ESTREIA-Ozon faz retrato intimista de personagens em "O Refúgio"
SÃO PAULO (Reuters) - O francês François Ozon é um diretor que foge de rótulos. Suas escolhas de filme não seguem uma linha - ao menos não uma linha óbvia. Ele transita de um musical povoado por megeras ("8 Mulheres"), para um drama intimista sobre o fim de um casamento ("5x2"), e é capaz de ir ao kitsch ("Angel"), depois de um suspense quase Hitchcockiano ("Swiming Pool").
Ainda assim, há em todos esses uma marca, a sutileza em fugir da obviedade e o olhar perspicaz, especialmente com personagens femininos. Seu mais recente trabalho, a comédia "Potiche", acaba de estrear no Festival de Veneza.
Em "O Refúgio", que estreia em São Paulo e Rio de Janeiro na sexta-feira, o cineasta, que assina o roteiro com Mathieu Hippeau, faz um estudo de dois personagens que inicialmente são quase diametralmente opostos, mas, aos poucos, encontram a intersecção que os une.
Eles são Mousse (Isabelle Carré, de "Medos Privados em Lugares Públicos") e Paul (o estreante Louis-Ronan Choisy). São duas pessoas que por pouco não se conhecem, embora suas vidas estejam conectadas por um ponto em comum: Louis (Melvil Poupaud, que protagonizou outro filme de Ozon, "O Tempo que Resta").
Louis e Mousse moram num apartamento em Paris e são viciados em heroína. Ele morre de overdose acidental e ela acorda dias depois numa cama de hospital, onde recebe a notícia e também fica sabendo que está grávida. A mãe de Louis (Claire Vernet) trata o assunto da maneira mais direta possível: irá ajudar a moça a fazer um aborto, pois a família não deseja um descendente do rapaz.
Na cena seguinte, Mousse está numa casa de campo emprestada e com a gravidez bastante adiantada. Ela recebe a visita de Paul, irmão de Louis. Eles não são amigos, na verdade mal se conhecem, e custa para que algum vínculo afetivo se forme entre os dois. Como ela mesma diz ao rapaz: ele está invadindo o seu espaço. Mas, aos poucos, essa invasão toma outros contornos.
Às vezes, o filme de Ozon parece superficial e seus personagens rasos e planos, mas isso é apenas uma leitura apressada. "O Refúgio" ganha densidade por aquilo que representa, mais do que pelo que mostra ou diz. Porque Mousse não interrompeu a gravidez? O que se passou no intervalo entre o funeral de Louis e a chegada à casa de praia onde ela está agora? Isso não sabemos, mas talvez pouco importe, pois o filme está interessado é no presente dos personagens. As lacunas não precisam ser preenchidas.
O relacionamento entre Mousse e Paul é o que impulsiona o interesse pelo filme - além do questionamento sobre o futuro do bebê que está para nascer. A protagonista está se tratando com metadona para abandonar o vício, mas parece não ter planos ou perspectivas para o futuro.
Como em seus melhores trabalhos, em "O Refúgio" Ozon faz um filme intimista que segue de perto o amadurecimento de poucos personagens. O diretor pode estar transitando apenas em sua zona de conforto, mas isso não diminui a eficiência da direção ou o interesse pelo filme.
(Por Alysson Oliveira, do Cineweb)
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