Alucinações fazem Yayoi Kusama se sentir como "Alice", acredita editora
Depois de ser traduzido visualmente por nomes como Salvador Dalí, Peter Blake e dezenas de outros ilustradores, um clássico da literatura infanto-juvenil ganhou ilustrações realizadas por uma artista que se descreve como "uma moderna Alice no País das Maravilhas".
Yayoi Kusama, 85, a artista plástica japonesa que se tornou febre com suas instalações com bolinhas coloridas (em cartaz em São Paulo com uma retrospectiva), é a responsável pelo visual exuberante de uma nova versão do livro de Lewis Carroll (1832-1898), lançada originalmente no Reino Unido em 2012 pela Penguin, e que chega ao Brasil agora, em edição da editora Globo.
"Acho que há um legado interessante de ilustradores de 'Alice no País das Maravilhas'", conta Alexis Kirschbaum, diretora editorial da Penguin Classics responsável pelo novo livro, em entrevista por telefone ao UOL. "Eu queria encontrar uma maneira de fazer com que uma versão ilustrada de 'Alice' fosse nova e revigorada e, na verdade, não-ocidental. Achei que Yayoi Kusama era perfeita, porque ela se descreve como uma Alice no País das Maravilhas, e sua arte é muito surreal. É como um País das Maravilhas", conta.
Sobre o sentido da frase "Eu, Kusama, sou uma moderna Alice no País das Maravilhas", que estampa a última página do livro, Kirschbaum especula que tenha a ver com o transtorno mental de que a artista sofre desde a infância, quando começou a ter alucinações visuais e sonoras.
"Acho que é como ela vê o mundo. O mundo para ela é como caminhar em meio a uma grande alucinação. Então, imagino que ela se sinta um pouco como a Alice no País das Maravilhas. Mas acho que também é um comentário mais amplo sobre ser artista e como um artista tem que repensar a realidade. E isso é uma espécie de projeto artístico", conclui a editora.
A relação de Kusama com a personagem de Carroll vem ao menos desde o fim dos anos 1960, quando ela realizava performances em marcos de Nova York, como a estátua de Alice no Central Park. Durante esses "happenings", ela pintava o corpo de atores com suas famosas bolinhas e, segundo consta, foi numa dessas ocasiões que se identificou como uma moderna Alice.
Mas, para Kirschbaum, as conexões entre Kusama e Carroll não se resumem a isso, e incluem os universos alucinógenos criados por ambos. "Acho que ambos estão interessados em criar mundos surreais, que envolvem toda a imaginação. E os dois estão interessados em escala --em grande escala e pequena escala. E estão interessados no ponto de vista da criança, de uma forma parecida", acredita.
Para chegar ao resultado final, a editora não teve acesso direto a Kusama, que desde 1977 vive voluntariamente em um hospital psiquiátrico e raramente faz aparições públicas ou concede entrevistas. "Eu lidei com ela através da sua equipe e de Louise Neri, da Gagosian Gallery, em Nova York. Mas tudo que fizemos, todo o processo, passou por ela", conta Kirschbaum.
Segundo ela, a encomenda das ilustrações incluiu apenas instruções muito gerais e flexíveis, sem sugerir o que deveria ser retratado. "Dei a ela diretrizes muito flexíveis do que eu achava que poderia funcionar em um livro para o mercado. Achei que poderia funcionar melhor se trabalhássemos com pinturas e ilustrações em vez de fotografias de instalações ou qualquer tipo de fotografia. Basicamente foram essas as instruções. E também sugeri que ela usasse motivos visuais que aparecem ao longo do livro, que dão uma ideia de todo, e que brincasse com o tamanho", diz.
Ainda assim, o resultado surpreendeu Kirschbaum, que se impressionou com o quanto o "era incrivelmente agradável". "Abri o livro e me pareceu incrivelmente encantador. Senti que era um projeto que tinha integridade e era muito alegre, lúdico e divertido. Era como se 'Alice no País das Maravilhas' e Yayoi Kusama tivessem sido feitos uma para a outra. Fiquei muito feliz".
Além das ilustrações de Kusama, a nova edição enfatiza os elementos visuais em um projeto gráfico que faz com que texto e figuras se entrelacem, e que as próprias frases, em escala ampliada ou reduzida, sirvam como ilustrações. "Havia algumas frases que queríamos enfatizar, então as deixamos maiores, porque achamos que era uma brincadeira visual. Queríamos enfatizar o humor das palavras e fazer disso algo que tanto as crianças quanto os adultos pudessem apreciar", explica a editora.
O resultado final é um livro que se confunde com uma obra de arte e que, na opinião de Kirschbaum, trouxe um público completamente novo para a obra.
AS AVENTURAS DE ALICE NO PAÍS DAS MARAVILHAS
Autor: Lewis Carroll
Ilustrações: Yayoi Kusama
Tradução: Vanessa Barbara
Editora: Globo Livros
Páginas: 184
Quanto: R$ 59,90
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