Pintura mais cara do mundo, obra de Da Vinci pode não ser exibida no Louvre
Considerada a pintura mais cara do mundo, a tela Salvator Mundi, atribuída ao italiano Leonardo da Vinci, foi vendida em um leilão, em 2017, por US$ 450 milhões a um príncipe saudita. Desde então, seu paradeiro se transformou num mistério, e ninguém sabe dizer quando a obra poderá ser novamente vista pelo público.
O Museu do Louvre, em Paris, prepara uma exposição sobre o pintor e requisitou o empréstimo da tela. Segundo o jornal britânico The Guardian, uma porta-voz do museu francês confirmou que foi feito o pedido, mas que a resposta ainda não havia chegado.
O quadro de 65x45 centímetros, em que Cristo é retratado bendizendo com uma mão o mundo enquanto a outra segura uma esfera transparente, seria exposto em setembro de 2018 no museu do Louvre de Abu Dhabi, parceiro homônimo da instituição francesa. Mas foi anunciado o adiamento da exposição, sem mais explicações.
O Louvre da capital francesa organiza em 2019 uma grande retrospectiva de Leonardo da Vinci e deseja expor a obra. "O Louvre solicitou ao Ministério da Cultura e do Turismo de Abu Dhabi o empréstimo do quadro", confirmou o museu à AFP. "Mas ainda não obtivemos resposta", afirmou.
Não há informações oficiais sobre quem comprou a obra. Segundo o Wall Street Journal, o comprador seria o príncipe saudita Badr bin Abdallah, que teria atuado em nome do poderoso príncipe herdeiro da Arábia Saudita, Mohamed bin Salman (MBS), que nunca confirmou nem desmentiu essa informação.
Para a Artprice, líder mundial de bases de dados sobre cotação de arte, os ulemas (teólogos) da universidade Al Azhar do Cairo recomendaram que MBS não exibisse o quadro por questões religiosas, uma vez que representa Jesus como o salvador do mundo, como Deus, cuja representação é impossível para o Islã. Outras fontes, incluindo historiadores, compartilham desta opinião.
O Ministério da Cultura e do Turismo dos Emirados Árabes não quis responder às perguntas da AFP e limitou-se a garantir que é "dono" do quadro.
O Conselho Internacional de Museus, que registra o depósito de obras nos museus, também não quis confirmar nem negar se um procedimento entre o Louvre de Abu Dhabi e o proprietário de Salvator Mundi para formalizar o depósito foi feito.
Mistérios sobre localização e autoria
Os especialistas estão divididos sobre a localização atual da pintura. Alguns falam do depósito do Louvre em Abu Dhabi, mas outros consideram que a obra nunca chegou até lá. Esse mistério se soma às dúvidas já existentes sobre a autoria do trabalho, que poderia ter sido realizado por discípulos de Da Vinci, e não pelo mestre.
"Alguns detalhes não enganam", como a má execução de um dedo, "a rotação do dedo médio", "anatomicamente impossível", explica Jacques Franck, especialista da técnica pictórica do gênio italiano, sendo Da Vinci um grande conhecedor do corpo humano. "Na época em que o quadro foi pintado (por volta de 1500), Leonardo da Vinci fazia seu estúdio executar suas obras, uma vez que tinha muito pouco tempo", ele diz.
Daniel Salvatore Schiffer, filósofo da arte e grande conhecedor desta questão, também "nega" a "paternidade da pintura". "Quando se analisa em detalhes, nada é de Leonardo", ele afirma. Além disso, "Salvator Mundi nunca é mencionado na correspondência de Leonardo da Vinci" ou na de seus contemporâneos, explica.
A polêmica, surgida há mais de um século, voltou recentemente com o lançamento do livro "The Last Leonardo" (O Último Leonardo), do historiador da arte inglês Ben Lewis. Nele, o autor assegura que a National Gallery de Londres, que expôs a obra em 2011, não levou em conta a opinião de cinco especialistas consultados para autentificar o quadro.
Dois emitiram um "veredito favorável", outro se opôs e os dois restantes não se pronunciaram. Por essa razão, a obra foi identificada como uma criação autêntica de Leonardo da Vinci, explicou Ben Lewis à AFP. Contudo, a National Gallery nunca mencionou as dúvidas sobre a autenticidade da obra. "Foi complicado vendê-la, muitos museus não acreditaram no trabalho dos peritos", já que a obra "estava em más condições", acrescentou.
Dianne Modestini, restauradora do quadro, não entende "a polêmica" e assegura que "Da Vinci o pintou". "Quando me pediram para fazer a restauração, não sabia quem havia pintado o quadro, apenas que era um grande artista", explicou à AFP a especialista americana, que lembra que quando examinou a pintura pela primeira vez, em abril de 2005, "estava em um estado lamentável, muito deteriorada".
As dúvidas sobre a autoria teriam "levado o dono da pintura" a não expô-la "até que os especialistas de Leonardo entrassem em acordo", segundo Franck. "Se o Louvre não recebeu resposta, [...] a obra não será exibida", prevê, considerando que se trata de uma "questão geopolítica".
O Louvre poderia "manchar sua credibilidade e reputação" ao endossar uma obra sobre a qual ainda há dúvidas, considera Schiffer.
O Louvre de Abu Dhabi foi inaugurado em novembro de 2017 pelo presidente francês, Emmanuel Macron, e pelo homem forte dos EAU, o xeque Mohamed bin Zayed al Nahyan.
A parceria entre os dois países prevê que Paris contribua com seus conhecimentos, empreste obras de arte e organize exposições temporárias por 1 bilhão de euros. Apenas a concessão do nome "Louvre" até 2037 aportou 400 milhões de euros para o museu parisiense.
Mas a credibilidade da Christie's, a casa que organizou o leilão, também está em jogo, dizem os especialistas.
"Conduzimos investigações exaustivas que levaram à atribuição desta pintura em 2010. Nenhuma discussão ou nova especulação desde a venda de 2017 levou-nos a rever esta posição", disse à AFP um porta-voz da casa de leilões.
E sem resolver o mistério sobre a localização atual da famosa pintura, limitou-se a confirmar que o trabalho foi "transferido com sucesso" para seus "novos proprietários".
Cronologia
Sécs. 15, 16 e 17 - A obra teria sido uma encomenda do rei Luís 12, da França; alguns dizem que depois ela passou pelas cortes dos ingleses Carlos 1º e 2º, no século 17
1900 - É adquirida pelo britânico Francis Cook; quadro é creditado a Bernardino Luini, assistente de Da Vinci
1958 - É vendida na Sotheby's por 45 libras
2005 - Marchands americanos a compram por cerca de US$ 10 mil, crendo que a autoria seja de Da Vinci
2011 - Após autenticação por experts, tela integra exposição na National Gallery, em Londres
2013 - Obra é vendida por US$ 80 milhões e, pouco depois, revendida a US$ 127,5 milhões
2017 - Torna-se o quadro mais caro da história ao ser negociado por US$ 450 milhões
*Com informações da AFP e da Folha de S.Paulo.
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