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Marcelino Freire na Flip: "Roberto Saviano não veio, problema dele"

Rodrigo Casarin

Do UOL, em Paraty

02/07/2015 22h51

Marcelino Freire é o criador da Balada Literária, um dos principais eventos de literatura de São Paulo, que cresceu nos botequins da cidade. Nada mais justo que ele, autor de “Angu de Sangue” e “Nossos Ossos”, dentre outras obras, inaugurar a “faixa boêmia” desta edição da Flip, com conversas que começam às 21h30, horário em que quase todos na cidade já estão tomando cerveja ou cachaça.

Foi aí que ele disparou: “[Roberto] Saviano disse que não veio porque o Brasil é um país arriscado. As pessoas aqui queriam abraçá-lo e beijá-lo. Não veio, problema dele!”. A declaração foi sobre o jornalista italiano perseguido pela máfia que era convidado da festa, mas desmarcou o compromisso alegando falta de segurança.

Na mesa intitulada "Do Angu ao Kaos", seu parceiro de conversa era outro que fazia jus ao horário: Jorge Mautner. Músico tropicalista responsável por clássicos como “Maracatu Atômico”, Mautner também é escritor, dono de uma obra que inclui “Filho do Holocausto” e “Jorge Mautner”, livro com seu próprio nome que reúne suas entrevistas. Em uma conversa que Paulo Werneck, curador da Flip, define como “proibida para menores”, os dois cantaram “Salve nosso líder para o que der e vier. Salve nosso líder, salve Jorge Mautner”. Em seguida, Marcelino comentou brevemente a não vinda de Saviano, além de criticar a aprovação em primeiro turno da redução da maioridade penal, com a mudança de posição de diversos deputados. Ele lembrou um jovem que foi recentemente morto no Rio de Janeiro por policiais do Bope e garantiu que escreve "para se vingar" de fatos como esses.

Problemas artificiais

Mautner optou por começar falando do Brasil, com ênfase na política. Para ele, por conta dos recursos naturais do país, seus problemas são artificiais, ressaltando que a nação vive o aperfeiçoamento da democracia. Exemplificou que temos os maiores aquíferos do planeta, portanto a seca só pode ser um problema artificial, causado por interesse de “coronéis”. Afirmou também que alimentamos a China, o que afastaria a fome da aparente complexidade que a envolve.

Já Marcelino levou o papo para o aspecto literário, ainda que também com viés politizado. “Eu escrevo gritos”, disse sobre um texto em que seu personagem renega a paz. “Também falo de amor, de amores assassinos, mas falo.”

Sobre a escolha do homenageado desta edição da Flip, agradeceu. “Eu, como homossexual, estou feliz com a homenagem ao escritor Mário de Andrade”, disse, enfatizando a diferença entre sua sexualidade e a admiração ao artista como tal, não por sua orientação.

Onda conservadora

A onda conservadora do país também foi tema da conversa, centrando-se na questão evangélica. Marcelino falou do problema que é “ir contra quem prega o amor. Às vezes, os verdadeiros assassinos pregam o amor. Astros televisivos, sacerdotes às vezes estão cometendo crimes e pregando o amor”. Depois, ponderou que “não são todos os evangélicos que são maquiavélicos, mas alguns”.

Já Mautner ressaltou o mérito dos evangélicos por, desde a época de Martinho Lutero, chegar onde a Igreja Católica não chegava. "É preciso separar, é uma minoria que ataca o candomblé", exemplificou. Ao longo de toda conversa o autor insistiu sobre o pacifismo que há no Brasil, mas alertou que em uma nação com mais de 200 milhões de pessoas, com crenças diferentes, insatisfações podem levar a atitudes extremadas e segregadoras.