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Donos de sebos revelam objetos raros encontrados dentro de livros antigos

Felipe Branco Cruz

Do UOL, em São Paulo

14/06/2017 04h00

"É como abrir uma caixa preta de um avião", compara o livreiro Jonas Taucci, 58, quando manuseia algum dos mais de 300 mil livros antigos estocados no Sebo do Messias, no Centro de São Paulo.

Apaixonado por livros, há 15 anos ele pediu demissão de uma multinacional para trabalhar no lugar, onde afirma não existir prazer maior do que encontrar cartinhas, fotografias, cartões postais, dinheiro velho, origami e outras “surpresas” esquecidas por seus antigos donos dentro dos exemplares.

“Cada objeto encontrado é a prova de que uma vida foi vivida”, filosofa. “Aqui está o convite de um casamento dos anos 1960. Esse casamento realmente existiu porque o convite está na minha mão e eu consigo imaginar como ele foi”, suspira enquanto olha para o papel. “Olha esta fotografia de um baile de 15 anos. Essa menina realmente existiu e sua história não foi esquecida porque está aqui, dentro deste livro”, completa.

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Alguns os objetos mais curiosos encontrados nos livros do Sebo do Messias podem ser vistos na galeria de fotos acima e a maioria deles foi encontrada por Jonas. Ele conhece tão bem o acervo da livraria, que sempre é requisitado pelo dono para mostrar os objetos mais raros aos visitantes. 

Jonas Taucci, funcionário do Sebo do Messias, vive cercado por livros Imagem: Fernando Moraes/UOL

Leilão do Messias

Quando o assunto são os objetos encontrados nas coleções, o brilho nos olhos de seu Messias, 76, é o mesmo de Jonas. Há 46 anos à frente do sebo que leva o seu nome, ele reúne em várias caixas milhares de cartões postais que encontra dentro das obras. Alguns, ele guarda. Outros, ele revende. “Muita gente se interessa por esses objetos”, afirma. “Meu objetivo é lançar em breve um novo site, só para leiloar coisas raras que encontramos”, adianta.

Fotografias são os objetos mais comuns encontrados dentro dos livros Imagem: Fernando Moraes/UOL
E quando seu Messias fala de raridades, ele está falando sério. Como, por exemplo, uma cédula de 1000 coroas austríacas de 1902, um par de ingressos para o Teatro Municipal de São Paulo de 1916 (apenas cinco anos depois de sua inauguração), uma carta de amor de 1901 e uma fotografia autografada da atriz  Maria Della Costa. Todas elas encontradas dentro de livros antigos. "É gostoso receber essas coisas raras", resume.

Porém, mais do que objetos valiosos, o prazer de Messias está em encontrar cartas antigas, como uma em que o noivo reclama para a noiva do calor de Presidente Prudente. Ou ainda uma declaração de um rapaz que apostou na vitória para deputado do filho de Getúlio Vargas, Lutero Vargas, mas perdeu para Carlos Lacerda.

Seu Messias guarda, inclusive, cartas com mais de 100 anos, com conversas absolutamente banais, porém bastante reveladoras dos costumes da época. Em uma delas, uma mulher conta para a irmã detalhes minuciosos da roupa que o filho usou na igreja: "Ele foi vestido de menino do côro, com um camisola toda de cetim cor-de-rosa, com duas rendas prateadas embaixo e toda a frente da camisola salpicada com estrelinhas, também prateadas". 

Dez mandamentos do livro

Outro tradicional sebo de São Paulo, o Avalovara, em Pinheiros, também possui uma respeitável coleção de raridades. Há, inclusive, um painel com os objetos mais “preciosos”. O sebo é atualmente comandado por Sandro Giuliano, 32, e ele conta que em uma ocasião, uma cliente reconheceu no painel uma fotografia feita por ela. “Ela era fotógrafa e uma de suas imagens estavam perdidas dentro do livro”, lembra.

Cédulas de 1000 coroas austríacas de 1902 Imagem: Fernando Moraes/UOL
Embora goste de encontrar os objetos, muitos clientes não valorizam livros com muitas inscrições, dobrados ou amassados. “Como livreiro, eu não gosto de comprar livros com anotações porque a obra perde seu valor comercial. Mas ao ler esses escritos, é como se a gente entrasse no íntimo do seu antigo dono”, conta.

Sandro já encontrou convites de casamentos, centenas de fotografias, um exame de urina de 1938 e até uma edição de um jornal holandês de 19 de março de 1945, publicado um mês antes do suicídio de Hitler. Em suas páginas, foram noticiadas "amargas batalhas no leste ponte de Remagen" e a "conquista de Koenigswinter pelos americanos".

Mas o achado mais curioso é um manuscrito do início do século 20, com os 10 mandamentos do livro, que resumem bem o prazer que os frequentadores de sebo têm ao abrirem um exemplar antigo.

Um dos ensinamentos, talvez o mais importante, deveria ser seguido à risca por todas as pessoas: “Lembra-te de que não deves permanecer em teu poder mais tempo que o necessário, pois todos solicitam a minha companhia e meus conselhos”.

Manuscrito do início do século 20 com os "10 Mandamentos do Livro" Imagem: Fernando Moraes/UOL

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