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Queria apresentar algo no Sambódromo, diz criador do Fuerza Bruta

Eduardo Graça

Do UOL, em Nova York (EUA)

07/04/2015 05h01

O grupo foi criado em um país vizinho ao nosso, mas o argentino Diqui James, diretor do Fuerza Bruta, nunca ouvira falar do disco "xará" de Jorge Ben, "Força Bruta", de 1970. “Mas como é que nunca ninguém me apresentou a este disco?”, se espanta, os olhos bem abertos, ao ser apresentado ao álbum. “E a faixa final também se chama 'Força Bruta!' Que lindo!”

Na verdade, James explica, o nome de seu grupo, sucessor do De La Guarda, tem a ver com a expressão que ele repetia quando formulou a estética dos novos espetáculos. “Depois da experiência com o De La Guarda, eu queria fazer algo ainda mais próximo da estética de espetáculos de rua, ao mesmo tempo sensorial, grandioso, mas com atuações minimalistas. Quando comecei a pensar em um nome para o grupo, alguns amigos pontuaram que eu repetia sempre esta expressão, força bruta, nas mais diversas situações. Eu juro que pensava que isso se dizia nas ruas de Buenos Aires o tempo todo. Eles me garantiram que não, a gíria era algo muito meu. Como ela representava exatamente o que queria transportar para os palcos, nos tornamos o Força Bruta”, conta.

Brasil e Carnaval

O Fuerza Bruta traz ao Brasil seu mais recente espetáculo, "Wayra", para uma temporada de dois meses a partir desta quinta (9). A montagem que chega ao Brasil é quase igual à que o UOL viu em Nova York, na Union Square. O Teatro Daryl Roth, residência norte-americana da trupe de James, vive de casa cheia desde 2007, com o nascimento de “Fuerzabruta”, o primeiro espetáculo do grupo, cujas apresentações brasileiras se deram no festival Porto Alegre em Cena, em 2012.

Dique James - Divulgação - Divulgação
Dique James, criador do grupo argentino Fuerza Bruta
Imagem: Divulgação

“Wayra” nasceu no ano passado e também se alimenta da interação com o público. É possível dançar com os atores-acrobatas e se molhar, em quantidades hídricas que vão do pingo ao encharque, à escolha do espectador, embaixo de uma piscina gigantesca instalada no teto do teatro. “É tudo o que a gente deseja”, diz James.

O espetáculo nova-iorquino passa voando em pouco mais de uma hora. No Brasil, uma das cenas foi alongada e acrescentou-se outra passagem inédita nos EUA, apresentada apenas em Buenos Aires. É o grupo de atores argentinos que irá para as apresentações brasileiras.

“Meu sonho é o de fechar uma parceria do Fuerza Bruta com alguma escola de samba do Rio de Janeiro. Queria voltar no Carnaval e apresentar algo no Sambódromo. Meu desejo é que nosso novo trabalho seja um espetáculo de rua de fato, sem as quatro paredes de um teatro convencional”, diz James, que já trouxe o grupo ao Lollapalooza 2015.

Críticas

Enquanto se guarda para o Carnaval, o diretor acha graça de uma das primeiras linhas da hoje notória crítica –ao menos nos círculos culturais de Nova York– do “New York Times” sobre “Fuerzabruta”: “mais um exemplo de um espetáculo de teatro para quem não gosta de teatro”. A rabugice do principal diário americano foi bisada na avaliação de “Wayra": “uma variação mais gritada, um remix do espetáculo anterior” e “uma experiência não indicada para claustrofóbicos ou controladores obsessivos”.

“Não tenho como não achar que as críticas, que eu li atentamente, não sejam boas. Elas refletem opiniões de quem está acostumado a resenhar espetáculos mais convencionais. Por conta de nossa estrutura, não há como eu separar aquela cadeira especial para o jornalista observar o espetáculo com atenção. É uma outra viagem”, diz James.

É mesmo. “Wayra” é a palavra usada pelos índios quéchua para definir tanto uma festança das boas quanto a força –vá lá, bruta– do vento. Os dois aspectos estão presentes de forma intensa no espetáculo.

A música, ao vivo, mais uma vez a cargo do argentino Gaby Kerpel, passa longe do tango eletrônico que se tornou, nas últimas décadas, o produto-exportação musical número um da Argentina. Os músicos se debruçam sobre ritmos e batidas típicos do noroeste argentino.

Wayra

  • David Levene

    Pouco antes da apresentação começar, a produção pede que o público siga rigorosamente as orientações de direção. Há que se movimentar no imenso galpão de acordo com a chegada dos palcos móveis sem atrapalhar o ritmo do espetáculo. Mas a interação se dá no nível decidido por cada um: muitos tocam os atores quando a bolha gigante de "Globa" desce até quase se chocar com as cabeças do público. Outros, ao fim, dançam enquanto mangueiras instaladas no alto palco refrescam os cocorutos e encharcam as roupas. Mas tudo é livre, nada é obrigatório. A quantidade de selfies e as luzes dos celulares se tornam parte intrínseca do show. Show, aliás, é termo perfeito para a aventura cênica cerzida por Diqui James.

