Cineastas negros que poderiam dirigir série sobre Marielle Franco
O anúncio de que a Globoplay vai lançar duas séries baseadas na vida de Marielle Franco, ex-vereadora do PSOL assassinada em 14 de março de 2018 com o motorista Anderson Gomes, tem gerado uma onda de críticas. Quase dois anos depois, as investigações da polícia ainda não respondem quem ordenou o crime e qual foi o motivo. Além disso, ambos os projetos (um ficcional e outro documental) são conduzidos por pessoas brancas e a justificativa para a ausência de negros nos cargos de direção levanta ainda mais questionamentos.
A série de ficção foi criada por Antônia Pellegrino ("Sexo e as Negas", "Bruna Surfistinha" e "Tim Maia") e conta com direção de José Padilha ("Ônibus 174" e "Tropa de Elite"). Diversos profissionais negros do audiovisual brasileiro assinaram um manifesto em que questionam tanto a ausência de negros na direção quanto a escolha do cineasta. Procurada, a família de Marielle também solicitou representatividade no cargo de direção, mas esse desejo não foi atendido.
Uma pesquisa da Ancine, de 2016, apontou que 75,4% dos filmes são dirigidos por homens brancos. Eles também correspondem a 66% dos roteiristas. O levantamento mostra, ainda, que nenhuma mulher negra esteve na direção ou na equipe de roteiro entre todos os 95 filmes analisados naquele ano. Dados que também se repetem quando se trata de elenco: apenas 13,4% dos atores são negros ou pardos e em 42% dos filmes não há nenhum ator negro ou pardo - no país, mais de 50% da população se declara como parte de um desses dois grupos.
Em resposta às acusações, Antônia afirmou a Mauricio Stycer, colunista do UOL, não ter achado alguém com as características que procurava e ainda completou: "Se tivesse um Spike Lee, uma Ava DuVernay...", declaração que gerou mais manifestações contrárias à produção. Pouco depois, Antônia considerou a frase como infeliz em sua conta no Instagram, mas a internet já estava mobilizada em sugerir vários nomes de cineastas negros para que a roteirista pudesse —enfim— conhecê-los.
É o caso da Lista Preta, projeto que reflete sobre a participação do negro na cultura pop e que citou vários representantes com autoridade artística e social para falar sobre a vida de Marielle Franco. Abaixo você vê alguns dos nomes que poderiam comandar um projeto como esse:
Joel Zito Almeida de Araújo
Natural de Nanuque (MG), Joel Zito Almeida de Araújo é diretor, roteirista, escritor e pesquisador, tido como um dos responsáveis pela construção do chamado cinema negro no Brasil. Desde o seu primeiro curta, "Memórias de Classe" (1989), sobre negros no movimento operário paulista, temáticas referentes às desigualdades raciais estão presentes em sua carreira. Na TV, foi responsável pela direção do programa "Espelho", apresentado pelo ator Lázaro Ramos, no Canal Brasil, além de curador da EBC (Empresa Brasileira de Comunicação).
André Novais Oliveira
Diretor, produtor executivo, roteirista e sócio-fundador da Filmes de Plástico, produtora audiovisual de Contagem (MG), André Novais Oliveira dirigiu "Ela Volta na Quinta", "Pouco Mais de um Mês", "Fantasmas" e "Temporada". Este último foi sucesso de crítica e selecionado para o Festival de Locarno, na Suíça. Aqui no Brasil, a obra venceu as cinco indicações do 51ª edição do Festival de Brasília, incluindo o prêmio de melhor atriz para Grace Passô.
Viviane Ferreira
Nascida na periferia de Salvador, Viviane Ferreira é a segunda mulher negra brasileira a dirigir um longa-metragem, o filme "Um dia com Jerusa". A narrativa se mantém em torno do encontro entre duas gerações de mulheres negras, que, por meio do compartilhamento de memórias e vivências, encontram respostas para amenizar a solidão. Viviane também é sócia da Odun Formação e Produção e diretora artística do Encontro de Cinema Negro Zózimo Bulbul.
Sabrina Fidalgo
A carioca Sabrina Fidalgo é diretora, roteirista, atriz e produtora. Dirigiu curtas como "Cinema Mudo" e "Personal Vivator", o premiado média-metragem "Rainha" (2016) e o documentário "Cidades do Funk", além de videoclipes e passagens por produções para TV. Foi eleita em março de 2018 pela publicação norte-americana Bustle uma das 36 cineastas mulheres que estão abrindo caminhos em seus países, em oitavo lugar.
