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05/08/2010 - 15h26

Em debate sobre Maquiavel na Flip, FHC diz que há políticos que não querem deixar o poder

MAURICIO STYCER
Crítico do UOL
Em Paraty (RJ)
  • Leandro Moraes / UOL

    Salman Rushdie (ao fundo) e FHC durante encontro na Flip (05/08/2010)

O tema era Maquiavel (1469-1527) e seu “Príncipe”, que acaba de ganhar nova e caprichada edição, mas sobrou para os políticos contemporâneos, entre os quais o presidente Lula, no debate entre Fernando Henrique Cardoso e Salman Rushdie, no início da tarde desta quinta-feira (5), na Festa Literária Internacional de Paraty.

Com uma menção direta a Lula e algumas alusões e ironias a políticos latino-americanos, FHC divertiu a platéia, convidada da editora Companhia das Letras para celebrar o lançamento de sua parceria com a editora Penguin.

“O objetivo do príncipe é manter o poder por tempo indeterminado. Isso não pode mais. Hoje tem eleições”, disse FHC, rindo. “Mas tem gente que quer ficar”, completou.

Em outro momento, comentando uma passagem do livro de Maquiavel, escrito em 1513, o ex-presidente observou: “Não há contradição entre ser tirano e ser amado, entre ser um dirigente duro e ser amado. Na América Latina há vários”.

FHC disse que mesmo nas democracias mantém-se uma tradição relatada por Maquiavel – a do príncipe, ao assumir o poder, eliminar todos os colaboradores mais próximos do seu antecessor.

Rushdie lembrou, então, de uma tradição republicana, nos Estados Unidos, segundo a qual os ex-presidentes não se manifestam sobre o governo de seus sucessores. Ao que FHC se apressou em dizer, rindo: “Eu sou um ex-presidente que não fala”. Mas logo acrescentou: “O Lula também acha que ex-presidente não deve falar. Estou esperando...”, disse, sugerindo que o presidente não vai se conter depois que deixar o poder.

Rushdie defendeu Maquiavel da fama injusta de ser considerado, ele próprio, “maquiavélico”. “Ele estava apenas preocupado em saber se era possível ser poderoso e ser bom. Acho que não é”, disse. “Ele apenas observou o mundo dos príncipes e escreveu um manual para tiranos. Sua principal recomendação ao príncipe, de que se tiver que matar alguém, mate no primeiro dia, o deixou com fama de cínico. Mas ele foi apenas um observador e o seu tratado tem profunda ironia”.

Provocado, FHC disse que não poderia se comparar a Maquiavel. “Eu fui um príncipe; ele, não”. O ex-presidente falou de algumas agruras do poder. “Nunca disse, por exemplo, ‘esqueçam o que escrevi’, mas isso é repetido até hoje por pessoas que nunca leram nada meu. É a vida política”, afirmou.

Ao que Rushdie, condenado à morte pelo regime iraniano em 1989 por conta do seu livro “Versos Satânicos”, observou: “Também tenho uma pequena experiência de problemas por causa do que escrevi”.

FHC voltou a falar da política brasileira ao observar que “as novelas, com freqüência, são mais realistas do que as notícias, no Brasil”. E reclamou que os historiadores o julgam pelas intenções que teve quando foi presidente. “Quem sabe das intenções do homem político? É preciso pedir ajuda a um padre ou um psicanalista”, ironizou. “A vida política é assim: você pensa uma coisa e é levado a agir de outra forma”.

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