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O adeus de "Sense8": atores prometem final emocionante e exaltam diversidade da série

Beatriz Amendola

Do UOL, em São Paulo

08/06/2018 04h00

“Sense8” estreou na Netflix em 2015 com uma proposta ambiciosa: falar de um grupo de pessoas conectadas entre si que, desafiando as leis da física, conseguiam sentir tudo o que as outras sentiam, mesmo separadas por milhares de quilômetros. Carimbada com os nomes de grife das irmãs Wachowski (“Matrix”) e filmada em vários países, a série foi acolhida por um grupo de fãs muito dedicados. Isso não impediu que “Sense8” fosse cancelada após sua segunda temporada, em 2017, mas foi essencial para que ela concluísse a história em um capítulo final, que chega ao serviço de streaming nesta sexta-feira (8).

Explica-se: após a Netflix anunciar o cancelamento da atração, que ficaria sem final, foi a mobilização intensa dos fãs nas redes sociais que fez a empresa reconsiderar e decidir encerrar a produção com um episódio de duas horas e meia. Os espectadores brasileiros, inclusive, tiveram grande papel nisso – o que foi reconhecido na vinda de parte do elenco da série a São Paulo no último dia 1º.

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Para os atores, o encerramento da série também caiu como uma surpresa. E os cinco que vieram ao País – Miguel Ángel Silvestre (Lito), Jamie Clayton (Nomi), Brian J. Smith (Will), Tina Desai (Kala) e Tony Onwumere (Capheus) – conversaram com a reportagem do UOL sobre como tem sido encarar a despedida de um projeto que teve uma vida mais curta do que o esperado.

Os sensates se divertem em carro no final de "Sense8" - Segolene Lagny/Netflix - Segolene Lagny/Netflix
Os sensates se divertem em carro no final de "Sense8"
Imagem: Segolene Lagny/Netflix

“Eu estou muito triste que todas as viagens vão acabar. Eu não sei quem vai pagar pelas minhas viagens”, brincou Tina. Indiana, ela começou sua carreira em Bollywood e não sabia que no mercado americano as séries podiam ser canceladas antes de concluírem suas histórias. “Como espectadora, estou feliz que a série está terminando bem, estou feliz por ela ter um final. Eu assinei contrato para sete anos, mas foram quatro, o que é bom. E a série levou uma mensagem forte, todo mundo se conectou. Ela fez o que tinha que fazer. Então, pelo menos a jornada ficou completa”. 

Brian elogiou a postura da Netflix em permitir a realização de um último capítulo para a saga dos oito “sensates”. “Não são todas as empresas que estão dispostas a fazer isso. Ou até a parecer que cometeram um erro. Tem sempre a ver com ego, manter sua imagem e não estar errado. Acho que a Netflix é um tipo diferente de empresa e muito sensível, na verdade”.

Não vamos contar aqui qual o desfecho (se você quiser saber, vá conferir mais da entrevista no YouTube do UOL), mas os atores são unânimes em afirmar que foram comovidos por ele. “Eu fiquei emocionada”, contou Jamie. “Tinha uma coisa que eu queria muito no final, e ela aconteceu”.

“Foi maior do que tudo que já vivi”, completou Tina. Brian foi categórico: “É uma coisa que só acontece uma vez na vida, para um ator”, disse, antes de descrever os dois meses de filmagens do episódio final como “mágicos”.

Inclusão e representatividade

Nomi (Jamie Clayton) e Amanita (Freema Agyeman) no final de "Sense8" - Bruno Calvo/Netflix - Bruno Calvo/Netflix
Nomi (Jamie Clayton) e Amanita (Freema Agyeman) no final de "Sense8"
Imagem: Bruno Calvo/Netflix

Quando “Sense8” estreou, a discussão sobre diversidade e inclusão nas produções de Hollywood já existia, mas ainda em estágios iniciais. E a série levou a representação a outro nível: há personagens latinos, negros, asiáticos, trans e homo/bissexuais, unidos por uma mensagem profunda de empatia e aceitação da diferença. Muito por influência, talvez, do próprio momento vivido pelas Wachowski na época. Lana havia passado por sua transição de gênero há pouco, e Lily estava no mesmo processo.

Jamie, que assim como sua personagem também é uma mulher trans, reconhece a importância que se ver nas telas tem para muitas pessoas. “Sendo a única pessoa do elenco assumidamente queer, tem sido realmente incrível ver o quão necessário isso era no espaço de Hollywood para jovens, pessoas queer, pessoas não-brancas. Recebi milhares de mensagens de pessoas – e ainda recebo – dizendo “obrigada”, gratas por finalmente se sentirem representadas de forma que eu nunca achei que podia acontecer, que eles nunca acharam que podia acontecer”.

Para a atriz, Nomi é importante por trazer uma representação diferente das que costumam cercar as mulheres trans no cinema e na TV. “Tantas personagens trans estão afogadas em clichês e estereótipos, e a história da Nomi nunca foi sobre a transição dela. Acho que isso foi o que mais fez as pessoas se identificarem com a Nomi. Eles finalmente sentiram: ‘essa é uma garota com um emprego e uma namorada’. Sou eu. Eu não sou uma vítima”.

Miguel também teve uma conexão muito pessoal com a história de Lito, um galã mexicano que assume sua homossexualidade: alguns de seus familiares, que são LGBT, foram perseguidos pela ditadura de Francisco Franco, que governou a Espanha de 1939 a 1975.

“Eu e minha irmã tivemos uma ótima educação, graças ao meu pai e uma das minhas tias, que é LGBT”, disse. “Minha geração, depois da ditadura, foi de um polo ao outro: começamos a ver as celebrações da autenticidade, e a ver como essas pessoas, mesmo com a violência do governo, lutaram. Para mim, foi lindo encontrar uma diretora que estava disposta a honrar, com amor e empatia, o que é lutar por seus direitos e para ser quem é. Foi uma forma de retribuir à minha tia tudo o que ela me ensinou, e por tudo o que ela passou. Enquanto eu assistia à primeira temporada, via como ela estava tocando pessoas de outras culturas que ainda lidam com essa violência com que lidamos no passado, me senti muito grato por dar vida a esse papel pelas cenas belas de Lana, por suas lentes, suas palavras”. 

Para Brian, a série se tornou um porto seguro para muitas pessoas. “Há uma estranheza na série, em termos de ela ser diferente de tudo. Ela é muito corajosa, ela não apresenta uma visão cínica da humanidade, como muitas fazem. Isso deixa a série fora do mainstream. E as pessoas fora do mainstream, sejam gays, trans ou queer, se sentem diferentes. De certa forma, há algo na diferença da série que as faz se sentir mais acolhidas. A série conforta porque ousa ser ela mesma”. Ele, porém, acredita que a inclusão ainda está longe de ser uma regra em Hollywood: “Até vermos mais pessoas como Jamie, até vermos isso acontecendo o tempo todo, ainda não aconteceu”.

Já Toby, que entrou em “Sense8” em sua segunda temporada, no lugar do ator Aml Ameen, considera um trunfo a diversidade da série. “Essa é importância dessa série: tudo é possível, e a variedade desse ‘tudo’ é maior do que você vê na TV normal”, explicou. “Acho que a série definitivamente fez sua contribuição que, ao lado de muitas outras séries, vai ajudar a transformar a cultura de uma forma positiva”.