Yasmin Thayná
Nascida em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, Yasmin Thayná é roteirista e diretora, fundadora da Afroflix, plataforma online que disponibiliza produções audiovisuais com pelo menos uma área de atuação técnica/artística assinada por uma pessoa negra e é responsável pelo premiado curta "Kbela" (2015). O filme recebeu o prêmio de melhor curta-metragem da diáspora africana da Academia Africana de Cinema (AMAA Awards 2017) e está disponível no YouTube.
Glenda Nicácio
A mineira Glenda Nicácio estudou cinema na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia e fundou a produtora Rosza Filmes. Na região, ela integra o projeto Quadro a Quadro atuando na realização de oficinas cinematográficas e na atividade cineclubista em escolas públicas. Em 2017, dividiu com Ary Rosa a direção do longa "Café com Canela". O filme teve uma bem-sucedida trajetória em festivais e atualmente está disponível no serviço de streaming Amazon Prime Video. Também codirigiu o longa "Ilha".
Jeferson De
Jeferson De é diretor de filmes como "Bróder" (vencedor do prêmio de melhor filme no Festival de Gramado, de 2010), "O Amuleto" (2015) e "Correndo Atrás" (2018). Nascido em Taubaté, interior de São Paulo, tem amplo destaque no Brasil e no mercado internacional. Trabalhou como roteirista e diretor nos premiados curtas "Distraída para a morte" (2001), "Carolina" (2003) e "Narciso Rap" (2005), além de ter participado de projetos nos canais MTV e SBT, como as séries "Vinte poucos anos, "Tudo de Bom" e "Popstars". Na Rede Globo, em 2003, produziu os programas "Brasil Total" e "Central da Periferia". Na TV Cultura dirigiu 26 episódios da série vencedora do Emmy "Pedro e Bianca".
Adélia Sampaio
Adélia Sampaio foi a primeira mulher negra a dirigir um longa-metragem no Brasil, em 1984, com a produção "Amor Maldito". Natural de Belo Horizonte, está em atividade desde a década de 1960, quando trabalhou como telefonista na Difilm, distribuidora ligada ao Cinema Novo. Lá ela também organizava sessões em 16mm para cineclubistas. Em 2018, "Amor Maldito" foi exibido no Festival Internacional de Mulheres no Cinema e na Mostra Diretoras Negras no Cinema Brasileiro. Nesse mesmo ano, após 12 anos longe da direção, dirigiu "O Mundo de Dentro", que estreou no Festival Internacional de Curtas Metragens de SP.
Juliana Vicente
Juliana Vicente é diretora, produtora e fundadora da Preta Portê Filmes, produtora com foco em cinema de inclinação social. Dirigiu o curta "Cores e Botas", exibido em mais de 50 festivais pelo mundo, foi convidada a fazer parte do grupo do Berlinale Talents (2015), no Festival de Berlim, e foi, no mesmo ano, premiada com a coprodução "A Terra e a Sombra", no Festival de Cannes. Na TV, em 2017 lançou a série documental "Afronta!", em parceria com o Canal Futura e dirigiu a 13ª temporada da série "Espelho", de Lázaro Ramos, exibida no Canal Brasil.
Clementino Junior
O diretor e educador Clementino Junior tem no currículo uma série de produções audiovisuais com foco em questões da luta antirracista e pelos direitos humanos. Foi curador em mostras e festivais, vice-presidente da Associação Brasileira de Documentaristas e Curtametragistas (ABDN) e dirige o Cineclube Atlântico Negro, com programação voltada para filmes sobre a diáspora africana. Também inaugurou, em outubro de 2016, o CineGeasur, misto de Cineclube e Curso de Extensão Universitária com pauta em Cinema, Memória e Direitos Humanos. Tem na sua filmografia produções como "Sequestro de Bellini" (2003); "Sua Majestade", "O Delegado!" (2007); "Folia de Adão e Eva" (2009); "Jurema" (2014); e "Anamnese" (2016).
Luiz Antônio Pilar
Ator, produtor, diretor de cinema, teatro e TV, Luiz Antônio Pilar dirigiu várias produções para canais fechados e abertos, como Globo, TVE, Canal Futura e a extinta TV Manchete. Tem no currículo filmes como "Remoção" e "Em Quadros", o especial "Por Toda a Minha Vida: Claudinho" e a novela Sinhá Moça (2006). Também dirigiu peças de teatro, entre elas "Os Negros", "Ataulfo Alves, o Bom Crioulo" e "Lima Barreto ao Terceiro Dia". Além disso, fundou a Lapilar Produções Artísticas, com foco no trabalho afro-brasileiro.
E tem muito, muito mais...
Para conhecer o trabalho desses e de outros cineastas afro brasileiros basta acessar plataformas como a Associação dxs Profissionais do Audiovisual Negro (A.P.A.N) e a ficine.org que visam fomentar, valorizar e divulgar o exercício de profissionais negros do mercado audiovisual.
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