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Remake aclamado de clássico das HQs japonesas ganha edição em português

Capa da edição brasileira da HQ "Pluto", de Naoki Urasawa - Reprodução
Capa da edição brasileira da HQ "Pluto", de Naoki Urasawa Imagem: Reprodução

Ramon Vitral

Colaboração para o UOL

27/12/2017 04h00

O mundo está em luto. Um dos robôs mais poderosos do planeta, herói na 39ª Guerra da Ásia Central, o carismático Mont Blanc foi encontrado despedaçado em sua área de atuação, como guarda-florestal, nos Alpes Suíços. Não demora muito e outro dos robôs mais fortes já construídos pela humanidade também desaparece, dessa vez sem deixar vestígios. Então a Federação Européia designa o investigador e androide Gesicht para investigar os crimes de um suposto serial killer dos mais avançados robôs de alto desempenho do mundo, criados por meio da combinação das mais sofisticadas tecnologias e que poderiam ser utilizados como armas de destruição em massa.

A história em quadrinhos "Pluto" teve o primeiro de seus oito volumes bimestrais recém-publicados no Brasil pela primeira vez. A HQ tem ares de séries como "True Detective" e "Mindhunter" e de filmes inspirados nos livros do escritor de ficção científica Philip K. Dick, como "Blade Runner" e "Minority Report". Tudo isso com os tradicionais traços estilizados característicos dos mangás, HQs produzidas no Japão. E se a trama da obra lhe soa familiar, é por ela ser inspirada em "O Maior Robô da Terra", arco de histórias do clássico "Astro Boy", obra-prima do maior autor de quadrinhos japoneses de todos os tempos, o mangaká Osamu Tezuka (1928-1989), e publicada originalmente entre 1952 e 1968.

"Pluto" foi lançada no Japão entre 2003 e 2009 e venceu em 2011 o Prêmio Intergeracional, dedicado a publicações para todas as idades, do tradicional Festival Internacional de Quadrinhos de Angoulême, na França. Além de ter recebido várias premiações em seu país natal, trata-se de uma das HQs japonesas modernas mais celebradas no Ocidente nas últimas décadas. "A obra não faz para o trabalho de Tezuka o que a versão de Jimi Hendrix para a canção 'All Along the Watchtower' fez para a música do Bob Dylan, mas é quase isso", compararam os críticos da revista "Rolling Stone" em uma lista de 2014 dedicada às 50 melhores graphic novels não protagonizadas por super-heróis.

Diálogo com dias atuais

A origem do projeto é narrada na introdução da edição brasileira da HQ por Takayuki Matsutani, presidente da Tezuka Productions Co. Ltd. --a imensa corporação hoje responsável por administrar o legado e o licenciamento de qualquer conteúdo relacionado às obras de Osamu Tezuka. Segundo o empresário, ele foi procurado pelos editores e agentes de Naoki Urasawa, talvez o principal nome dos mangás japoneses das últimas décadas e quase um rockstar no Japão, com a proposta de criar um mangá baseado no arco de histórias de "Astro Boy" centrado no assassino serial de robôs.

A história em quadrinhos "Pluto" - Divulgação - Divulgação
A história em quadrinhos "Pluto"
Imagem: Divulgação
"Em 'Pluto', sou eu recontando a primeira história que li na vida, quando tinha quatro anos. Foi a minha forma de fazer um tributo a Tezuka por meio daquele trabalho", contou Urasawa em raríssima entrevista, datada de 2005 e publicada no site especializado em cultura pop japonesa Japanator. Recluso e pouco afeito à fama conquistada por seus mangás, Urasawa virou objeto de culto de fãs de HQs por publicações como "20th Century Boys" e "Monster", ambas publicadas no Brasil e com vários volumes a mais do que as breves oito edições de "Pluto".

Com o contrato assinado para produzir a coleção e aval de Makoto Tezka, filho de Tezuka, os editores de Urasawa estipularam a data de publicação do primeiro capítulo do quadrinho para 2003, ano no qual o herói de "Astro Boy" é criado no mangá original. A publicação atualizou para o contexto da época a trama do gibi da década de 50.

O diálogo mais explícito com os dias atuais era uma referência explícita à Guerra do Iraque, iniciada por George W. Bush em março de 2003, seis meses antes do lançamento do quadrinho, a partir da alegação que o país de Saddam Hussein teria armas de destruição em massa. No mangá, alguns dos robôs alvo do serial killer são sobreviventes de um confronto no qual um país chamado Estados Unidos de Thracia invadiu a Pérsia após falsas alegações de que a nação do Oriente Médio estaria construindo robôs de destruição em massa.

Ainda assim, alguns dos aspectos mais celebrados do mangá estão centrados exatamente no aprofundamento de temas tratados em "Astro Boy". No único volume lançado no Brasil até o momento são abordadas questões primordiais do trabalho de Osamu Tezuka, como a relação entre as máquinas e a humanidade, a capacidade de inteligências artificiais sentirem e expressarem emoções e o verdadeiro sentido do que é ser humano.