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Este ano foi f*** para os youtubers, e 2016 vai ser ainda mais

Tiago Dias

Do UOL, em São Paulo

18/12/2015 07h00

Foi neste 2015 que Christian Figueiredo sentiu na pele o histerismo que provocava em seus seguidores. "Parece público de banda. É gritaria, choro", relata. O youtuber é um jovem de 21 anos como qualquer outro, franzino, com brinco na orelha. Não é músico, apresentador ou ator. E, mesmo assim, tem um público fiel de 4 milhões de seguidores em seu canal no YouTube, chamado "Eu Fico Loko".

Espontâneos, esses jovens de 20 e poucos anos tomaram o ano para si e revolucionaram a cultura jovem com vídeos de cara limpa, em formato de diário, esquetes e até conteúdo ficcional. São gente de verdade. E tudo bem se você ainda não sabe quem eles são. É questão de tempo: em 2016, esses criadores de conteúdo vão invadir sua vida, seja na TV, no cinema ou na livraria mais próxima.

"Parece a Beatlemania", compara Manuela Villela, gerente de parcerias do YouTube. A plataforma acompanhou o fenômeno mundialmente, mas percebeu contornos próprios no Brasil. Para ela, os jovens deixaram de idolatrar atores e cantores para buscar referência em alguém mais próximo. "É algo genuíno. É a vida como ela é. Essa autenticidade, inclusive, já extrapola a própria plataforma".

Prova disso é a estreia de Christian na literatura. Seu primeiro livro, homônimo do canal, vendeu 131 mil cópias. As tardes de autógrafos foram acompanhadas por uma multidão ruidosa de fãs e a publicação está há 35 semanas entre as mais vendidas, deixando para trás best-sellers como "O Irmão Alemão", de Chico Buarque, e "Cidades de Papel", de John Green. O segundo volume foi lançado nas vésperas da Bienal do Livro no Rio de Janeiro, em setembro, e já soma 80 mil exemplares vendidos.

As histórias que ele conta sobre a infância e adolescência ganharão em breve os cinemas. A adaptação do seu livro está em fase de roteirização e as gravações começam em maio do próximo ano. A ideia é lançá-lo em dezembro de 2016. Christian interpretará a si mesmo aos 18 anos, e um ator viverá o youtuber quando criança. E tem mais. "Ano que vem vai ser 'O' ano", promete.

Sem conseguir produzir uma atração nos mesmos moldes, as emissoras de TV também estão de olho nessa revolução cultural. Canal de experimentos científicos com 4,5 milhões de assinantes, o Manual do Mundo está no ar na Play TV e na Cartoon Network, e Christian em breve estará na TV aberta, estrelando um quadro semanal em um programa de "uma emissora grande", ele conta, sem entrar em detalhes. "Estamos negociando um programa próprio também, em paralelo". Durante a negociação, ele deixou claro: "Tem que ser o mesmo Christian do YouTube. Sem roteiro, da mesma forma. Senão não funciona".

As conquistas têm um sabor especial para o jovem que fazia testes para a TV aos 15 anos, sem ter passado em nenhum. "Agora fazem testes para ver quem vai atuar comigo", diverte-se ele, que hoje tem 15 pessoas ao lado para gerir sua carreira.

A imagem dos youtubers tem se mostrando uma grande aposta publicitária. É o perfil jovem e engajador que começa a chancelar marcas e produtos. Para Manuela, do Youtube, o sucesso comercial desse nicho deve mudar o conteúdo dos youtubers daqui para frente. "As pessoas vão começar a criar conteúdo com olhar de negócios, já temos um histórico de sucesso para contar".

Lucros de seis dígitos

História semelhante tem a curitibana Kéfera Buchmann, 22. Quando criança, ela alimentava o sonho de ser estrela de novela. Hoje, encabeça o fenômeno dos youtubers com lucros na casa dos seis dígitos e 6,8 milhões de inscritos no canal "5inco Minutos", o quarto canal brasileiro mais popular no YouTube.

