"A Sombra do Pai": como é gravar um filme de terror com criança no Brasil
O mundo do suspense e do terror adora usar crianças, e o filme brasileiro "A Sombra do Pai", que chega hoje aos cinemas, segue neste caminho. A protagonista do longa escrito e dirigido por Gabriela Amaral Almeida é a garotinha Nina Medeiros, que tinha nove anos na época da gravação.
Nina vive nas telas Dalva, que perdeu a mãe e vive com o pai, o pedreiro Jorge (Júlio Machado). O problema é que eles não conseguem se comunicar e Dalva acaba tendo de cuidar do próprio pai e ainda lidar com o luto e as saudades da mãe. Com influências da tia, Cristina (Luciana Paes), ela começa a mexer com magia, o que vai desencadear o suspense e o terror na história.
Gabriela conta que Nina foi escolhida após testes com 300 crianças e que foi preciso um trabalho específico para que a atriz mirim conseguisse lidar com as gravações e com temas que fossem apropriados para uma criança.
Roteiro diferenciado
"É um personagem difícil, porque dá sentido a todos os outros personagens. Eles reagem a ela. Então, eu estava atrás de uma menina com 'espírito' antigo, mas como encontrar?", conta Gabriela. "O determinante foi a energia que ela tinha para participar de tudo que a gente propunha. Ela tinha as características que a gente precisava, criatividade, resistência e uma facilidade grande de sair de um registro pro outro", adiciona a diretora.
Gabriela escreveu um roteiro novo, só para Nina. Era como um livro infantil, sem as cenas do pai da personagem. A atriz mirim não teve acesso à história toda.
"Trabalhei com ela em uma fábula de uma menina que queria fazer as pazes com o pai", explica. Isso incluía entrar no "mundo" de Nina e conversar com ela nos termos do roteiro dado a ela, para não dar detalhes extras e ajudá-la a interpretar aquela história.
Hoje com 12 anos, Nina relembra com carinho da experiência. "Foi muito legal. Estar no meio dos adultos ajudou bastante, aprendi muitas coisas, com o Julio, com a Gabriela", disse a atriz, que esteve na dublagem de "Dumbo" e em "Annie, o Musical", de Miguel Falabella.
Stephen King à brasileira
"A Sombra do Pai" é o roteiro mais antigo em que Gabriela Amaral Almeida trabalhou. Formada em cinema em Cuba, ela já desenvolvia o projeto antes de lançar "O Animal Cordial" no ano passado.
E o roteiro tem relação com a passagem por Cuba. "Eu defendi uma tese sobre Stephen King e o filme tem muitos elementos das coisas que estudei. Tem algumas imagens que me surgiram antes mesmo da história, de tratar de maternidade, plantas, natureza. Paralelamente desenvolvo o tema da relação pai e filha", diz ela.
Gabriela explica que King é um autor que "parte muito da desintegração do núcleo familiar norte-americano. Ele tirou o gótico do castelo e colocou o horror nas casas, nas famílias, para ver como elas resistem àqueles eventos". A diferença está no ambiente.
"Quando me confronto com a história dessa família, da Dalva e do Jorge, o que me interessa é a ausência paterna, a sobrecarga da figura feminina, como as crianças crescem sem a presença de um pai. E isso numa escassez material, numa realidade da sociedade brasileira, que é oposto da realidade retratada pelo Stephen King", afirma a diretora.
Por fim, Gabriela falou sobre sua experiência de fazer uma história que lida com magia. "Para mim é um recurso que aumenta o enigma das questões. Não sou crente nessas coisas, mas também não sou descrente. Na narrativa de horror, o que não é explicado só aumenta o enigma e essa narrativa fantástica deixa as coisas sem uma resposta imediata", concluiu Gabriela.
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