Roger Waters desafia Justiça e diz: "Última chance de resistir ao fascismo"
Berço da Lava Jato e palco da prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o estádio Major Antônio Couto Pereira, em Curitiba, foi o palco escolhido para o penúltimo show da turnê do músico inglês Roger Waters, na véspera da realização do segundo turno das eleições.
Com uma turnê fortemente politizada, Waters voltou a chamar o presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) de fascista de forma indireta, enfrentando as decisões judiciais que pediram para que não emitisse opiniões sobre as eleições.
Após "Welcome To The Machine", pouco antes das 22 horas, o telão projetou uma imagem: "São 9h58 e nos disseram que depois das 22 não podemos falar sobre as eleições". Na sequência, surgiu a frase: "Essa é a nossa última chance de resistir ao fascismo antes de domingo".
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O telão informou ao público de que teriam mais 30 segundos para se manifestar, projetando a #elenao. No estádio, o tom foi mais de vaias do que de aplausos, e os gritos de #elenao foram abafados pelo de "mito". Por fim, o telão disse que eram 22 horas, com os dizeres "obedeçam a lei". Ao se aproximar do público, o inglês foi ofendido por algumas pessoas do público, com xingamentos em português e em inglês.
Durante "The Wall", seis crianças apareceram vestidas de presidiárias. E, no decorrer da música, tiraram o uniforme, dando destaque a uma camiseta com os dizeres "Resist", frase também projetada no telão. A plateia reagiu com um misto de vaias e aplausos, para o estádio ser tomado pelos gritos de "mito". Waters respondeu que amava a todos indistintamente e que seu show era sobre amor.
Em seguida, Waters repetiu as mensagens apresentadas nos shows anteriores, pedindo resistência ao antissemitismo e ao neofascismo e citando nomes de alguns políticos, como Putin, Trump e Le Pen. No último nome, havia uma tarja preta, que em shows anteriores trazia o nome de Bolsonaro. Uma das frases projetadas dizia para resistir àqueles que "premiam a tortura".
As manifestações contrariaram uma decisão do juiz eleitoral Douglas Peres, a partir de um pedido do Ministério Público Eleitoral, na última sexta-feira (26), de que havia uma proibição ao músico de exibir "conduta que configure propaganda de apoio ou de repúdio" a qualquer um dos presidenciáveis.
A partir das 22 horas, de acordo com a lei eleitoral, estaria vedada qualquer manifestação pública sobre o tema. Caso Waters descumprisse, ele poderia pagar multa de até R$ 15 mil e até mesmo ser preso. Se a manifestação fosse realizada depois da meia-noite, poderia se configurar boca de urna, levando o inglês à prisão. A cantora Alcione, que também realizou show em Curitiba neste sábado, foi notificada da decisão. Em seu Facebook, a artista declarou voto em Fernando Haddad (PT) por volta das 20 horas.
Polarização
O show de Waters manteve a polarização na cidade, registrada em dois eventos nas proximidades do estádio Couto Pereira. Pela manhã, no Santa Cândida, militantes celebraram os 73 anos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, detido na superintendência da Polícia Federal. Ao longo do dia, manifestantes pró-Bolsonaro se reuniram na Praça Nossa Senhora de Salete, no Centro Cívico, com discursos de apoio ao candidato e buzinaços.
Para um estádio lotado, com 41.480 ingressos vendidos, Waters manteve a setlist de toda a turnê, dominada pelos clássicos do Pink Floyd, com canções como "Pigs", "Wish You Were Here", "Money", "Comfortably Numb", "Time" e "Another Brick in the Wall", além de músicas de sua carreira solo.
A posição dos fãs
Vestido com uma camiseta amarela com os dizeres "Meu partido é o Brasil", o empresário Marcello Venturella, de 40 anos, se destacava em meio à multidão majoritariamente vestida de preto. Segundo ele, Waters poderia se manifestar, desde que não tivesse usado a #elenão ou citado nominalmente Bolsonaro. "Fiquei bastante incomodado com as manifestações políticas dele. Um dos meus parentes não veio ao show por causa disso", afirmou.
Venturella diz ser fã e ter ciência de que a obra de Waters tem um viés "socialista". "Apenas não concordo com o fato de ele fazer campanha para um candidato e ser contrário ao Bolsonaro", relatou. Mesmo com a polarização política, o empresário alegou não se sentir inseguro de vir ao show com uma camiseta em alusão ao candidato do PSL. "Acredito que Curitiba a grande parte dos eleitores é de direita, o que me dá segurança", disse.
O professor Ailton Lopes, de 42 anos, veio ao show acompanhado da filha Ariadne, de 17 anos. Para o professor, as manifestações são típicas de Waters e fazem parte da história da banda. "Ele perdeu o pai na Segunda Guerra Mundial, e os seus fãs compreendem esse viés da música. O rock tem essa veia ativista", analisou. "Não criei expectativa para nenhuma mensagem dele hoje, vou ficar na surpresa", acrescentou.
O casal formado pelo aposentado Luiz Antonio Aznar, de 63 anos, e pela enfermeira Dayse Maioli Garcia, de 64 anos, são favoráveis às manifestações de Waters pelo que ele viveu em sua carreira. "Ele tem direito de opinar aqui. Nós vivemos em uma democracia", disse Aznar. "Espero que ele se manifeste durante o show", afirmou Dayse.
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