Livros inspirados no jogo "Minecraft" viram febre no Brasil
Um jogo feito de pixels gigantes –aqueles micro quadradinhos que compõem uma imagem na tela da TV ou do computador–, que causam um efeito visual bastante diferente dos games realistas mais modernos, sem um objetivo claro, apenas um universo aberto no qual o jogador pode construir de tudo e tem como única obrigação se manter vivo. Nele, quem tem o controle nas mãos é praticamente deus diante de um universo montável.
Apesar da proposta distinta –ou, quem sabe, justamente por isso–, “Minecraft”, o game em questão, é um sucesso tremendo. Lançado em 2011 e disponível para diversas plataformas, já vendeu mais de 23 milhões de unidades apenas para computadores e possui mais de 100 milhões de jogadores registrados em sua base de dados.
Outra prova do sucesso? Esta semana o jovem Pedro Afonso, 19, tornou-se o primeiro youtuber brasileiro com mais de 2 bilhões de visualizações nos vídeos de seu canal, o Rezendeevil, dedicado ao jogo. O garoto também lançou recentemente pela Suma das Letras seu primeiro livro, “Dois Mundos, Um Herói”, inspirado justamente no universo proposto por “Minecraft”. Publicações semelhantes, aliás, estão na moda no país.
Há alguns meses que títulos nessa linha sempre aparecem em listas dos mais vendidos. Na relação do Publishnews, quem desponta no momento, por exemplo, é o próprio “Dois Mundos e um Herói” –sexto colocado na lista geral– e “Diário de um Zumbi do Minecraft” –sexto lugar dentre as obras infantojuvenis e 20º dentre as publicações gerais–, publicado pela Sextante, que já lançou cinco dos nove títulos da série que coloca mortos-vivos no universo quadriculado do jogo.
Uma das primeiras a apostar no segmento foi a Galera, selo do Grupo Record, cuja trilogia “Uma Aventura Não Oficial de Minecraft”, de Mark Cheverton, já vendeu mais de 160 mil exemplares, e que prepara uma nova série de três livros nesse universo escrita pelo mesmo autor. Caminho semelhante seguiu a Rocco, que trouxe ao país as “Crônicas de Elementia”, que inicia uma trilogia assinada por Sean Fay Wolfe.
Quem também está chegando às livrarias é “Herobrine: A Lenda”, livro da dupla de youtubers Pac, 20, e Mike, 18, brasileiros cujo canal, TazerCraft, conta com mais de 5 milhões de seguidores. A obra foi concebida em parceria com o escritor Gustavo Magnani, outro jovem, este com 19 anos, recebeu ilustrações de Voxer e está sendo publicada pela Geração Editorial.
Ação e mais ação
Mas o que exatamente há nesses livros? Fernando Souza Filho é jornalista, editor da EGW, revista de videogame, e recentemente precisou se debruçar sobre títulos baseados em “Minecraft” para entender o que vinha sendo proposto por autores diversos e realizar a tradução de livros que seguem essa linha. O primeiro trabalho foi com “Minecraft: Galaxy Wars”, que mistura os universos do jogo com o de “Star Wars”, publicado pela Tambor. A mesma casa publicará também “Steve Potter” - flerte com o mundo de “Harry Potter”–, que já está sendo vertido por Souza Filho, e “The Mobbit”, com referências a “Senhor dos Anéis”, o próximo trabalho de tradução que o profissional encarará.
Segundo o tradutor, o elemento mais comum nessas obras é a ação protagonizada por criaturas fantásticas, como monstros e dragões. “Não há uma preocupação na construção detalhada dos protagonistas, pois os personagens já existem e suas características básicas já são conhecidas. Então, o foco acaba sendo mesmo a ação, os embates e os inimigos que são maus quase que gratuitamente. A coisa é meio maniqueísta mesmo: são sempre os mocinhos contra os vilões”, explica.