Lá, ela faz desabafos, esquetes, atua e vende canecas e produtos oficiais, inclusive de sua cadela, uma pug chamada Vilma Tereza. A paródia de Kéfera para a música "Bang", de Anitta, foi um estouro: 14 milhões de visualizações, ultrapassando, na época do lançamento, os números da própria cantora. Instalada no Rio de Janeiro desde o início do ano, ela também se prepara para estrear no cinema, como protagonista do filme "É Fada", no qual viverá uma atrapalhada fada-madrinha. A direção é de Cris D’Amatto, do sucesso "S.O.S Mulheres ao Mar".

Seu livro "Mais do que 5inco Minutos" foi o quinto mais vendido do ano, segundo a Publishnews, com 186 mil exemplares, e lhe rendeu uma verdadeira ovação dos fãs durante participação na Bienal do Livro do Rio de Janeiro. Mas o maior feito de Kéfera no ano foi ter a agenda lotada de janeiro a dezembro. A assessora da youtuber resumiu bem o momento da superstar ao receber --e negar-- o pedido de entrevista do UOL: "Está uma loucura. Não dá tempo, não dá".

O primeiro R$ 1 milhão

Representante dos gamers, Pedro Afonso Rezende, 19, é o popular Rezendeevil. Ele observa os números que seu canal alcançou com orgulho: em 2015, faturou R$ 1 milhão apenas com anúncios da plataforma e já soma 1 bilhão de acessos. À frente dele, estão só as produções "Galinha Pintadinha" e "Porta dos Fundos", além do canal do cantor Michel Teló.

Há três anos, ele deixou de lado o sonho de ser jogador de futebol para se especializar em "Minecraft", popular jogo onde se constrói coisas a partir de cubos --o que o tornou um dos youtubers mais queridos das crianças de 5 a 10 anos. "Muitos não sabem nem falar direito, mas assistem ao canal", observa.

Morador de Londrina, ele diz que perde muitos convites para participar de campanhas publicitárias. O motivo? "Não gosto de viajar de avião". É da cidade paranaense que ele prepara o segundo livro, após lançar "Dois Mundos, Um Herói" --no qual ele é transferido para o universo paralelo do jogo-- e também figurar na lista dos mais vendidos.

Ele também já pensa em uma animação para o cinema. A TV, no entanto, não está no horizonte. "Um pessoal aqui da minha cidade me queria como apresentador, mas vai tomar muito meu tempo. E meu tempo é do canal".

Imagem é tudo

Prestes a completar 26 anos, Felipe Castanhari, do canal Nostalgia, chegou ao 6° lugar entre os canais mais populares por entender a importância da sua imagem. "Ano passado eu percebi que o Nostalgia era maior que o Felipe Castanhari, e o problema com isso é que as pessoas se engajam mais com pessoas. Você precisa que sua imagem esteja a frente do seu trabalho".

Pensando nisso, topou estrelar um quadro no programa "Pânico na Band", chegando a um público mais velho, que não está necessariamente no Youtube. "Um cara que veio dedetizar a casa essa semana só me reconheceu por causa do 'Pânico'", conta.

A carreira na TV, ele reconhece, não é sua prioridade. Prefere investir em seu primeiro livro no ano que vem, onde promete revelar a galinha dos ovos de ouro. "Quero contar como fazer bombar um canal no YouTube", revela. "Eu gosto de ser respeitado no meio. Se vou entrar nessa área da literatura, eu não quero escrever algo que vai receber críticas negativas, mas que vai vender muito".

Apesar de ter achado seu espaço na TV, os criadores do canal Manual do Mundo, o jornalista Iberê Thenório e sua mulher, a terapeuta ocupacional Mariana Fulfaro, também planejam lançar mais um livro em 2016 e ainda investir em séries inéditas na própria plataforma de vídeos. "Não pensamos em sair do YouTube, não. Foi lá que começamos, lá é a nossa casa", diz Fulfaro.