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Paul e John sempre trataram Ringo com desprezo, diz biógrafo do baterista dos Beatles

Ringo Starr fez show em São Paulo em 2013 - Manuela Scarpa/Foto Rio News
Ringo Starr fez show em São Paulo em 2013
Imagem: Manuela Scarpa/Foto Rio News

Felipe Branco Cruz

Do UOL, em São Paulo

02/10/2018 04h00

Assim como Elvis, Marilyn, Cher, Kennedy ou Obama, Ringo faz parte de um seleto grupo de pessoas que não precisa de um segundo nome para ser reconhecido em qualquer lugar. Ringo é Ringo.

Mas, até agora, um dos bateristas mais famosos do mundo nunca havia ganhado uma extensa biografia que contasse a sua vida para além dos Beatles. Ringo foi beatle por apenas oito anos, mas este período definiu sua vida durante os últimos 50 anos.

Capa de "Ringo - A História do Baterista Mais Famoso do Mundo Antes e Depois dos Beatles" - Divulgação - Divulgação
Capa de "Ringo - A História do Baterista Mais Famoso do Mundo Antes e Depois dos Beatles"
Imagem: Divulgação

Evidentemente que Richard Starkey, hoje sir Ringo Starr, nunca seria tão famoso se não tivesse aceitado o convite de John, Paul e George para integrar, em Liverpool, o quarteto mais famoso da história do rock. Mas ele aceitou e isso mudou a sua vida.

Lançado em 2015 e escrito pelo jornalista americano Michael Seth Starr (que não tem qualquer parentesco com Ringo), a biografia não-autorizada "Ringo - A História do Baterista Mais Famoso do Mundo Antes e Depois dos Beatles" chega só agora às livrarias brasileiras com revelações sobre a infância de Richard, além de trazer detalhes sobre o caso que George Harrison teve com a mulher do baterista, Maureen Cox.

"Essa história me surpreendeu. Ela já havia sido mencionada em outras biografias dos Beatles, mas ninguém nunca havia descrito o fatídico jantar em que George admitiu a traição ao amigo", disse Starr ao UOL por telefone.

A ironia dessa história é que Harrison sempre foi o beatle mais próximo de Ringo. "O que percebi é que Paul e John sempre trataram Ringo com desprezo. Eles nunca o viam como um rival mas também não valorizaram o seu trabalho", afirmou o autor.

A obra traz ainda revelações inéditas da primeira infância de Ringo, que passou, entre idas e vindas, cinco anos em um hospital e quase morreu de tuberculose. No livro, o autor entrevista amigos de Ringo do hospital e até uma namoradinha da infância. Embora não possa afirmar com certeza como o interesse pela bateria surgiu, Starr acredita que foi dentro do hospital que Ringo descobriu o gosto pelo instrumento.

Paul McCartney e Ringo Starr na pré-estreia do filme "The Beatles Eight Days a Week: The Touring Years" - Ben Stansall/AFP - Ben Stansall/AFP
Paul McCartney e Ringo Starr na pré-estreia do filme "The Beatles Eight Days a Week: The Touring Years"
Imagem: Ben Stansall/AFP

UOL - Por que uma biografia sobre Ringo?

Michael Seth Starr - Porque ele é o baterista mais famoso do mundo. Todo mundo sabe quem é o Ringo, mas só o conhecem dentro dos Beatles. Meu livro cobre toda a sua vida, antes e depois dos Beatles. E ele fez muito. Ele está no Hall da Fama do Rock and Roll por seu trabalho solo. Ninguém nunca olhou para a sua vida e nesse sentido ele sempre foi ignorado. Poucas pessoas sabem, mas Ringo já era um excelente baterista, o melhor de Liverpool, antes de os Beatles acontecerem.

O que você perguntaria a Ringo se ele topasse falar com você para o livro?

Muito já foi escrito sobre o Ringo nos Beatles. Minhas perguntas seriam sobre a sua infância em Liverpool. A parte mais desconhecida da vida dele é nesse período. Queria saber mais sobre sua relação com a mãe, com o padrasto e com os amigos. Obviamente que eu tentei por meses conversar com ele e nunca recebi qualquer resposta. Seis meses antes de o livro ser lançado, Ringo postou um texto no Facebook dizendo que não autorizava o livro e para que seus amigos e fãs soubessem que a biografia não tinha nada a ver ele. Talvez Ringo tenha achado estranho eu ter o mesmo sobrenome artístico dele. Talvez ele tenha pensado que eu era um fã ou um stalker. Mas, na verdade, o nome do Ringo é Richard Starkey. Starr é o nome artístico que coincidentemente é o mesmo sobrenome meu.

Os Beatles chegam no aeroporto de Nova York no auge da Beatlemania - AP - AP
Os Beatles chegam no aeroporto de Nova York no auge da Beatlemania
Imagem: AP

Não conhecer o biografado pode ser uma bênção. Muitos famosos são na vida real bem diferentes, e às vezes para pior, da imagem que os fãs fazem deles.

