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Sebastião Salgado vê fotografia extinta em 30 anos: Celular é "outra coisa"

O fotógrafo Sebastião Salgado - Divulgação/Diego Bresani
O fotógrafo Sebastião Salgado Imagem: Divulgação/Diego Bresani

Carlos A. Moreno

Da EFE, no Rio

28/10/2016 17h41

Um dos fotógrafos mais premiados e reconhecidos do mundo, Sebastião Salgado acredita que a fotografia está em processo de extinção e que a arte da qual ele é um dos maiores expoentes tem mais, no máximo, 30 anos de vida por conta, entre outros aspectos, de fenômenos como o aplicativo Instagram. Para ele, a fotografia será substituída futuramente pela "imagem", uma linguagem que não se interessa em ter qualidade, arte ou memória.

"A fotografia está acabando porque o que você vê no Instagram ou no telefone celular não é fotografia. Fotografia é um objeto materializado que você imprime, guarda e olha", definiu Salgado em uma conversa com um pequeno grupo de jornalistas nesta quinta-feira (27) à noite, quando recebeu o prêmio personalidade França-Brasil, em reconhecimento por promover a cultura brasileira no exterior.

"A fotografia é o que os seus pais fizeram quando você era criança: revelaram um filme que fizeram de você na esquina; fizeram um álbum e guardaram essas fotos. A fotografia é algo intrínseco, que você toca. Hoje, o que existe é imagem. A imagem não é fotografia. Mudamos o conceito dela. Passamos para outra coisa. E estamos em processo de eliminação da fotografia. Não acredito que a fotografia vá viver mais do que 20 ou 30 anos. Vamos passar para outra coisa. Fotografia era uma memória, uma referência. Hoje, a imagem é uma linguagem. Instagram é outra coisa. O que eu faço não é isso. O que eu faço é fotografia. Isso é imagem, o que é outro conceito".

Em sua opinião, as fotos publicadas no aplicativo são geralmente feitas com telefones e, apesar de às vezes parecerem interessantes, para isto é necessário ter uma boa câmera, uma lente adaptada, saber controlar a luz e não permitir que todo o processo de captura seja feito de forma automática.

"Não gosto de Instagram. Sei que os jovens gostam, mas eu não consigo. Tenho a impressão que estou tirando as calças e colocando as nádegas na janela, colocando toda a minha vida em algo que todo mundo vê", afirmou, ao ser perguntado pela Agência Efe sobre a qualidade das fotos postadas. "Não uso Instagram, não uso nada. Sei que tem coisas sobre mim, mas não sou eu que faço. Não sei nem ligar o computador. Essa é a verdade. Já tenho 72 anos e isso na minha geração é muito complicado", acrescentou.

O mestre do preto e branco contou para o documentário que seu filho Juliano Ribeiro Salgado e o cineasta Wim Wenders fizeram sobre sua vida ("O Sal da Terra", de 2015) foi usada a mesma câmera que ele trabalha. Ele admitiu que usa câmaras digitais modernas, mas que nunca trabalhou com programas de edição, como Photoshop por dois motivos: não sabe editar em computador e prefere trabalhar como antigamente.

"Sou muito feliz com o processo eletrônico porque as câmaras são muito modernas. Tenho uma qualidade que nunca tive. Você pode realmente trabalhar a imagem de uma forma fantástica", admitiu. Ele garantiu que a qualidade da imagem é muito melhor hoje e que a tecnologia facilita o trabalho de os fotógrafos para fazer muitas cópias e que era lento. "Me adaptei um pouco, assim como o dinossauro foi se adaptando antes de morrer, há 100 mil anos, antes de desaparecer. É isso o que estou fazendo", explicou.

Após a exposição mundial de seus trabalhos "Perfume de Sonho" (2015), sobre a produção de café em diversos países, e "Genesis" (2013), com imagens de formas de vida que permanecem preservadas no planeta, Salgado trabalha agora em um projeto que ele diz ser o seu maior sonho: as comunidades indígenas da Amazônia.

A caminhada começou há três anos e ele calcula que possa levar mais outros três. O objetivo é apresentar o trabalho em universidades e escolas de todo Brasil para que as novas gerações que vão chegar ao poder tenham outra autoestima de sobre a própria origem e aprendam a respeitar os índios.

"É algo muito rico, porque são comunidades de grande sofisticação, de grande beleza, de grande cultura, que têm uma música fabulosa, conhecimento da medicina... Algo riquíssimo que os brasileiros não conhecem. Venho trabalhando para ver se consigo mostrar isso com a fotografia, mas quero me aliar a um bom antropólogo para ter bons textos e boas informações. Esse é o trabalho no qual estou. Depois disso não sei", afirmou ele, negando a ideia de aposentadoria.