    "Wayra", espetáculo do grupo Fuerza Bruta que chega a São Paulo nesta quinta (9)

No palco, no entanto, sucedem-se cenas do que parecem ser uma neurose aguda, como a do homem de terno e gravata enfrentando, no centro do teatro, em meio aos espectadores, enormes muros que são jogados em sua direção --já presente, de forma mais reduzida, em “Fuerzabruta”. Logo todo o elenco se junta ao engravatado. Os muros e objetos de uma casa vão sendo paulatinamente quebrados e uma família de espectadores murmura que se trata de uma clara alegoria sobre a violência das grandes cidades, especialmente as da América Latina.

“É engraçado você me falar deste momento especificamente, pois ele me faz pensar no trabalho de escolha do elenco e em como 'Wayra' é, no fim das contas, muito argentino. A do muro foi uma das cenas mais complicadas de explicar para o elenco norte-americano. 'Como assim eles reagem de forma tão estoica a isso tudo? Mas isso não é violência?' E eu tive de dizer que nós, na Argentina, quando estamos muito felizes, quebramos tudo. Bota para quebrar! A ação vem de uma reação de euforia. É interessante isso, porque meus atores precisam ser tanto fortes e ágeis quanto capazes de se expressar de uma forma exata e minimalista. Não há sons, concentrados na música, e sim gestos. E não quero que você saia do espetáculo pensando em quantos litros de água usamos para fazer a piscina no teto, e sim que se foque no aspecto mais humano de 'Wayra', em acompanhar, em estabelecer uma conexão com estes atores", afirma James.

"O grandioso oferece o suspiro de assombro, mas depois, idealmente, ele deve desaparecer. Quero fazer no futuro coisas cada vez maiores, com um som ainda mais alto, mas focado nos detalhes. Este é o nosso paradoxo criativo: queremos que o público deseje ser o ator, que corra na máquina do vento. É o oposto da magia do circo, com virtuosos fazendo algo que você jamais poderá repetir. Não recomendo tentar criar ‘Wayra’ em casa, mas aqui o foco é em outro sentimento, mais íntimo, mais direto, entre público e elenco”, conta o diretor.

O longo monólogo de Diqui James ajuda a estabelecer diferenças criativas entre o Fuerza Bruta e espetáculos circenses como os do Cirque de Soleil. O diretor lembra ainda que fará testes em São Paulo e que aposta em um espetáculo ainda mais interativo no Brasil.

“O menos interativo, em nossa turnê mundial, foi o do Japão. As pessoas de fato se impressionavam, como crianças, com cada surpresa. Mas eram essencialmente observadores. Na China, o senso de estranhamento foi o mais intenso, era algo muito diferente de tudo o que eles haviam visto no palco, o oposto dos japoneses, que consomem tudo. E no Brasil, se Porto Alegre nos deu uma pista, vai ser uma grande festa, uma enorme comunhão. No Brasil, se você propõe uma ação física, a resposta é imediata, as pessoas querem se envolver. O que faz com que tenhamos de trabalhar mais para impressionar o público, mas o nosso prazer é, também, mais intenso. Força bruta!”, diz, sorrindo, o diretor argentino, imbuído da tarefa de comprar no iTunes e ouvir todo "Força Bruta" de Ben Jor.

Serviço
"Wayra – Fuerza Bruta"
Quando: Temporada de 9 de abril a 31 de maio; de quinta a domingo. Sessões quintas e sextas às 21h; sábados às 20h e às 23h; domingos às 20h.
Onde: Ginásio Mauro Pinheiro (parte do Complexo do Ginásio do Ibirapuera). Av. Abílio Soares, 1300 – Paraíso.
Quanto: De R$ 80 a R$ 180.
Quinta-feira: R$ 160 (inteira) e R$ 80 (meia)
Sexta-feira, Sábado e Domingo: R$ 180 (inteira) e R$ 90 (meia)
Pontos de venda:
- Pela Internet: www.ticketsforfun.com.br (entrega em domicílio - taxas de conveniência e de entrega)
- Nas bilheterias oficiais:
Ginásio Mauro Pinheiro (parte do Complexo do Ginásio do Ibirapuera). Av. Abílio Soares, 1300 – Paraíso. Diariamente, das 10h às 18h
A partir 09/04
Segunda a quarta, das 10h às 18h; quinta e sexta, das 12h às 20h; sábado, das 12 às 20h; domingo, das 12h às 20h
Capacidade: 1.000 lugares
Classificação: Livre acompanhado dos pais ou responsáveis legais. A partir de 12 anos desacompanhado
Estacionamento: Estacionamento do Ginásio do Ibirapuera (entrada pela Av. Marechal Estênio Albuquerque Lima, 82)