"Profissão artista": entenda a campanha que está movimentando o elenco da Globo
Nos últimos dias, diversas estrelas da TV Globo têm vindo a público para manifestar repúdio à ADPF (Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental) 293. Pleiteado pela Procuradoria Geral da República, com relatoria da ministra Carmem Lúcia em 2013, o dispositivo questiona a ”obrigatoriedade de diploma ou de certificado de capacitação para registro profissional no Ministério do Trabalho como condição para o exercício das profissões de artista e técnico em espetáculos de diversões”. A votação no Supremo Tribunal Federal está prevista para o próximo dia 26 de abril, junto à de outra ADPF, a 183, que debate a profissão de músico.
Caso a ação seja aprovada, atores e técnicos não precisarão mais obter o registro profissional (DRT) junto ao sindicato da categoria ou Ministério do Trabalho para desempenhar suas atividades, igualando artistas profissionais e amadores.
Para a PGR, que se arvora na prerrogativa dos direitos individuais, a Lei nº 6.533/1978 e o Decreto nº 82.385/1978 (que regulamentam as profissões) seriam “incompatíveis com a liberdade de expressão da atividade artística, com a liberdade profissional e com o pleno exercício dos direitos culturais, porque em uma democracia constitucional não cabe ao Estado policiar a arte, nem existe justificativa legítima que ampare a imposição de requisitos de capacitação para o desempenho da profissão relacionada à arte cênica.”
A proposta volta ao noticiário menos de um anos após a aprovação da reforma trabalhista no Senado, ascendendo o debate na área. Propagando a mensagem “Profissão Artista”, nomes como Aracy Balabanian, Francisco Cuoco, Paulo Betti, Marisa Orth, Regina Duarte, entre muitos outros, estão usando a a TV e a internet para sinalizar o entendimento da classe. Para ela, a ADPF é uma forma de esvaziando o sentido do Registro Profissional (DRT), desvalorizando a atividade artística. Benefícios garantidos por lei, como aposentadorias, auxílios-doença e maternidade, ficariam em xeque.
Mas o que mudaria na prática? E para o público?
Para o Sated-SP (Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Estado de São Paulo), que vem promovendo encontros e se articulando junto a lideranças em Brasília, a ação afeta a classe em todos os níveis, de atores a técnicos, do teatro à publicidade. Jovens em início de carreira, mais suscetíveis a cachês baixos e à precarização do trabalho, são os que mais padeceriam com a mudança. Para exemplificar a questão, o presidente do sindicato, Dorberto Carvalho, cita o caso de produtoras que usam o artifício de contratar “pessoas comuns” para driblar a legislação trabalhista.
Outro ponto destacado pelo Setad, que afeta diretamente o público: a qualidade do trabalho artístico poderia cair “brutalmente” no país. “Atualmente já existe do sucateamento da profissão de dublador. Nos últimos anos, com a chegada das plataformas de streaming, experimenta colocar no YouTube ou em outros lugares para perceber a qualidade da dublagem de alguns filmes colocados lá. Compare com a dublagem de um filme da Fox ou Disney, por exemplo”, diz ao UOL Carvalho, lembrando que, até o fim dos anos 1970, o registro de atores era outro, expedido pela Secretaria de Segurança Pública, o mesmo usado em atividades como a prostituição.
Ministério é aliado
O Ministério da Cultura já se posicionou ao lado dos atores, entendendo que a regulamentação é necessária à liberdade de expressão da classe. “Defendemos o reconhecimento legal das profissões de artista, técnico de espetáculo e músico, fundamental para a consolidação da economia criativa no Brasil. A exigência de registro para o exercício profissional de atividades artísticas é importante não só para garantir a qualidade da produção mas, principalmente, permitir que os profissionais da cultura tenham seus direitos garantidos”, afirmou o órgão em nota.
O ministro da Cultura, Sérgio Sá Leitão, diz ter confiança de que os ministros do STF se sensibilizarão à causa. "Penso que o exercício profissional da arte não se confunde com o direito garantido na Constituição que todos os cidadãos têm de se expressar artisticamente de modo livre. Uma coisa é o exercício da profissão de artista, outra coisa é a expressão artística, que é livre e obviamente está ao alcance de todos os cidadãos”, afirmou.
Valorização do DRT
Para o ator global Paulo Betti, é clara a intenção de desvalorizar a atividade, no que configuraria um “retrocesso”. “Há um movimento econômico muito grande relacionado a nossa profissão. Teatro, televisão, cinema, quantas atividades envolvem a classe artística e quando dinheiro ela faz girar? É um fator econômico forte e acho que nós seríamos enfraquecidos nas relações de trabalho se a gente não tiver uma profissão regulamentada.”
Dezenas de artistas já se reuniram no teatro o XP no Rio e na Funarte em São Paulo para protestar e discutir o tema e os próximos passos da mobilização. Caso não acha definição, eles prometem ir às ruas em protestos.
“Eu me lembro que viajei para a Europa, para estudar, e quando cheguei lá na polícia pediram profissão. Eu disse ator. Ele disse: ‘Isso não existe, então bota estudante’. Tive que botar no meu passaporte ‘estudante’, não era ator. Conseguimos o nosso DRT, e agora querem tirar”, entende Othon Bastos.
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