'Hard': Como é fazer uma série sobre uma produtora pornô com atores pornôs

Camgirls, lives pornôs, atores de filmes adultos... Este texto bem poderia ser sobre o boom de canais e sites pornográficos na quarentena imposta pela pandemia de covid-19. Mas na verdade estamos falando de uma série que se passa justamente nesse universo: "Hard", comédia brasileira da HBO que estreia hoje, às 23h.

(É uma daquelas coincidências que parecem só existir na ficção, né?)

Em seis episódios de meia hora, "Hard" acompanha Sofia (Natália Lage), dona de casa que vive uma vida de comercial de margarina até seu marido falecer, deixando-a sozinha com dois filhos pequenos e uma herança nada comum: uma produtora pornô, que ele escondeu dela durante todo o relacionamento.

Em choque, ela tem que se adaptar à nova vida e lidar com seus próprios preconceitos em relação ao pornô —um processo pelo qual a atriz Natália Lage também passou.

A Sofia veio também me mostrar o quanto de preconceito existia dentro de mim

"Ela me ajudou a entender melhor esse universo; a não julgar, mas sim acolher, entender, gostar e até achar divertido, porque no final das contas a pornografia é um pouco sobre diversão", completa, em conversa com o UOL.

Foi uma experiência semelhante a de Martha Nowill, que na série vive Lucia, uma amiga mais "mente aberta" de Sofia. "Já tinha até eventualmente consumido uma coisa ou outra na vida, mas sempre como uma coisa mais baixa, menor. E comecei a enxergar esse universo com um olhar muito mais humano".

São pessoas que estão ali, são famílias, são mães, são pais, são irmãos, pessoas que pagam contas

Atores pornôs de verdade no estúdio de mentirinha

O diretor geral Rodrigo Meirelles ainda fez questão de recrutar atores que realmente atuam em filmes adultos para o elenco. "A gente foi entrando nesse universo, trocando com os próprios atores pornôs profissionais, e a nossa locação era um estúdio, como se a gente estivesse praticamente dentro de um estúdio de filmes pornôs. Foi muito prazeroso e muito revelador", conta Natália.

O curioso é que os atores pornôs também passaram por uma preparação para a série, com Fernanda Rocha —mas ela foi um pouco diferente. "A gente teve que prepará-los para fazer as cenas em que eles não fazem", lembra Rodrigo.

Teve um que me disse: 'já fiz muita coisa na minha vida, agora simular sexo vai ser a primeira vez'

Nudez sem vergonha

Acabou que todos os atores ficaram bem à vontade, mesmo com a nudez que se espera de uma série no mundo do pornô, como conta Fernando Alves Pinto, que dá vida a Pierre, um dos funcionários da produtora:

De repente, no final de alguns dias, estava todo mundo pelado em cena, mas parecia um monte de criança brincando

"Era uma coisa tão respeitosa e tão bonita que possibilitou criarmos uma coisa leve, mexer em lugares que são poderosos", completa.

Claro que, para todos ficarem confortáveis, algumas medidas foram tomadas -a começar por uma conversa entre toda a equipe deixando bem claro que nenhum tipo de má-conduta seria permitida naquele ambiente, como explica Rodrigo: "A gente conversou e explicou que qualquer tipo de assédio ou piada de mau gosto não ia ser aceito naquele set".

Ajudou também que a equipe era composta por muitas mulheres, como a diretora Júlia Jordão, que já havia trabalhado com a HBO em "O Negócio", e também por outras alocadas em setores técnicos como elétrica e fotografia, onde a presença feminia costuma ser menor. "A gente criou um ambiente seguro e eu acho que isso reflete muito o resultado do trabalho", diz o diretor.

A Hora H

Para as cenas de sexo em si, ainda foram tomados cuidados adicionais que há tempos já costumam ser adotados no cinema e na TV, como uma equipe técnica reduzida e atenção redobrada aos detalhes de figurinos e tapa-sexos —o que transforma os bastidores de uma cena quente em algo nem um pouco sexy.

Para quem assiste, a cena tem um tchan, pode dar tesão, mas para quem faz geralmente é muito técnico e muito anti-erótico.
Martha Nowill

Mas, no fim, o trabalho compensou. "Quase sempre tem uma tensão no dia da cena de sexo, fica um clima um pouco tenso, mas a gente não tinha isso", diz Natália. "Ninguém se sentiu constrangido ou desrespeitado. Todo mundo encarou com muita naturalidade. Foi um ganho para o trabalho e para nós, pessoalmente".