar aquilo como o que deve ser feito. Em todo caso, não sei qual ou quais universidades se encaixam nesse imaginário que o governo Bolsonaro faz do ambiente de ensino superior: um vasto campo cheio de pés de maconha onde pessoas transam adoidado enquanto falsificam seus títulos, ou algo do tipo.

Sexo sem limites mesmo eu só fui encontrar na literatura. Nesse contexto, mencionar Marquês de Sade é tão óbvio quanto necessário. Graças à criatividade e por meio de seus personagens, o francês deve ter gabaritado as práticas sexuais: escatologia, orgias intermináveis, desejos criminosos... Já leu Sade, ministro? Se achar que é pesado demais, recomendo um atalho: os estudos da Eliane Robert Moraes, doutora em filosofia pela USP - doutora de verdade, com tese aprovada e tudo. Ela é uma das maiores especialistas na obra do Marquês e na literatura libertina do século 18. O livro "Sade - A Felicidade Libertina" (Iluminuras) pode ser uma boa.

A Eliane também organizou um volume obrigatório numa biblioteca de sexo adoidado. "Antologia de Poesia Erótica Brasileira" (Ateliê) reúne versos sacanas que circulam pelo país desde o século 17, antes mesmo de termos universidade por aqui. Gregório de Matos, Drummond, Olavo Bilac e Hilda Hilst são alguns dos autores das boas safadezas. "Por Que Calar Nossos Amores - Poesia Homoerótica Latina" (Autêntica), com o amor sem preconceitos celebrado por nomes como Catulo e Horácio, pensadores de antes da Era Comum, mostra que mesmo cabeças retrógradas já deveriam ter entendido: homens podem amar homens, mulheres podem amar mulheres e assim vai.

João Ubaldo Ribeiro e sua "A Casa dos Budas Ditosos" e Pedro Juan Gutiérrez com "Trilogia Suja em Havana" (ambos da Alfaguara) também entram em qualquer lista sacana de respeito, bem como os versos de Glauco Mattoso e os transes e viagens de Zeca em "Pornopopeia", de Reinaldo Moraes. Do Reinaldão, aliás, o mais recente, "Maior que o Mundo" (Companhia das Letras), tem uma cena da alcova que toma boa parte das quase 500 páginas do livro. Sexo a perder de vista e bom para arrancar risadas do leitor. Do povo mais novo, encontrei momentos interessantes num passeio por "Orgasmo Santo", livro bem bonito com texto de Kah Dantas e ilustrações de Bruno Marafigo (saiu pela Gosto Duvidoso).

E há Cida Pedrosa, preciosidade da nossa literatura. Conhece os poemas da Cida Pedrosa, ministro? Pois deveria. É outra escritora imprescindível nesse verdadeiro universo de sexo sem limites.

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