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Para o arquiteto Ai Weiwei, ativista cego vai inspirar chineses a "viverem sem medo"

Cena do documentário "Ai Weiwei: Never Sorry" - Divulgação
Cena do documentário "Ai Weiwei: Never Sorry" Imagem: Divulgação

Sui-Lee Wee

29/05/2012 19h43

PEQUIM, China - O arquiteto e artista plástico Ai Weiwei, mais famoso dissidente da China, disse que a dramática fuga do ativista cego Chen Guangcheng irá inspirar outros chineses a trilharem o caminho rumo à democracia, sem viverem com medo. Chen passou 19 meses sob prisão domiciliar ilegal, até se refugiar no mês passado na embaixada dos EUA, em Pequim. O caso criou um incidente diplomático entre os dois países, até que Chen fosse autorizado a emigrar para Nova York com sua família.

"Por meio dos seus esforços, do seu espírito forte e do seu jeito incisivo, ele fez com que outros chineses não tenham desculpas para ainda viverem com medo, porque a situação deles nunca será pior do que a dele", disse Ai na terça (29), nos mais detalhados comentários até agora sobre o caso de Chen.

  • Embaixada americana

    O ativista chinês Chen Guangcheng (esquerda) sai de Pequim acompanhado pelo embaixador dos Estados Unidos na China, Gary Locke

 

"As coisas mais injustas que poderiam ter acontecido numa sociedade recaíram sobre um homem cego", disse Ai. "Isso é algo que ninguém pode aceitar ou explicar com qualquer desculpa. Todo mundo vai perguntar: 'Realmente temos de existir numa sociedade assim?'."

Ai, um homem barbudo e robusto, de 55 anos, falou na sua casa na zona oeste de Pequim, que tem os arredores constantemente monitorados por 15 câmeras de vigilância.

O artista atualmente está processando o governo por discordar de uma multa de 15 milhões de yuans (2,4 milhões de dólares) por evasão fiscal, imposta à empresa que comercializa suas obras. Em abril de 2011, Ai foi detido sem acusação formal e mantido em confinamento solitário até receber a liberdade condicional, em junho.

Desde então, ele ignora os esforços das autoridades para silenciá-lo, e se tornou uma referência para dissidentes e ativistas da China.

Ai não conhece Chen pessoalmente, e se disse "extremamente surpreso" por receber um telefonema dele no sábado. "Eu gosto muito de você", lhe disse Chen. "Eu sempre gostei de você também", respondeu Ai.

Na conversa, Ai disse a Chen que espera que ele possa "viver pacificamente, estudar com afinco e que sua família possa se recuperar fisicamente". Chen disse que ainda está se acostumando à vida em Nova York, onde em breve deve começar a estudar Direito.

Por causa dos rígidos controles sobre os meios de comunicação, inclusive a internet, poucos chineses já ouviram falar de Chen. Ai disse que esses controles seguem "métodos exatamente iguais aos usados durante a Revolução Cultural 40 anos atrás".

Para o ativista, a fuga de Chen mostra que a "manutenção da estabilidade" priorizada pelo regime comunista está fadada ao fracasso. "Essa forma simples de repressão, de usar o método de não deixar ninguém falar, nunca terá sucesso", disse Ai, que precisa relatar seus deslocamentos diários às autoridades. "Quanto mais eles tentarem manter, mais instável se torna."

Questionado sobre uma eventual ida para o exílio, Ai, que morou 12 anos em Nova York estudando arte, ficou quase um minuto em silêncio antes de responder. "Nunca vou deixar a China, a não ser que seja forçado. Porque a China é minha. Não vou abandonar algo que me pertence nas mãos de pessoas em quem não confio."