Quadrinista que está na Bienal do Rio "brinca" com Deus e critica fanáticos
"Em tempos de guerra não dá para fazer coisa fofa. Na época da ditadura, as músicas de sucesso iam contra ela. Antes a religião era ensinada na igreja, não no Senado. Quando vejo fanáticos que querem transformar as crenças religiosas em leis, não posso ficar quieto, preciso me posicionar em relação a isso com minha arte". A frase é do quadrinista Carlos Ruas, 30, autor das tirinhas de "Um Sábado Qualquer" e que estará presente em todos os dias da 17ª Bienal Internacional do Livro do Rio, que acontece até dia 13 de setembro no Rio, para autografar volumes com sua obra no estande da Aquário Editorial.
A declaração de Ruas vem após queixas de leitores sobre as histórias estarem cada vez mais ácidas e politizadas, algo que o autor assume. Interessado por religião e mitologia --e a forma como ambas se permeiam--, o quadrinista se apoiou nesses assuntos para criar um trabalho que costuma ser visto por cerca de 30 mil pessoas por dia em seu próprio site e é acompanhado por quase 2,5 milhões de seguidores no Facebook.
As tiras começaram a ser publicadas há seis anos, quando Ruas ainda batia cartão como designer gráfico e fazia sua arte nas horas vagas. Pouco tempo depois, com uma média diária já superior a 10 mil acessos no blog e observando a falência da empresa na qual atuava, decidiu que era o momento de viver daquilo que mais gostava de fazer.
A escolha da temática veio da vontade de mostrar, por meio do humor, como as verdades tidas como absolutas por algumas pessoas são, na verdade, totalmente relativas, variam conforme visões de mundo. "No hinduísmo as vacas são sagradas. Pra gente, o churrasco é sagrado. Então há esse contraste entre o que certo e errado para cada um", exemplifica.
Por viver em um país de maioria cristão, ele disse que foi normal que se apoiasse nessa mitologia para criar suas primeiras tiras. Com isso vieram personagens como Deus, Luci --sua versão de Lúcifer--, Adão e Eva, e que logo ganharam companhia. Darwin e Einstein, por exemplo, surgem como braço da ciência, enquanto na série "Boteco dos Deuses", antigas divindades, tais quais Thor e Odin, ganham espaço.
Acreditando que precisa estar presente em todas as mídias, Ruas já transformou o seu trabalho em três livros, dois reunindo as tiras da web e um almanaque que, além dos quadrinhos, propõe algumas atividades aos leitores. Sobre esse último, destinado principalmente a crianças, explica que serve para "ir contra a verdade absoluta, para mostrar as diversas formas de criações do mundo segundo várias mitologias, para que aprendam diversas verdades. Achar que só o que acreditam que está certo que leva à intolerância".
Isso vai ao encontro a outra de suas queixas. Ruas considera absurda a proposta do deputado Fábio Silva, que sugeriu multar quem satirizar religiões com o argumento de evitar situações como o atentado que ocorreu no início deste ano ao jornal francês Charlie Hebdo. "Seria a mesma coisa de proibir as pessoas de saírem de casa para que não sejam assaltadas", compara.
Problemas com fanáticos
Fazendo humor com religião e se apoiando na arte para levantar críticas à postura de muitos fanáticos, não é de se estranhar que Ruas tenha alguns problemas. O quadrinista conta que é comum, por exemplo, uma minoria denunciar suas tirinhas para a administração do Facebook com alegações das mais variadas. "São poucos, mas fazem barulho. Incomodam, mas só espero que o Facebook não compre as dores deles".
Como resposta direta a essas ações e outras críticas, contudo, prefere utilizar seu próprio trabalho. Dessa forma, criou a campanha “Jesus Sorria Mais”, que incentiva pessoas a retratarem o símbolo máximo do cristianismo em situações felizes, e ironizou quem acha pecado rir com Deus quando desenhou uma tirinha com seu personagem divino triste, sentando em um banquinho de balanço, sem ninguém por perto, acompanhado somente da frase “Com Deus não se brinca”.
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