Não acho que esse seja o caso do Ringo, mas concordo 100%. Muitos me perguntam se eu não me arrependo de não ter falado com ele. Já escrevi outros livros com biografados ainda vivos. Nesse momento, estou escrevendo a biografia do ator William Shatner, o Capitão Kirk de "Star Trek", e ele não quer colaborar. Acho bom, porque quando uma pessoa fala, ela só quer contar o lado bom e amenizar os defeitos. Quando ela não colabora, você é obrigado a procurar as histórias e acaba descobrindo coisas ainda mais interessantes.

Por que você acha que as pessoas criticam tanto o Ringo como baterista?

As pessoas criticam sua bateria, mas eu acho que seu estilo complementava os outros três beatles. Ele era perfeito. Mas as pessoas que criticam o Ringo, não criticam os méritos de George Harrison como guitarrista principal ou as capacidades de John Lennon na guitarra base. Sobre o baixo de Paul McCartney, acho que todos concordam, e eu também, que era perfeito, ele sempre foi um fenômeno.

Mas como criticar George Harrison, um cara que escreveu "While My Guitar Gently Weeps"?

Você tem razão. Mas o meu ponto é que as pessoas enxergam o Ringo criticamente e questionam as suas habilidades técnicas. Ringo nunca foi um grande compositor como os outros três. Você citou o Harrison que, além de "While My Guitar Gently Weeps", também escreveu "Here Comes The Sun" e "Something". Até o Ringo já admitiu que não era um bom compositor. Mesmo quando ele seguiu carreira solo, ele contou com a ajuda de Lennon e Harrison.

O que você descobriu sobre a infância de Ringo? 

Ringo teve uma relação incrível com a sua mãe, completamente diferente de John Lennon. Ringo era filho único e sua mãe trabalhava duro para não deixar faltar nada. Ringo também teve o suporte dos avós, que moravam na mesma rua e sempre apoiaram todas as decisões do neto. Como Ringo não tinha irmãos, ele enxergou em John, Paul e George os irmãos que nunca teve. Quando você está numa banda do tamanho dos Beatles, só seus colegas sabem exatamente o que passaram juntos.

Paul McCartney também não colaborou com a sua pesquisa?

Não, mas isso não me surpreendeu. Eu ficaria em choque se ele decidisse colaborar. Paul já falou tantas vezes para tantas pessoas sobre tantos assuntos, que não tive problema em saber o que ele pensava sobre determinado tema.

Ringo Starr recebe o título de Cavaleiro da Excelentíssima Ordem do Império Britânico - John Stillwell/AFP - John Stillwell/AFP
Ringo Starr recebe o título de Cavaleiro da Excelentíssima Ordem do Império Britânico
Imagem: John Stillwell/AFP

A grande revelação deste livro são os detalhes do caso entre Maureen Cox (primeira mulher de Ringo) com George Harrison. Como foi essa pesquisa?

Essa história me surpreendeu. Essa história já era conhecida, mas ninguém nunca tinha contado os detalhes sobre o que aconteceu lá dentro da casa dos dois. Ninguém nunca havia descrito o fatídico jantar em que George admitiu a traição ao amigo. Apesar da calma exterior, Ringo ficou horrorizado. George foi quem o recrutou para o grupo. Como ele podia ter feito isso?

Ringo também era conhecido por ser o pacificador do grupo. Você acha que foi ele quem segurou todos juntos na banda?

Paul McCartney e John Lennon sempre viveram em confronto. Já George Harrison guardava suas composições para ele mesmo. Quando as coisas ficavam realmente ruins, era o Ringo que eles procuravam como a voz da razão. Ele ajudava a colocar as coisas em perspectiva. Acho que o fato de ele não compor, não ameaçava os outros três.

Você conta que Ringo foi o único que viajou para Nova York para consolar Yoko Ono após a morte de John Lennon.

Sim. McCartney e Harrison ficaram em Londres. Ringo estava no Caribe e viajou imediatamente para Nova York. Foi um gesto nobre e gentil da parte dele. Acho que Ringo também tinha problemas com Yoko mas naquele momento ele deixou tudo de lado. Ringo sempre foi o amigão. Se ele tinha algum problema com Yoko, ele resolveu. Ringo tinha acabado de perder um "irmão". Acho que os outros dois beatles não foram visitar Yoko por vaidade. Mas Ringo não se importou com isso. Yoko precisava de suporte e ele estava lá.

Como você escolhe seus biografados?

Sou editor de televisão do jornal "New York Post" e no tempo livro escrevo biografias. Já escrevi sobre Peter Sellers, Redd Foxx, Raymond Burr, Bobby Darin e agora William Shatner. Em comum, todos parecem ser pessoas que só fizeram uma coisa importante na vida, mas eles fizeram mais e tiveram um impacto muito grande na vida de outras pessoas.

Serviço:

Livro: “Ringo - A História do Baterista Mais Famoso do Mundo Antes e Depois dos Beatles”
Preço: R$ 79,90 (480 págs.)
Autor: Michael Seth Starr
Editora: Planeta