Absurdos de "Infiltrado na Klan", de Spike Lee, parecem ficção, mas história é real
Em tempos em que David Duke decide opinar sobre a atual situação política brasileira, um filme prestes a estrear por aqui traz um panorama das ideias de uma das faces mais reveladoras da Ku Klux Klan nos Estados Unidos. O ex-líder do grupo racista e antissemita está retratado em "Infiltrado na Klan", novo projeto de Spike Lee. David Duke aparece na liderança da KKK na pele do ator Topher Grace, o Venom de "Homem-Aranha 3" (2007).
Premiado pelo júri do Festival de Cannes em maio, "Infiltrado na Klan" só chega aos cinemas brasileiros no dia 22 de novembro. Mas, para quem está em São Paulo, há duas chances de ver antecipadamente o novo filme do premiado diretor, conhecido por abrir as portas de Hollywood para questões raciais e sociais.
A obra de Spike Lee é um dos destaques da Mostra Internacional de Cinema de SP e ainda será exibida nos dias 26 (18h40 - Cinesala - Rua Fradique Coutinho, 361, Pinheiros) e 29 de outubro (14h - Espaço Itaú de Cinema Augusta - sala 1 - Rua Augusta, 1475, Cerqueira César).
Baseado em fatos reais, o longa de 135 minutos conta a surreal, mas verídica história de um policial negro nos anos de 1970 que conseguiu a façanha de se infiltrar na Klu Klux Klan.
História real
John David Washington, filho de Denzel, é Ron Stallworth, primeiro policial negro a trabalhar na Polícia de Colorado Springs. Depois de ver o telefone da Ku Klux Klan divulgado abertamente em um jornal local, ele resolve ligar e se passar por um deles.
Nas conversas telefônicas, usa sua inteligência para criar laços com um dos líderes locais do grupo racista. E, com a ajuda de um colega policial branco treinado por ele, se infiltra na organização para investigá-la, se deparando com ódio infundado e planos de ataques terroristas.
Já dentro da KKK, o falso Ron Stallworth, que na verdade é o policial branco Flip Zimmerman (Adam Driver), começa a tomar lições também para a sua própria vida. Judeu "não praticante", o agente disfarçado corre risco de morte e é testado quase o tempo todo por um dos integrantes do grupo intolerante que desconfia de sua real identidade.
"Nunca havia pensado muito na questão de ser judeu, mas depois que entrei nessa, isso não sai da minha cabeça", ele admite em uma das cenas. Mais uma forma sutil (ou não) de Spike Lee tentar abrir os olhos de seus espectadores.
Risos e angústia
Classificado como comédia, o filme também se segura muito bem no gênero. O personagem principal sabe rir de si mesmo e os secundários --com destaque para um dos integrantes da KKK-- arrancam risos ao longo do enredo, nem que sejam de nervoso.
A descrença de um dos oficiais de polícia com a força do discurso preconceituoso e sem fundamentos de David Duke é um bom exemplo: "Com essas ideias, um cara desse jamais vai chegar ao poder". Risos.
Uma pitada de romance também é bem encaixada no roteiro, costurando o desfecho momentaneamente positivo, que logo vira um soco no estômago.
Apesar dos vários recados muito claros dados em diferentes formas, até mesmo a metalinguagem com referências diretas a "...E o Vento Levou" (1939) e "O Nascimento de Uma Nação" (1915), há um último suspiro na reta final do filme na democrática tentativa de garantir que todos entendam a mensagem.
Tome mais realidade
Spike Lee corta para 2017. Mais didático, impossível. O diretor se apoia em cenas reais de arquivo dos protestos em defesa da supremacia branca em Charlottesville e também de atos em defesa dos negros nos Estados Unidos, no movimento batizado de "Black Lives Matter" (vidas negras importam, em tradução livre).
O que se vê é o embate entre grupos e uma onda de violência generalizada nas ruas. Gente trocando golpes com bandeiras, pessoas sendo atropeladas e mortas, o ódio em seu estado mais bruto.
A estratégia foi vista por parte da crítica como uma das poucas falhas do filme. Mas faz todo o sentido em um momento em que é preciso, sim, ser bastante didático na tentativa de evitar ainda mais confrontos. Como sempre, parece que os Estados Unidos seguem trazendo tendências ao Brasil.
Acendem-se as luzes
Aplausos encerraram a sessão da noite do dia 22 de outubro no cinema do shopping Bourbon Pompeia, zona oeste de São Paulo. De repente, enquanto os créditos ainda rolavam na tela, alguém resolveu se manifestar do fundo da sala. "Ele não", disse uma voz, apoiada por gritos ressonantes. Um espectador respondeu lá da frente: "Bolsonaro", e saiu apressado.
O comentário que circulava na saída da sessão lotada da Mostra de SP era: uma pena que o filme só estreie no Brasil com um "atraso" de quase um mês depois do segundo turno das eleições.
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