Para ele, isso também acrescenta uma profundidade ao jogo em si. “Ao ler um livro que aborde diversos aspectos das personalidades de personagens como Steve ou Herobrine, você passa a percebê-los sob uma ótica diferente”, acredita.
Quem tem opinião semelhante é Thaluana Meira, assistente editorial da Pandorga, que recentemente lançou títulos nessa linha, como “Em Busca da Espada de Diamante” e “A Misteriosa Marca do Griefer”, ambos de Winter Morgan. “Em um mundo de tantas possibilidades, essas obras definem um modelo e o desenvolve de acordo com as características dos personagens. Quando jogamos um RPG, nosso personagem reflete muito do que gostamos e achamos divertido (ser um vilão, um arqueiro, um herói, uma criatura incompreendida...) e isso abre um leque de possibilidades em um mundo sem limites. Por sua vez, a literatura consegue entreter o público do jogo e ajudar no desenvolvimento da leitura em todas as idades”, diz.
E se a maioria das editoras apostam em narrativas, há quem prefira seguir por via alternativa. É o caso da Panda Books, que lançou o “Minecraft de A a Z”, do jornalista Sergio Miranda, um almanaque com verbetes organizados em 170 blocos de texto. “Minecraft é um jogo aberto, isto é, ele não tem um fim. O sucesso do jogo, que se formos olhar de perto, é muito simples não só no visual mas também em sua estrutura, não quer dizer que ele não precise de uma referência, de uma ajuda”, diz o autor.
Tudo liberado (ao menos por enquanto)
Segundo Souza Filho, diversas editoras podem trabalhar com a marca por conta da natureza do jogo, que nasceu em meio a uma safra de games colaborativos, aberto para que os fãs fizessem suas próprias modificações e melhorias. Essa relação mais livre com a obra se estendeu para outros setores e uma enxurrada de subprodutos de “Minecraft” começaram a surgir, como os próprios livros.
“O Mojang [estúdio criador do jogo] inicialmente não fez nenhuma restrição a esses lançamentos. Por isso não há exclusividade de nenhum tipo quanto aos livros, desde que obrigatoriamente se informasse na capa que não eram livros 'oficiais'”, explica o jornalista e tradutor. Para citar um exemplo, na capa de “A Misteriosa Marca do Griefer” há o aviso: “Um Livro Extraoficial para Minecrafters”.
No entanto, talvez essa “farra quadriculada” esteja com os dias contados. “Devido a problemas legais da própria Mojang na Europa, a empresa mudou de estratégia e neste semestre ainda deve soltar uma série de restrições legais ao uso dos nomes e referências ao universo 'Minecraft'. Por enquanto, ninguém sabe que restrições serão essas”.
Novos clássicos juvenis?
Mas, afinal, o que esses livros podem proporcionar para o leitor? “O mesmo que os jogos representam: uma nova vida. Não é uma fuga da realidade, ao contrário do que a maioria pensa, mas sim um desenvolvimento de nossas habilidades e objetivos, além de um entretenimento saudável para sair um pouco desse caos político no qual vivemos”, acredita Thaluana.
Souza Filho, por sua vez, aposta justamente neles como uma ferramenta para a formação de leitores. “Qualquer iniciativa que envolva o lançamento de livros já me deixa animado. A interação que os games promovem entre o jogo e o jogador cria um fator de imersão que vai ajudar muito um leitor novo a mergulhar na história de um livro”, acredita.
Falando sobre suas traduções, ele ainda deixa transparecer uma visão quase que romântica. “Tenho um empenho muito pessoal nesses lançamentos dos livros baseados no universo 'Minecraft', pois eu sonho que eles façam por alguém o que a coleção Vaga-Lume fez por mim no início dos anos 1980: despertar a paixão pelos livros. Se um único leitor lembrar daqui a alguns anos de 'Galaxy Wars' como eu lembro de 'O Escaravelho do Diabo', 'A Ilha Perdida' ou 'O Rapto do Garoto de Ouro', tudo terá valido a pena”.
Quem sabe, né?
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