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Polícia apreende quadro em museu após acusação de apologia à pedofilia

Polícia apreende quadro sob acusação de apologia à pedofilia - Daniel Novaes/Divulgação
Polícia apreende quadro sob acusação de apologia à pedofilia Imagem: Daniel Novaes/Divulgação

Lucas Borges Teixeira

Colaboração para o UOL

15/09/2017 14h23

Uma exposição no Museu de Arte Contemporânea de Campo Grande (Marco) tornou-se alvo de uma nova polêmica sobre liberdade de expressão e arte no Brasil. Três deputados fizeram um boletim de ocorrência para aumentar a classificação indicativa da mostra Cadafalso. Uma das obras acabou apreendida pela polícia por suposta apologia à pedofilia.

Na última quinta-feira (14), o deputado estadual do Mato Grosso do Sul Paulo Siufi (PMDB) recebeu imagens da Cadafalso, da artista plástica mineira Alessandra Cunha, exposta no Marco desde 19 de junho. Com pinturas fortes, a obra tem como proposta denunciar a violência contra a mulher.

O que chamou a atenção do deputado, no entanto, foi a idade mínima recomendada ao público da exposição: 12 anos. "Ao verificar as imagens, entendi que eram obscenas, pornográficas e invasivas para crianças desta idade", argumenta Siufi em entrevista ao UOL. "Como pediatra, vejo que é agressivo."

O parlamentar decidiu ir à tribuna da Assembleia Legislativa do Estado do Mato Grosso do Sul para protestar contra a classificação. "Foi quando me deram a ideia de fazer um boletim de ocorrência", conta o peemedebista. Junto aos colegas Coronel David (PSC) e Herculano Borges (SD), ele foi à Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (Depca) prestar queixa.

Depois de ouvir os depoimentos, o delegado Fábio Sampaio decidiu não só aumentar a idade indicativa da mostra como recolher a obra "Pedofilia" e chamar a diretora do museu, Lúcia Montserrat, para prestar depoimento. "Mostrei as imagens e ele falou que aquilo era crime", diz o deputado Siufi.

De acordo com o deputado, Sampaio considerou que a obra fazia apologia à pedofilia, por isso determinou a retirada. "Pedofilia" retrata uma menina chorando cercada por dois homens com o pênis ereto.

Classificação  - Daniel Novaes/Divulgação - Daniel Novaes/Divulgação
Classificação indicativa, que era de 12 anos, subiu para 18
Imagem: Daniel Novaes/Divulgação

Tanto a diretora do Marco quanto a artista, que já voltou para Uberlândia, veem a ação como censura. "Ou ele leu a mostra errado ou quis se promover, aproveitar a onda da 'Queermuseu'", afirma Cunha ao UOL, em referência à mostra cancelada em Porto Alegre. "As obras são para provocar mesmo, denunciar o machismo e a violência contra a mulher."

"A ideia pode ser boa, com tantos casos de pedofilia por aí. Mas não entendo como isso seria interessante para uma criança ou adolescente", afirmou o deputado. "Se você olhar para as artes, todas trazem gestos obscenos, daqueles os pais não gostam, pênis para todo lado... Não vejo como reflexão."

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Classificação indicativa, que era de 12 anos, subiu para 18
Imagem: Daniel Novaes/Divulgação

Em entrevista ao UOL, Montserrat afirma que o museu tomou as precauções necessárias para receber o público. "Montamos uma sala, colocamos contact escuro na porta para que não houvesse penetração do olhar e indicamos a idade", argumenta. "Nossas arte-educadoras se prepararam para receber os alunos, orientar pais e professores que ali têm certos questionamentos. Vai quem achar pertinente."

A diretora deve prestar depoimento na delegacia na tarde desta sexta-feira (15). Cunha diz que esperará o resultado da audiência para tomar as atitudes legais para recuperar sua obra.

Segundo Siufi, ele não tinha como objetivo recolher a obra ou fechar a mostra, que está programada para acabar neste domingo (17). "Eu só queria que subisse para 18 anos. Porque um adulto faz o que ele quiser. Quem gosta vai", afirma o deputado. "Se o delegado diz que é crime, é com ele. Eu sou a favor de qualquer tipo de arte desde que respeite a Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente."

A diretora defendeu: "O trabalho é primoroso, uma denúncia fantástica. Levei minhas duas netas para ver". Ela diz que, agora, pretende usar a polêmica em benefício do museu. "As pessoas quase não vêm. Estou tentando reverter isso em nosso favor, para estimular a curiosidade das pessoas." A artista também diz não se abalar e que seguirá com seu trabalho. "Quero levar a mostra para onde quiserem expor."

O UOL tentou falar com o delegado responsável pelo caso, mas não conseguiu contato até o momento.