Trash 80's, festa que "ressuscitou" artistas e reinventou os anos 80, chega ao fim
Os anos 80 nunca mais foram os mesmos com a Trash 80's, principal festa retrô de São Paulo, que chega ao fim nesta sexta-feira (21). A "buaty", como é conhecida, agitou o centro da capital paulista desde 2002, "ressuscitou" artistas que estavam esquecidos e ajudou a transformar a "década perdida" em uma nostalgia cult.
A Trash teve sua despedida oficial em maio, com shows das Paquitas e de Rita Cadillac. Os DJs fundadores da festa, Tonyy e Eneas Neto, decidiram encerrar a festa, que mudou de nome para Buzz, encerrada em novembro. Os fãs nostálgicos se desesperaram e lotaram o grupo no Facebook pedindo uma última noite. E foram atendidos.
"Para mim, não faz mais sentido como fazia antes como dinâmica de noite. Só que existe um sentimento em relação à festa muito grande. Por mais que a gente queira se desligar, sempre está ligada a ela de alguma maneira. Quando decidi encerrar, percebi que a festa já não pertencia mais a mim", justifica Eneas Neto ao UOL.
A última festa, no Club Caravaggio (localizado no Anhangabaú, centro da capital) lembrará as primeiras, com muitos hits oitentistas como "Ilariê" (Xuxa), "Caça e Caçador" (Fábio Jr.) e "Fogo e Paixão" (Wando), três das músicas mais executadas durante esses 16 anos.
Trash "ressuscitou" artistas
Debochada e divertida, a Trash ajudou a alavancar a carreira de dezenas de cantores que tinham entrado nos anos 2000 no absoluto ostracismo. Gretchen e Rita Cadillac, por exemplo, migraram para o cinema pornô, mas depois da Trash cavaram espaço fixo na TV. Depois de se apresentar na festa retrô, Sidney Magal retornou à mídia e multiplicou seu cachê.
"A Trash foi uma das primeiras situações que me mostraram a volta dos anos 80 e o que eu poderia fazer justamente para ingressar e contar para a galera que a gente está aí na ativa. Agradeço muito à organização da Trash 80's, e as festas são sensacionais. Desejo muita sorte e muito sucesso a quem já fez tanto por nós e por todas as pessoas que nestas festas estiveram. Muita luz! Namastê", agradece o cantor e terapeuta holístico Luciano Nassyn, ex-integrante do grupo Trem da Alegria.
"A Trash 80's foi um movimento que trouxe à tona praticamente todos os artistas da década de 1980 para fazer shows em uma casa em que a frequência era da garotada que não curtia os anos 80 e agora curte. A Trash vai fazer muita falta. Espero que voltem rapidinho, que a saída não seja definitiva, pois foi muito legal para todos os artistas da década de 1980. O pessoal nos recebia de uma forma que parecia que estávamos de volta aos anos 80. Trash, muito obrigada! Fui uma das primeiras artistas a fazer show lá e também terminei a festa. Mas espero fazer de novo a volta da Trash", torce a ex-chacrete Rita Cadillac.
"As festas de que participei foram muito divertidas por poder reviver uma história, um momento, um grande sucesso e também encontrar amigos da época. A Trash é complexa de resumir porque fez história. Vi pelo Brasil inteiro outras festas com outros nomes que faziam a mesma coisa. Ela também influenciou o que faço hoje. Montei a Nigro Entretenimento há 15 anos e comecei com a galera dos anos 80, mas do rock. E hoje tem mais de 60 nomes da música. Contei essa história para mostrar a importância de uma festa como essa, que influencia, dita tendências, e foi isso que a Trash foi. Cantei na festa de dez anos e foi muito emocionante, vai ficar na minha memória", recorda Afonso Nigro, ex-Dominó.
Autoestima e "cura" da depressão: quem foi feliz na Trash
"Preconceito não entra aqui" foi o lema da Trash 80's, que tinha jeitão de balada LGBT mas recebia todos os públicos. Os frequentadores pulavam e dançavam hits oitentistas sem distinção de gênero, cor, orientação sexual e identidade de gênero. A diversidade podia ser vista desde a fila para entrar. Na porta da "buaty", os hostess tinham a missão de animar o público fora da festa. Evandro Santo foi um deles e trabalhou na Trash com Rafinha Bastos.
"Eu tinha ouvido falar de uma festa que tocava só anos 80. Fui e amei. Na segunda vez, tive a cara de pau de pedir ao DJ Tonyy, para me apresentar com meu grupo de drags garçonetes, Paetê no Patê. Ele topou e perguntou se eu gostaria de ser hostess às sextas. Abri mão de outros trabalhos para isso. Sabia que não ganharia muito, mas seria bom para mim. Foi um tiro muito certo. Eu era um desconhecido das pessoas que frequentavam muito lá. Acharam estranho, porque o outro hostess era o Alisson Gothz, mais visual, e eu era explosivo, brincalhão. Eu ficava na porta como Janeyde, a 'brega queen'. A Trash foi mais do que uma balada. Foi uma explosão cultural. Rafinha Bastos começou a trabalhar com a gente lá. Foi a primeira vez que saí na grande imprensa", relembra.
O ator Cristiano Carvalho ajudou a criar algumas das famosas "coreôs" dos hits da Trash 80's, que levam as composições ao pé da letra (como imitar um iô-iô quando Wando canta "meu iaiá, meu iôiô" em "Fogo e Paixão"): "Em 2003, a Trash fez um Carnaval no Teatro Oficina, onde eu trabalhava. Comecei a frequentar, depois fiz performances no palquinho com dois amigos, mas ainda não tinha as coreografias. Depois, foi criada a Trupe Trash e ganhamos destaque. Fui hostess a partir de 2005, sem saber o que fazer. Cada noite eu fazia uma personagem diferente a partir do tema da festa. Fiquei dez anos. Quando passo na frente, eu me emociono e lembro quantas noites passei em pé interagindo e brincando. É minha casa".
Formado em letras, Cristiano Pereira frequenta a festa desde 2004, e trabalhou os últimos seis anos organizando os temas de cada noite. Na Trash, ele superou a vergonha de dançar em público e participou do concurso "O gordinho mais leve do Brasil", do programa "Legendários", na Record: "A Trash mudou minha vida, porque antes eu era um cara totalmente tímido, que não interagia com as pessoas. Eu me sentia um estranho no ninho. E lá me mostrou que eu podia ser feliz sendo quem eu era. Eu podia dançar sem ninguém achar estranho, podia curtir aquelas músicas até então esquecidas. Na Trash, descobri que consigo ter a ideia de um evento e fazê-lo acontecer. Eu achava que seria professor e virei produtor de eventos e DJ".
A fotógrafa Adriana Spaca, uma das frequentadoras mais antigas e assíduas da Trash, conheceu o marido na "buaty". A festa, segundo ela, a salvou de uma depressão profunda: "Eu estava muito deprimida, porque um ex-namorado tentou me matar. Eu estava perdida de amigos, de referências, de alegria. Comecei a entrar em uma depressão muito grande. Um dia, me falaram que teria uma festa anos 80 no hotel Cambridge [primeiro endereço da Trash 80's]. Fui para espairecer e sair dessa deprê e fiquei lá. Conheci o Luciano Bianchi, meu atual marido, em um grupo da Trash no Yahoo!. Conversamos pessoalmente em 19 de outubro de 2002, e um ano depois nos casamos".
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