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Exposição de comida podre revela sabores da Ásia

Replica de carrocinha na exposição "Delícias Podres: a cultura da comida em conserva", na Tailândia (16/8/12) - Marina Wentzel / BBC Brasil
Replica de carrocinha na exposição "Delícias Podres: a cultura da comida em conserva", na Tailândia (16/8/12) Imagem: Marina Wentzel / BBC Brasil

Marina Wentzel

De Bangcoc para a BBC Brasil

16/08/2012 08h36

Uma exposição na Tailândia intitulada “Delícias Podres: a cultura da comida em conserva”, em tradução livre, revela o processo de tempero e fermentação de ingredientes populares nas receitas da Ásia.

Com estandes interativos que imitam um restaurante, uma cozinha e um mercado de rua, a exposição explora as técnicas de decomposição dos alimentos.

Molho de peixe, pasta de camarão e feijões rançosos são alguns itens indispensáveis em pratos tradicionais da mesa tailandesa.

O que muitos não sabem é que o sabor característico se deve a diferentes estados de degradação dos ingredientes.

O molho de peixe de melhor qualidade leva pelo menos um ano e meio de maturação para ficar no ponto, os feijões rançosos precisam curtir por pelo menos 3 dias, enquanto que a pasta de camarão adquire coloração mais escura e sabor mais intenso à medida em que é deixada para secar no sol por mais tempo.

“Hoje é uma arte sofisticada dominar essas nuances da fermentação, mas isso nasceu da necessidade de gente simples como os camponeses”, disse à BBC Brasil Tawesak Woraritrueanguarai, curador da exibição.

No passado as técnicas de preservação foram desenvolvidas através de tentativa e erro e serviam para armazenar comida no período entre as safras.

“Os tailandeses tiveram muita dor de barriga até aprender o que podia ou não ser comido”, brincou Kob Tiptus, diretor do Siam Museum.

As misturas de temperos, sal, açúcar e calor foram sendo aperfeiçoadas até se alcançar as receitas corretas, que são ao mesmo tempo saborosas e não fazem mal à saúde.

Bactéria boa
Um exemplo de aperfeiçoamento é o acréscimo de açúcar à conserva. Bactérias produtoras de ácido láctico são consideradas “boas” ao corpo humano.

Elas consomem carboidratos, por isso a dica é condimentar com açúcar a conserva, para que elas se multipliquem e acabem com outros micro-organismos nocivos aos humanos.

“Depois do advento da geladeira, nós poderíamos ter deixado de lado o hábito de comer comida podre. Observamos, no entanto, que esses ingredientes seguem populares. Por quê?”, questiona Tiptus.

A resposta está na autenticidade dos sabores fortemente enraizados na cultura local.

O ‘Kapi’, por exemplo, é uma pasta de mini-camarão seco moído e fermentado amplamente presente na culinária tailandesa.

“Ele serve de base para todos os tipos de curry feitos no país. Seja vermelho, verde ou amarelo. Todos sabores dependem do ‘Kapi’ e todo mundo come ‘Kapi’ todos os dias”, explicou Woraritrueanguarai.

Conta a lenda que a corte do Rei Rama 5 se encantou pelo sabor de “Pla-Ra”, o peixe em conserva de odor forte consumido no nordeste da Tailândia.

No entanto, era considerado inapropriado à elite comer o mesmo tipo de alimento simplório que os súditos.

O “Pla-Ra” foi então cozido e ao peixe foi adicionado leite de coco, capim cidreira, cebolinhas, gengibre e pimenta chili transformando a conserva mau cheirosa em “aromática”.

A receita foi batizada de “Roong Fa Thanya”, ou algo como “manjar dos Deuses”. Ainda hoje popular, o “Pla-Ra” segue fazendo sucesso em todas as classes sociais.

“Eu não penso muito se a comida é podre ou não. Se eu gosto do sabor é isso que interessa” conclui a universitária Weeranud, cuja receita favorita é salada de mamão papaia verde “Som Tam”, uma iguaria preparada com toques de peixe em conserva e vendida em carrocinhas nas calçadas de Bangcoc.