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De volta a SP, Andrea Bocelli enterra erro e faz Maria Rita brilhar

Andrea Bocelli se apresentou no Allianz Parque, em São Paulo - Mariana Pekin/UOL
Andrea Bocelli se apresentou no Allianz Parque, em São Paulo Imagem: Mariana Pekin/UOL

Leonardo Rodrigues

Do UOL, em São Paulo

29/09/2018 23h17

Não há crise, eleição, protesto, trânsito ou mau humor crônico que diminua o interesse do paulistano por Andrea Bocelli. Mesmo com ingressos chegando a R$ 1.800, cerca de 45 mil pessoas lotaram o Allianz Parque, neste sábado (29), na primeira de duas apresentações do tenor em São Paulo, todos com um aperto no coração e uma ideia na cabeça: ver de perto (ou quase) um dos tenores mais populares da história, um "queridão" do público brasileiro.

Carismático, Bocelli entregou um recital grandioso e competente, e mais do que isso: enterrou a memória do deslize de dois anos atrás, no mesmo estádio, durante a participação da cantora Paula Fernandes. Na ocasião, por um erro de comunicação, um trecho de "Vivo per Lei" deixou de ser cantado. Coincidência ou não, o hit não integra mais o repertório.

A apresentação iniciou pontualmente às 21h, abrindo com orquestra e trecho de "O Guarani", ópera do brasileiro Carlos Gomes. Mais "formal" o primeiro ato trouxe composições de Verdi, Puccini e Ponchielli. Foi a vez de clássicos como "La Donna È Mobile" e da soprano Larisa  Martinez brilhar, especialmente em "O Soave  Fanciulla".

Maria Rita cantou ao lado de Andrea Bocelli - Francisco Cepeda/Agnews - Francisco Cepeda/Agnews
Maria Rita cantou ao lado de Andrea Bocelli
Imagem: Francisco Cepeda/Agnews

Repetindo os shows da turnê no país, o tenor encerrou a primeira parte e, 15 minutos depois, deu início a uma grande homenagem ao Brasil e à nossa música. Primeiro, com um medley bossa nova conduzido pelo maestro Eugene Kohn e a Orquestra Juvenil Heliópolis, projeto social que conta com 60 jovens músicos da periferia e tem o apoio de Bocelli.

Em seguida, a cantora Maria Rita subiu ao palco para cantar "Me Deixas Louca", famosa com Elis Regina, e "Tristeza", em dueto em português com o Andrea Bocelli. Ela ainda voltaria ao palco para outras músicas, incluindo o hit "The Prayer". Terminou ovacionada. Tímido, Bocelli limitou sua interação com o público a alguns sorrisos e parcas palavras. "Esta é dedicada a todas as mães mais velhas", disse antes de "Mamma", em italiano e inglês.

Mais destaques: a participação do duo de violonistas clássicos Magdalena Kaltcheva e Carlo Corrieri, que trouxe ecos flamencos e o coro de "Parabéns a Você" puxado pela plateia, surpreendendo o tenor, que completou 60 anos no Brasil. A overdose de Itália em "Funiculì, Funiculà", acompanhada por raras palmas percussivas e "Granada", famosa com Mario Lanza, também emocionaram.

Com maioria na faixa dos 50 e 60 anos, o público acompanhou tudo isso em quase total silêncio, como se estivesse transportado para a maior sala de ópera a céu aberto do país. E por uma noite ele foi. Tanto que o recorrente chiado vindo dos alto-falantes passou despercebidos em algumas músicas. Para o brasileiro, que aplaudiu "Con te Partiró" e ?Nessun Dorma? de pé, Bocelli é rei --e não só Roma.

Mas por que ele faz tanto sucesso por aqui?

"Eu sou uma pessoa mais 'madura', e pessoas dessa minha geração gostam de música ligada ao rock, mas também à melodia, à ideia do romantismo. O Bocelli é um artista que sabe ser erudito sem aquele arranjo grandioso, aquela pompa. E isso acaba atraindo muita jovem também", opina o administrador de empresas João Pagliuca, 64.

O eletrotécnico Reginaldo Flausino prefere destacar os dotes vocais do "pop erudito" do tenor. "O que me impressiona nele é que, ao contrário da maioria, ele canta naturalmente. Parece que não faz esforço nenhum usando a voz. Você vê que nenhuma veia do pescoço dele salta. É como se estivesse conversando com você com a voz limpinha."

Para a assistente social Márcia José Moscardini, 55, o amor é o que manda nessa relação Brasil-Itália. "Acho que o brasileiro gosta tanto dele porque nós gostamos do romantismo. Também temos certo fascínio por ele ter uma deficiência. Assisti ao filme da história dele em Milão. Foi um jovem rebelde, tinha tudo para ser roqueiro, mas descobriu na voz uma razão de ser. Ele é impressionante."

O marido dela, o médico José Moscardini, 61, concorda e vai além. "É exatamente isso. Fora que ele é uma pessoa que passa algo muito importante, que precisamos muito na correria e estresse do dia a dia. Ele passa calma e serenidade, com uma voz única."