Acusado de assédios, Casey Affleck tenta redenção com filme em tom feminista
Casey Affleck parece determinado a limpar a própria imagem em Hollywood. Ainda à sombra de dois casos de assédio sexual, ocorridos em 2010, o ator levou ao Festival de Berlim seu segundo longa como diretor, "Light of My Life", que traz elementos marcadamente feministas. Exibido na tarde desta sexta-feira (8), o filme foi visto por muitos como uma tentativa de o galã se redimir dos erros sexistas passados.
Mesmo ganhando o Oscar de melhor ator em 2017, por "Manchester à Beira Mar", Affleck viu seu prestígio minguar em questão de meses, com a explosão do movimento feminista #MeToo ainda naquele ano. A indústria do cinema ganhou uma nova sensibilidade, hostil ao machismo, e o Oscar de Affleck marcou o fim de uma era em que homens podiam ser sexistas e ainda ganhar prêmios.
Um mundo sem mulheres?
Após um tempo discreto, Affleck quer agora reavivar a carreira. "Light of My Life" é um misto de ficção científica, drama e suspense que se passa em um mundo distópico, em que praticamente não há mais mulheres: um vírus terrível matou praticamente todas elas. Uma das poucas a restar foi a pequena Rag (Anna Pniowsky), criada por seu pai (vivido pelo próprio Affleck) como se fosse um menino para não chamar atenção dos demais homens. Afinal, ele teme que a garota possa ser molestada ou raptada.
Com essa premissa, Affleck (também autor do roteiro) faz um filme cujo centro é a relação entre pai e filha, mas que trata paralelamente de questões específicas sobre a mulher. Para além da importância reprodutora, o longa ressalta o quanto o sexo feminino é essencial para um mundo se manter minimamente civilizado e em equilíbrio; a Terra só povoada por machos, segundo o filme, seria um caos, completamente entregue à barbárie.
O filme também fala de empoderamento feminino por meio da figura da jovem Rag, que não apenas exige comportamentos menos machistas do pai como também, aos poucos, se torna uma heroína na trama.
Uma tentativa de redenção?
Affleck conversou com a imprensa, em Berlim, mas foi o mais evasivo possível sobre se teria feito o filme para suavizar sua imagem em Hollywood. "Fiz o filme antes de tudo isso [as discussões sobre feminismo] virar um tópico das conversas. Essas ideias eram coisas que já estavam perto do meu coração, não foi uma resposta a nada", disse o diretor.
"O filme provavelmente é [feminista]. Mas não sou um expert no assunto para saber. Tem alguns dos valores e ideias [do feminismo], mas não quis fazer algo político. A intenção era mesmo fazer um filme sobre um pai e uma filha", desconversou. "Os valores do filme eram algo que já tínhamos antes desse diálogo público. Não houve muita reformulação nesse sentido".
Elisabeth Moss no filme: coincidência?
"Light of My Life" traz um outro elemento que mostra haver ali um quê de mea culpa: a escalação de Elisabeth Moss (estrela do seriado feminista "The Handmaid's Tale") para o único papel de mulher adulta do filme. A atriz surge em flash backs como a mãe de Rag, morta pela virose.
"Foi mais uma coincidência [a escalação de Moss]: eu a escolhi só porque é uma grande atriz. Já a conheço há algum tempo, é muito inteligente e gosto do estilo dela de atuar, ao mesmo tempo naturalista e emocional", diz o cineasta. "A personagem dela tem que impactar o público com apenas poucas cenas. Depois precisam sentir sua falta. O filme é sobre equilíbrio, e aquela é uma pequena família que não tem mais isso."
E o filme é bom?
O longa de Affleck tem bons momentos de suspense, e uma excelente interação entre ele e a atriz-mirim Anna Pniowsky. E o diretor reserva a si mesmo alguns monólogos em que mostra o quanto é um ator de talento excepcional; em uma das melhores cenas, tenta atrapalhadamente explicar à filha o que é uma relação sexual e como seu corpo mudará com a puberdade.
Há também outra cena de muito alto nível, logo no começo, em que ele conta para a filha uma história sobre uma raposa fêmea. Com o decorrer da narrativa, porém, o marido da protagonista do conto acaba ganhando mais destaque. A garota logo se irrita e protesta: "Mas a história não era sobre a raposa fêmea?".
"Não sei o que as pessoas vão dizer sobre o filme, não sou responsável por isso. Não é algo que eu possa controlar", disse o diretor, pressentindo que muitos o verão como uma forma de reconstruir o prestígio abalado.
Mudanças nos personagens
Embora tenha dito que o material sofreu poucas mudanças, em outro ponto da conversa Affleck deixou escapar que o roteiro passou por pelo menos uma grande transformação. "No começo, o longa era sobre um pai e um filho, dois homens. Eu estava criando meus filhos como pai solteiro, e isso pode ser complicado. Mas eles não quiseram que o filme fosse sobre eles, então troquei [a personagem] para uma menina", diz.
"Baseei-a em duas sobrinhas que tenho. Achei que seria igual, mas depois você pensa melhor e percebe: as conversas [entre um pai e uma filha mulher] são diferentes". Affleck reconheceu que seu filme precisou, sim, ser retrabalhado para se adequar a questões especificamente femininas.
"Light of My Life" foi exibido em Berlim fora da competição, na Mostra Panorama. O filme ainda não título em português nem previsão de estreia no Brasil.
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