Diário da Princesa surgiu porque meninas merecem mais que casar, diz autora
A americana Meg Cabot, 49, reinventou o hoje bilionário gênero de literatura para jovens adultos. Criadora de um certo “O Diário da Princesa” (2000), ela lança agora no Brasil dois livros: a continuação de seu clássico, “Diário de Uma Princesa Improvável”, e “Lembrança” (Editora Galera Record, 400 páginas), o sétimo tomo de “A Mediadora”.
O primeiro (Editora Galera Júnior, 208 páginas) revela a existência da meia-irmã da princesa Mia Thermopolis, Olivia, uma princesa negra, de 12 anos e com belos cabelos cacheados. O segundo, "Lembrança", traz a heroína Suzannah novamente mediando a relação de espíritos e ‘fantasmas’ com os vivos ao seu redor, mas, quinze anos depois do primeiro livro da série, ela aparece mais madura, casada – vá lá, com sua alma gêmea, nascida no século 19 – e às voltas com dramas emocionais de gente grande, como a obsessão amorosa de um ex-namorado de quem ela já não gosta mais e a possível destruição de sua antiga casa.
Considerada a ‘rainha da literatura teen’ nos Estados Unidos, com mais de 25 milhões de exemplares vendidos mundo afora, Cabot conversou com o UOL sobre sua paixão por temas e personagens de cunho feminista na literatura infantojuvenil. "Meninas, nós temos sim opções além de encontrar o homem ou mulher certos e formar nossas famílias", afirma.
Ela também anunciou o início da transformação em musical na Broadway de “O Diário da Princesa”, responsável no cinema pela explosão das carreiras de Anne Hathaway e Chris Pine, e contou que as negociações para um terceiro filme da franquia "estão em andamento, em passos lentos".
UOL - Você é apontada como a pioneira no gênero de literatura para jovens adultos. O que a fez escrever livros com trama e personagens voltados para leitores adolescentes?
Meg Cabot - Sabe por que eu comecei a escrever? Simplesmente não havia livros de jovens adultos para eu ler. Meu primeiro livro foi publicado na virada dos meus 30 anos, ainda era uma jovem adulta (risos). Os editores achavam, àquela época, que adolescentes queriam fazer outras coisas da vida, não ler. Havia uma ideia de que livros para jovens tinham de ser educativos, ou com conotação religiosa, mas sem diversão.
Algum título de outro autor para jovens adultos a tirou do sério a ponto de desejar que ele tivesse sido escrito quando a senhora era uma adolescente?
Harry Potter! Mas não vou me fazer de rogada, li como se fosse uma adolescente, do primeiro ao último livro. Também amo os livros da inglesa Louise Rennison (1951-2016), especialmente “Sonho de uma Meia-Calça de Verão”. E gosto muito dos livros da série “Crepúsculo”, de Stephenie Meyer. Achei interessantíssimo que as meninas, especialmente, tenham se identificado tanto com a história, contada do ponto de vista da protagonista (Bella).
Em seus livros os protagonistas também são quase sempre femininos. Há aí uma decisão de tratar do hoje tão falado empoderamento das mulheres?
Sim, este é um dos aspectos mais importantes. Cresci em um ambiente tradicional e religioso, em que não se esperava muito das mulheres além de casamento e criação de filhos. Meninas, nós temos sim opções além de encontrar o homem ou mulher certos e formar nossas famílias. Para muitas de nós, é crucial encontrar a vocação profissional e/ou um hobby que nos faça feliz, que nos complemente, e não há nenhuma vergonha nisso. Quando comecei a escrever não haviam livros para adolescentes com personagens femininas fortes. Minha heroína era a Princesa Leia, de “Star Wars”, par a par com os homens ao seu redor. Era o tipo de princesa que me interessava, menos focada em encontrar seu príncipe encantado e sim em mudar o universo.
Sua princesa Mia, como Leia, também chegou a Hollywood, nas duas adaptações para o cinema de “O Diário da Princesa”, ambas dirigidas por Garry Marshall (1934-2016)...
Sim, e o Gerry foi um sonho para mim, a Disney comprou os direitos do primeiro filme antes mesmo de meu livro ser publicado, só com o manuscrito terminado, e ele dirigiu com o maior carinho e cuidado. Claro, os filmes, especialmente o segundo, são bem diferentes dos livros, como tinha mesmo de ser, mas Garry manteve a tônica no empoderamento feminino, algo que me interessava muito.
Há planos para um terceiro filme?
Posso dizer, sem levar bronca, que as coisas estão em andamento para um terceiro filme, em passos lentos. Mas, em primeira mão, posso contar que demos o pontapé inicial para um sonho antigo meu: um musical da Broadway a partir do primeiro livro. A Anne (Hathaway) é uma atriz de palco, canta lindo, porém não creio que ela poderia fazer a Mia de novo, por conta da idade. Mas ela acaba de ter um filho e fico aqui pensando: já imaginou se ela pudesse fazer a avó, a rainha (papel de Julie Andrews nos dois filmes)? Mas isso sai da minha alçada. Fico em casa escrevendo meus livros e torcendo para dar tudo certo.
O que você está escrevendo no momento?
Estou agora justamente escrevendo um livro relacionado ao “Diário da Princesa”, mais uma história em torno da Olívia, que está no centro de “Diário de Uma Princesa Improvável” (continuação de "Diário da Princesa" focada na meia-irmã da personagem), mas não posso contar mais nada além disso.
É correto assumir que a realidade serve de inspiração para séries com temas fantásticos como “A Mediadora” ou “O Diário de Uma Princesa Improvável”? Olivia, afinal, é negra...
Sim, Olivia tem raízes multiétnicas e sofre com isso, quando, na minha opinião, deveria ser algo a ser celebrado. Ela nasceu de minhas inquietações com este tema, com o preconceito racial que sempre tivemos de enfrentar na minha família. Agora mesmo vivo uma situação particular com toda a tragédia em torno das relações étnicas aqui nos EUA, com a polícia sendo acusada de agir de forma violenta contra cidadãos afro-americanos, um caso após o outro. Um de meus irmãos é policial. E o outro, adotivo, é negro. As discussões se dão na mesa de jantar, estamos todos buscando soluções.
Lá se vão 15 anos desde o primeiro livro de “A Mediadora”. Você tem fãs que viraram adultos acompanhando a Suzannah. Como é a sua relação com eles?
Alguns hoje têm a idade da protagonista, me convidaram para seus casamentos, para conhecer seus filhos. Quando fui ao Brasil pela última vez, em outubro, aconteceu algo que me tocou muito: alguns fãs levaram livros autografados por mim quando eles eram ainda crianças, com fotos, eu parecendo muito mais jovem, claro (risos). E vários chegaram com histórias comoventes, como os livros os ajudaram a passar por situações como a separação dos pais. Uma menina me marcou muito, a melhor amiga dela havia morrido em Santa Maria, no incêndio da boate (Kiss), no sul do Brasil, e os livros a ajudaram a sair de um estado terrível de depressão. Jamais havia experimentado algo assim. Foi forte.
E você conseguiu aproveitar para conhecer mais o Brasil?
Sim, desta vez fui à Bahia. Não apenas Salvador, mas também Cachoeira, onde acontece a Flica (Festa Literária Internacional da Bahia). O que é a comida baiana, gente? É, aí sim, algo de outro mundo! Queria comer de novo acarajé e moqueca, mas aqui não encontro ninguém que faça. Fico só no sonho por enquanto, mas os meus, como sou sortuda, costumam se realizar (risos).
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