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Série mostra como rixa entre CIA e FBI deu espaço para o 11 de Setembro

A torre sul do World Trade Center é atingida por avião enquanto a torre norte exala fumaça negra durante ataque terrorista em 11 de Setembro - REUTERS/Sean Adair
A torre sul do World Trade Center é atingida por avião enquanto a torre norte exala fumaça negra durante ataque terrorista em 11 de Setembro
Imagem: REUTERS/Sean Adair

Bruno Ghetti

Colaboração para o UOL, em Berlim (Alemanha)

07/03/2018 04h00

Os ataques terroristas ao World Trade Center, em 11 de setembro 2001, poderiam ter sido evitados. Ao menos é essa a principal tese de “The Looming Tower”, série em dez episódios que estreia no Brasil na sexta-feira, no serviço de streaming Amazon Prime Video.

Inspirada no livro vencedor do Pulitzer “O Vulto das Torres: a Al-Qaeda e o Caminho até 11/09”, de Lawrence Wright (um dos produtores da atração), a série se debruça sobre bastidores de investigações da CIA e do FBI nos eventos que antecederam o 11 de Setembro.  “The Looming Tower” mostra o quanto uma pequena "rixa" entre as duas agências acabou se revelando contraproducente para prevenir atentados terroristas contra os EUA.

Nos anos 1990, enquanto os dois serviços de investigação não trocavam informações fundamentais e tentavam agir cada um à sua maneira, a Al-Qaeda avançava sorrateiramente com seus planos, levando horror a alvos americanos em uma série de ataques fora e dentro dos EUA. Já no primeiro episódio, vê-se o atentado a embaixadas norte-americanas na África, em 1998.

Em ritmo de thriller de espionagem, a série é estrelada por Jeff Daniels e Peter Sarsgaard, que respectivamente dão vida a agentes da alta cúpula do FBI e da CIA. Na apresentação mundial de “The LoomingTower”, no último Festival de Berlim (em fevereiro), Sarsgaard falou com exclusividade ao UOL

Peter - Divulgação - Divulgação
Peter Sarsgaard em cena de "The Looming Tower"
Imagem: Divulgação
“O problema não era só a rivalidade entre o FBI e a CIA. Ambos os serviços achavam que estavam fazendo a coisa certa. O problema é que o país estava distraído. O terrorismo ali dentro foi algo sobre o que não estávamos prontos a pensar, até acontecer”, diz Sarsgaard, sobre o contexto em que os EUA viviam pouco antes dos atentados de 2001. “Demora muito para que as pessoas despertem. E depois, claro, voltam a dormir.”

Na trama, Sarsgaard é Martin Schmidt, o arrogante chefe da divisão da CIA com foco específico nas ações do grupo fundamentalista Al-Qaeda. Em sua obsessão por aprisionar seu líder, Osamabin Laden, tem uma certeza quase messiânica de que não precisará do auxílio de ninguém, embora ordens superiores exigissem que ele colaborasse com o também cabeça-dura John O’Neill (Jeff Daniels), líder da unidade contraterrorista do FBI de Nova York.

Sarsgaard já havia personificado no ano passado outro funcionário da CIA, na série “Wormwood”, da Netflix, então já tinha alguma intimidade com o universo que voltaria a encontrar em “The LoomingTower”. Mas como a nova série se passa em um período mais recente e muitos dos métodos do serviço de inteligência mudaram com o tempo, precisou conhecer mais detalhes sobre a filosofia da agência em relação específica às investigações da Al-Qaeda.

“Uma das coisas que aprendi na minha preparação é que a CIA não pensava em Osama bin Laden da forma como eu pensava nele, ou seja, como um demônio. Ela o encarava como uma pessoa. Como um sujeito que veio de um determinado contexto, que tinha uma história de vida, que acreditava em certas coisas... Era apenas pensando dessa maneira, em Bin Laden enquanto um indivíduo, que eles poderiam chegar a prever seus próximos passos”, conta o ator.

Novas ameaças

A série se dedica sobretudo a apresentar o pano de fundo que levaria ao 11 de Setembro. “Não houve empenho para uma maior colaboração [entre FBI e CIA]. Ok: eles poderiam até ter trabalhado melhor em conjunto e evitado aqueles ataques, mas o fato é que o país não estava focado, hipervigilante quanto a isso. E teve a tendência a se tornar mais isolado depois. E o isolamento nunca resolveu nenhum problema”, diz.

“Depois dos atentados, nós reagimos, lutamos em uma guerra louca no Iraque – que não tinha nada a ver com a história. O país se uniu, o patriotismo se revigorou. Mas agora estamos novamente nos desfazendo, nos dividindo, prestando atenção a coisas como com quem o presidente foi para a cama... A verdade é que a Al-Qaeda é maior hoje em dia do que antes do 11 de Setembro”, diz o ator, que acredita que os EUA estão longe de estar blindados da ameaça terrorista.

Não estamos protegidos! A maior parte dos atos de terror nos EUA são cometidos por americanos. Olha quem está entrando em uma igreja e abrindo fogo contra todos. Ou atirando da janela de um um hotel de Las Vegas. Isso vem acontecendo sem parar há anos, e no entanto, continuamos procurando a solução em outros lugares. Quando é evidente que deveríamos solucionar também o problema em nossa casa.

O ator é abertamente avesso ao governo de Donald Trump. “As vidas de americanos não são mais importantes do que as de refugiados: toda vida humana tem exatamente a mesma importância.”

Testemunha do atentado

Somente o último episódio de “The LoomingTower” se passa de fato no dia 11 de setembro de 2001. Indagado sobre suas memórias sobre a data, Sarsgaard relata que não apenas se encontrava em Nova York naquela manhã como também estava muito perto das Torres Gêmeas. Foi, aliás, uma das testemunhas de um dos ataques.

“Estava ali perto na hora, na Canal Street [a cerca de 1,5 km das torres]. Eu vi o momento em que a segunda torre foi atingida. Aquele dia foi inacreditável: ver tantas pessoas cobertas de detritos, as nuvens imensas de pó subindo, os corpos de pessoas... Não quis chegar mais perto”, relembra o ator.

Aquele trágico mês de setembro, no entanto, trouxe pelo menos uma lembrança bastante agradável para o ator. “O interessante foi que eu conheci e me apaixonei por minha mulher alguns dias depois, ainda naquele mês”, diz Sarsgaard, referindo-se à atriz MaggieGyllenhaal. Os dois estão juntos desde então e hoje têm duas filhas, de 11 e 5 anos. “Como em qualquer tragédia, foi uma época em que olhei para a minha existência de maneira diferente. E em que reacendeu em mim a vontade de viver”, diz, reforçando que a paixão por Maggie o ajudou nessa nova etapa de vida.