Topo

Esqueça os reinos e os dragões, Emmy prova que Donald Glover é a bola da vez na TV

Donald Glover é o cara do momento da TV americana - Divulgação
Donald Glover é o cara do momento da TV americana Imagem: Divulgação

Tiago Dias

Do UOL, em São Paulo

12/07/2018 16h13

Esqueça os dragões e os reinos. É fato que “Game of Thrones” retornou ao Emmy com força, abocanhando espaço em 22 categorias por sua sétima temporada, mas apenas um artista conseguiu sozinho quatro indicações, e à esta altura seu nome já não é mais estranho: Donald Glover.

Como se não bastasse o barulho causado por “This is America”, vídeo provocador e cifrado, lançado sob o pseudônimo musical de Childish Gambino, Glover foi reconhecido no Emmy por seus múltiplos talentos na atuação, direção e roteiro de “Atlanta”, série de humor surreal e crítico que há duas temporadas é sensação nos Estados Unidos e que somou 16 indicações neste ano.

A performance do artista entre os indicados revela que o rapaz de 34 anos é atualmente o criador mais poderoso da TV americana.

Além de garantir mais uma indicação como melhor ator em série de comédia, categoria que ele levou no ano passado, Glover compete contra si mesmo na categoria de direção com os episódios “FUBU” (com sua direção) e no genial “Teddy Perkins”, episódio sombrio e bizarro que rendeu debates em fóruns e resenhas na imprensa especializada.

Em 40 minutos, o episódio é praticamente um curta-metragem em que Glover brilha mesmo sob uma assustadora e pesada máscara no rosto. Ele é o excêntrico Teddy Perkins do título, um homem negro que passou por longos processos de cirurgias e branqueamento da pele –lembra alguém?

Em outras frentes, ele concorre a melhor roteiro pelo episódio "Alligator Man", que abre a elogiada segunda temporada, e a melhor ator convidado em uma série de comédia, por sua aparição em “Saturday Night Live”.

Glover já havia feito história no ano passado ao se tornar o primeiro diretor negro a levar a honra para a casa, o que o impulsionou a ganhar papéis de destaque também no cinema. Este ano, ele foi o alívio cômico de “Han Solo: Uma História Star Wars” e no ano que vem dará voz e movimento a Simba, no aguardado live-action de “O Rei Leão”.

Além disso, ele trabalha ao lado do irmão Stephen (produtor e também criador de “Atlanta”) para a adaptação animada de “Deadpool” para TV. A julgar por "Atlanta", o humor cáustico do personagem está garantido na mão da dupla.

Donald Glover em cena do episódio "Teddy Perkins", no qual concorre também a direção - Guy D'Alema/FX - Guy D'Alema/FX
Donald Glover em cena do episódio "Teddy Perkins", no qual concorre também a direção
Imagem: Guy D'Alema/FX

Infância sem TV e música

Tão estranho e sedutor quanto suas criações é sua própria história. O americano nasceu em pleno berço dos Testemunhas de Jeová. Em casa, TV e aparelho de som eram proibidos por sua mãe entender que essas distrações nada mais eram do que a porta de entrada para o Satanás acabar com a família.

“Se você perguntasse a alguém [na época], eles diriam: 'Ah, sim, Donald é legal'. Mas eu me sentia sozinho”, contou Glover em entrevista ao Guardian, quando “Atlanta” ainda era apenas uma promessa na TV americana. “[Isso] transpareceu no meu trabalho. As pessoas se perguntam por que minhas peças, poemas, músicas ou tudo o que estava fazendo era tão triste."

Isso pode explicar um pouco o humor agridoce e surreal da própria série, exibida lá fora pela Fox e disponível no Brasil pela Netflix –sem previsão de estreia para a segunda temporada. Glover é Earnest Marks, um jovem pé-rapado esperto mas displicente, que vê na ascensão do primo Paper Boi (Brian Tyree Henry) na cena do rap em Atlanta, na Geórgia, como a grande chance para começar a angariar uma grana.

As piadas vêm de forma sutil e muitas vezes fantasiosa. No mundo de “Atlanta”, por exemplo, é completamente possível Justin Bieber ser negro e um carro invisível atropelar pessoas na porta da balada. Mas os problemas reais das ruas não apenas existem nesse universo como são mostrados de forma crua.

O mesmo tom absurdo está no disco “Awaken, My Love”, que Glover –ou melhor, Childish Gambino– diz ter feito para sentir novamente o medo e a atração sexual que grupos dos anos 1970 como Funkadelic e Paliament provocavam nele quando finalmente se livrou do ninho cristão.

Em paralelo ao destaque na TV, o disco lhe rendeu três indicações ao Grammy este ano. Encerrada a segunda temporada de "Atlanta" nos Estados Unidos, Glover acaba de soltar um EP, "Summer Pack" e cai na estrada para uma série de shows.