Topo

Abre caminho: Baco Exu do Blues veio da Bahia para furar o bloqueio do rap

Abram o caminho, deixe o Baco Exu do Blues passar - Matheus Aragão/Divulgação
Abram o caminho, deixe o Baco Exu do Blues passar Imagem: Matheus Aragão/Divulgação

Tiago Dias

Do UOL, em São Paulo

21/02/2018 13h55

Diogo Moncorvo olha para o ano passado e só consegue fazer uma breve avaliação: “Foi doido”. Conhecido pela alcunha Baco Exu do Blues, o rapper baiano desceu de Salvador e chegou ao Sudeste cercado de elogios e certo frenesi, abocanhando inclusive o título de disco do ano em muitas listas com “Esú”.

Seu primeiro disco, lançado em setembro passado, foi ovacionado pelos seguidores do rap e fez até quem não era familiarizado com o gênero se curvar diante da força de seus versos afiados sobre um personagem de origens divinas perdido no caos terreno.

Dada às devidas proporções, seu disco chegou com a força de um “Sobrevivendo no Inferno” e “Nada Como Um Dia Após Outro Dia”, obras seminais dos Racionais que levaram o rap a outro patamar lírico. Inclusive, conquistando um público muito além dos nichos.

Carregando o nome de um Deus romano (Baco, divindade do vinho), de um orixá (Exu, associado ao fogo do sexo) e de um ritmo norte-americano de origem negra (o blues), Diogo solta uma espécie de profecia do outro lado do telefone, durante conversa com o UOL: “O rap daqui a três ou quatro anos vai ser o estilo musical mais ouvido no Brasil, como é no mundo inteiro.”

“As músicas mais tocadas na periferia é sertanejo e funk, se ligou? O rap não conseguiu ocupar esse espaço. A gente tem que transformar isso primeiro para conseguir assim transformar o povo”, observa.

Baco Exu do Blues: Rapper jogou uma pedrada e ganhou ovação fora da Bahia - Divulgação - Divulgação
Baco Exu do Blues: Rapper jogou uma pedrada e ganhou ovação fora da Bahia
Imagem: Divulgação

Homem-bomba

“Não foi pedindo licença que eu cheguei aqui”. O verso da música “Abre Caminho” explica um pouco a trajetória do rapper, que fez seu movimento mais ruidoso há pouco mais de um ano, quando soltou uma bomba lá de Salvador em direção ao monopólio do eixo Rio-São Paulo.

“Sulicídio”, parceria com o MC pernambucano Diomedes Chinaski, é furiosa crítica contra a visão preconceituosa do sudeste com o hip-hop e a cultura do Nordeste. Sem poupar nomes. 

“Quantos rappers baianos você conhece além de mim?”, ele provoca. “A gente estava ali em um cenário que tinha vários artistas com uma base cultural muito forte. Os artistas daqui são geniais e são tipo 4, 5 vezes melhores do que os do Sudeste. A mensagem da música era ‘eu sou tão bom quanto vocês, porque a gente é desvalorizado’. As coisas não chegam pra gente.”

A controversa faixa gerou reações acaloradas, mas levantou debate. Hoje, é entendido como o ponto de virada da turma nordestina, embora tenha deixado Baco em papel duplo – era ao mesmo tempo apedrejado e alçado ao grande salvador da cena. “Mas o único Salvador que eu tenho é minha cidade”, ele rebate.

Entre cobranças e críticas, entrou em profunda depressão. Foi dessas dores que nasceu “Esú”, disco que expõe a fragilidade humana diante do divino e busca inspiração tanto no escritor baiano Jorge Amado quanto no poeta francês Arthur Rimbaud.

“O bagulho do disco é mostrar que a fragilidade é a força. Quando o ser humano expõe essa fragilidade, você aceita, você está pronto para vencer nesses quesitos. Quanto mais você nega, mais você esconde, mais ela vai tomando conta do seu corpo”, explica.

Nessa busca, a iluminação pode vir tanto do entorpecimento quanto no sexo, como ele canta em “Te Amo Disgraça”, definitivamente a canção de amor do ano. “Bebendo vinho e quebrando as ‘taça’, fudendo por toda a casa, se divido o maço, eu te amo, desgraça”, diz o refrão.

“Se você está bem com seu corpo a ponto de você compartilha-lo com outra pessoa, e está bem na psique, quer dizer que você está perto da iluminação”, filosofa.

Kanye West da Bahia

Com os beats modernos do produtor Nansy Silvvs, “Esú” foi abraçado de forma muito forte no mesmo Sudeste que ele atacou e onde agora ele faz shows cada vez maiores e mais procurados. No lançamento do disco em São Paulo, no final do ano passado, ele subiu ao palco com figurino assinado por Cemfreio, marca do estilista e agitador Victor Apolinário -- como Baco, um jovem negro, vindo da periferia. “Me senti o Kanye West”, comenta rindo. 

Com o gás que o disco deu, Baco entrou em 2018 com single novo, “Facção carinhosa”, e lança na quinta (22), a nova "Sinfonia do Adeus" -- que pode ser a música de amor deste ano.

Ele também está pronto para voltar ao universo de “Esú”. A segunda parte do disco deve chegar nos próximos meses nas plataformas digitais. Ele volta a São Paulo neste sábado (24), com show na choperia do Sesc Pompéia. Os ingressos estão esgotados.

Mas toda a aceitação não o faz querer mudar de planos. Ele quer sacudir a cena da Bahia continuando na Bahia. “A questão é que o próprio público de lá não prestava atenção no que acontecia na nossa cidade, só queria ver o que vinha de fora. Tenho que marcar posição daqui”, explica.

“Meu público de lá é periférico, é um público grande. A maioria negra, não é classe média, nem classe alta. Estou conseguindo estar nesse espaço, mas quero estar de forma maior. Quero que minha música seja cantada nas periferias como cantam Simone e Simaria e Wesley Safadão.”

SERVIÇO:

Baco Exu do Blues
Quando, Sábado, 27 de fevereiro, às 21h30
Onde: Sesc Pompeia, São Paulo
Ingressos esgotados