"O Outro Lado do Paraíso" tem muito a aprender com "Thor: Ragnarok"
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Logo nos primeiros minutos de algum capítulo da semana passada de "O Outro Lado do Paraíso", o telespectador, ainda digerindo as últimas péssimas notícias do "Jornal Nacional", foi levado a uma tour de force pelo lado selvagem do Brasil profundo.
Tudo começou em um salão de beleza onde Bianca Bin, a protagonista da novela, havia se refugiado para disfarçar os tabefes que havia levado mais uma vez do marido abusador.
Entre um papo e outro, na sala de espera da manicure, a personagem de Eliane Giardini relatava o affair do filho com a empregada doméstica sem distrair-se do cunho racista e preconceituoso de suas observações.
No caminho para casa, o médico vivido por Eriberto Leão distraía-se ao volante enquanto refletia a respeito da própria sexualidade, sempre retraída e refratária.
Nem dez minutos se passaram e alguns dos temas mais caros à sociedade civil já haviam sido exibidos em ágeis pílulas de entretenimento de tom grave e pesaroso. A veloz experiência havia sido exaustiva.
Ao prestigiar o filme "Thor: Ragnarok", outra obra-prima da Marvel, não me escapava da memória as cenas de tamanha intensidade da novela das 21h da Globo. O mais recente lançamento do Deus do Trovão é uma aventura de ação, dessas que fazem um completo e revigorante passeio pelas emoções humanas.
Os temas tratados também são graves como os da novela. Estamos falando de alienação parental, senso de pertencimento e até mesmo da manutenção da fé depois de uma grande tragédia. Apesar de pertencerem a um universo narrativo bem mais lúdico, são questões com as quais não só podemos, mas devemos nos conectar corriqueiramente.
Quando Thor nos distrai fazendo rir, torcer e chorar (ainda que de rir, novamente), compreendemos com mais plenitude as mensagens apresentadas como diretivas primárias da história. OK, talvez secundárias --as primárias são sobre vender bonequinhos.
O que nos leva de volta a "O Outro Lado do Paraíso". A crueza com que grandes mazelas são abordadas acaba por isolar o público das melhores intenções do autor Walcyr Carrasco.
Os assuntos levantados são fundamentais e é ótimo que exista o esforço de tratá-los com a seriedade que merecem. Mas caso continue evitando trazer à baila a leveza e a graça da falência humana, a promissora novela continuará parecendo uma sequência de cenas retiradas de um programa de conscientização social.
Ainda sobre falência humana...
Tive a oportunidade de assistir em primeira mão ao documentário "Jim & Andy: The Great Beyond", mediante pagamento de recorrente mensalidade à Netflix.
Teoricamente seria um filme sobre a realização de "O Mundo de Andy", cinebiografia de 1998 do humorista Andy Kaufman, dirigida por Milos Forman e protagonizada por Jim Carrey. Não compre gato por lebre: trata-se apenas de uma desgostosa visita ao combalido ego do eterno Ace Ventura.
As imagens de bastidores do filme, quando Carrey teria sido "possuído" pela personalidade caótica de Andy Kaufman, azucrinando tudo e todos, na verdade servem como um sutil fio condutor para que o ator possa fazer algumas considerações a respeito da própria trajetória.
Com o olhar perdido e alguma melancolia ensaiada, o eterno Máskara parece acreditar que a longa barba grisalha concede alguma profundidade às questões filosóficas juvenis que verbaliza ao longo de 1h30 de duração.
Seria de bom alvitre ocupar esse tempo revendo o excelente filme de Milos Forman. A menos que você tenha interesse em acompanhar uma curiosa autobiografia de Jim Carrey onde o único entrevistado é ele mesmo, o eterno Lóide. Por mim, tudo bem.
Cantinho dos Leitores
Enquanto lia a enxurrada de cartinhas que chegaram até a redação ordenando minha degola graças às opiniões que teci sobre "Liga da Justiça", me ocorreu uma bela canção de Jeff Tweedy que ajuda a entender alguns problemas do filme.
Como lutar contra a solidão?
Sorria o tempo todo
Como não admitir que foi justamente com esse intuito, lutar desesperadamente contra a solidão, que a DC decidiu incluir uma série de piadinhas ao longo do filme?
Mas infelizmente boa parte da audiência não viu graça nenhuma em meus comentários sobre o blockbuster menos empolgante da temporada para os investidores. Veja a seguir.
"Chico, talvez você não tenha mais idade para esse tipo de filme. Deixa a crítica para alguém mais novo. Os filmes da Marvel, sem exceção, são todos de medianos pra ruim."
elvis costello
Bom, antes de qualquer coisa, gostaria de dizer que é uma honra receber um feedback do grande Elvis Costello. Sou um grande fã daquele acústico com o Burt Bacharach. Quanto aos filmes da Marvel, talvez seja o caso do senhor deixar os comentários para alguém mais novo.
"Procure tratamento, é sério, ontem estava falando mal dos cavalinhos do Fantástico, hoje está destilando seu ódio contra super herois que você nem conhece direito, seu amargor ou é um personagem que criou para chamar a atenção ou está com problemas afetivos, mas para quem se especializou em falar de BBB até que da para entender seu nivel."
MarcioRogs
Ninguém entendeu que eu falei bem dos cavalinhos! Teci apenas elogios à engenhosidade da estratégia. Já viu alguém falando mal do Cavalo de Tróia? Tirando os troianos, claro. Sobre conhecer pouco os super-heróis, minha conta bancária adoraria que você estivesse certo.
"Como uma pessoa que tem coragem de se colocar como crítico de cinema fica USANDO O CELULAR DURANTE UMA SESSÃO DE CINEMA !!!! Se fosse um profissional da chamada Sétima Arte, isso seria motivo para rescisão de contrato. Agora, em se tratando de alguém sem tal qualificação, isso só demonstra a total falta de educação e de respeito para com os outros que estão na sala de cinema. Ficou incomodando os outros com uma lanterna acessa no meio da sala. Que parte do 'Desligue o seu celular' exibido no início do filme você não entendeu? Lamentável..."
Minero SCS
Em minha defesa, devo dizer que sentei no fundo e a sessão estava tão vazia quanto todas as outras na América do Norte. Mas realmente cometi um grave equívoco e venho a público me desculpar com a rapaziada do Kinoplex Itaim, que até preparou uma animação muito simpática para evitar esse tipo de constrangimento. Pelo menos não fumei dentro da sala.
O amigo leitor pode rebater minha crítica sobre o filme da "Liga da Justiça" neste link, e ainda aproveitar para saborear todos os comentários que estão abalando minha autoestima. Caso seja de vosso interesse, também é possível ler o que escrevi a respeito dos Cavalinhos do Fantástico por aqui -- e lá os feedbacks são ainda mais cruéis.
Espero que um dia possa fazer as pazes com o povo brasileiro. Enquanto isso, voltamos a qualquer momento com novas informações.
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