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"Retrataria Anne Frank mesmo fora de Amsterdã", diz Kobra sobre novo mural

Renata Nogueira

Do UOL, em São Paulo

03/10/2016 21h25

Eduardo Kobra acaba de deixar sua assinatura em um patrimônio histórico de Amsterdã. O muralista brasileiro, que tem obras espalhadas por todo o mundo, assina o mural "Let me be myself" ("Deixe-me ser eu mesma"), que retrata Anne Frank e leva o nome de uma das frases mais célebres da garota judia assassinada aos 15 anos pelos nazistas e famosa postumamente com a publicação do livro "O Diário de Anne Frank".

A obra foi concluída no último domingo (2), coincidentemente a data em que se iniciaram as celebrações do Rosh Hashaná, o início do ano novo judaico. Para retratar Anne Frank, que viveu grande parte de sua breve vida na capital holandesa, o artista contou com a ajuda de dois assistentes - Agnaldo Brito e Marcos Rafael - e usou 450 latas de spray e 35 litros de tinta acrílica. O painel levou dez dias para ficar pronto.

A oportunidade de trabalhar em Amsterdã surgiu no início deste ano, quando o prefeito da cidade, Van der Laan, visitou São Paulo. A obra é uma parceria entre as duas cidades e está situada em uma área da cidade que abrigava a maior companhia de construção de navios da Holanda. A região agora se transforma em um pólo artístico e a obra de Kobra foi instalada em um prédio que deve abrigar o maior museu de arte de rua do mundo.

A ideia de retratar Anne Frank, no entanto, partiu do próprio artista, que sempre define o tema de seus projetos. "Eu já tinha a intenção de fazer um painel sobre a Anne Frank, mesmo que não fosse em Amsterdã. O convite surgiu e achei que era o momento de realizar", explica Kobra em entrevista ao UOL horas após retornar da capital holandesa.

Essa é a primeira vez que um trabalho deste tipo é permitido na área que fica ao norte da cidade, distante cerca de 4 km do centro. A Casa Anne Frank, a prefeitura e órgãos que administram a área foram consultados, já que Kobra foi o primeiro artista que ganhou permissão para fazer um trabalho deste tipo em um prédio tombado, parte do patrimônio histórico de Amsterdã.

Nos dez dias que levou para produzir o painel, Kobra pode observar o interesse principalmente dos moradores da capital holandesa em seu trabalho. Apesar de já contar com alguns turistas, a região onde o mural foi instalado ainda é majoritariamente ocupada pela população local.

"É um fenômeno que acontece em todos os lugares. Mas em Amsterdã pude observar as pessoas parando as bicicletas para fotografar e a vários jornais e TVs locais também deram bastante destaque", pontuou o artista sobre a curiosidade do público.

Para se inserir no contexto da obra, Kobra fez uma extensa pesquisa e visitou locais relacionados ao Holocausto acompanhando da comunidade judaica que vive na capital holandesa. "Let me be myself" é inaugurado como parte da série do artista brasileiro intitulada "Olhares da Paz", que conta com retratos de personalidades como John Lennon, Bob Dylan e Ayrton Senna.

Bicicleta em destaque

mural do artista Eduardo Kobra em São Paulo - Divulgação - Divulgação
Mural de Kobra na região da avenida Faria Lima, em São Paulo, estimula uso da bike
Imagem: Divulgação

Antes de seguir para Amsterdã, Kobra fez uma parada em Ravenna, na Itália, onde pintou um mural de 4 m² do escritor Dante Alighieri. Além das cidades europeias, ele já passou por Chicago e Cincinnati, nos EUA, Tóquio, no Japão, e pintou antes da Olimpíada um mural de 2.646,34m² no Boulevard Olímpico, no Rio de Janeiro, reconhecido pelo Guinness Book como o maior grafite do mundo.

Antes de viajar para Europa, Kobra se dedicou a pintar um mural em São Paulo, sua cidade natal, na região da avenida Brigadeiro Faria Lima, em Pinheiros. O painel traz um casal andando de bicicleta e tem como objetivo estimular a mobilidade urbana, tema defendido pelo muralista desde o início de sua carreira.

"A gente deve estimular essa cultura e promover segurança para o ciclista. Meus painéis são um incentivo e também uma forma de educação como um exemplo da própria cidade em que eu estava, Amsterdã, em que a bicicleta domina. Você vê muito mais bicicleta do que carro. Meu sonho é ver São Paulo transformada nesse aspecto. Isso melhora não só a vida de quem anda de bicicleta, mas também a vida de toda a cidade", opina.

De volta a São Paulo, o artista deve passar um tempo com a família. Depois, ele deve voltar aos Estados Unidos, onde já tem trabalhos agendados em Nova York, Nova Jersey, Houston e Miami.