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Recém-saído "BBB", Adrilles negocia publicação de seu 1º livro de poesia

Adrilles Jorge, que recentemente participou do "BBB" e negocia publicação de livro  - Divulgação/TV Globo
Adrilles Jorge, que recentemente participou do "BBB" e negocia publicação de livro Imagem: Divulgação/TV Globo

Rodrigo Casarin

Do UOL, em São Paulo

28/04/2015 06h00

Participante da última edição do “Big Brother Brasil”, o poeta Adrilles Jorge atualmente negocia os direitos para a publicação de um livro na editora Record. Sem dar muitos detalhes sobre a negociação, ele crê que sua recente participação no reality global não altera sua obra, apesar de ajudar a divulgá-la para um número maior de pessoas.

Segundo o ex-brother, a editora disse ter interesse essencialmente em sua arte. “A editora deixou bem claro que minha imagem como escritor é bastante superior à figura prosaica de um mero 'ex-BBB'”, afirma em entrevista ao UOL.

Adrilles, inclusive, parece não estar muito preocupado com o alcance de sua obra. “O principal ofício de um escritor é escrever. A publicidade de sua obra não é tanto da conta dele. Dois ou três leitores já trazem uma enorme satisfação. Kafka e Baudelaire eram pouco lidos em suas épocas e hoje podem ser considerados best-sellers históricos. Um escritor que se preocupa excessivamente com a repercussão numérica de sua obra perde tempo relevante de escrita.

Um dos muitos nomes que compõem a atual cena poética brasileira, o "ex-BBB" explica por que resolveu escrever poemas.  “Escrever poesia é uma tentativa de reconstrução, de reconfiguração da linguagem. A poesia é isto e eu escrevo poesia por isto: pela tentativa de reconfigurar, de desvendar, de criar o real da perspectiva de sua falta de sentido aparente, fora de objetivismos simplórios”. E continua: “Num mundinho contemporâneo afeito a objetivismos imediatistas, a poesia tem pouco espaço. Mas sempre teve pouco espaço por ser de difícil assimilação, justamente pelo seu aspecto conscientemente desnorteador de um sentido preciso”.”

Adrilles Jorge

  • Reprodução / TV Globo

    A relevância da poesia hoje e em qualquer época é a tentativa de elevar a humanidade além de si mesma. Mas isto não é relevante para a grossa maioria das pessoas, que não percebem o óbvio desta necessidade e que vivem como amebas funcionais

    Adrilles Jorge, poeta e ex-BBB

De fato, fora casos pontuais de grande destaque, como a repercussão de “Ligue os Pontos”, de Gregório Duvivier  –principalmente devido à fama do escritor como ator e humorista--, da presença de nomes periféricos como Alessandro Buzo e Sérgio Vaz em programas televisivos de grande audiência e de (raras) obras que conseguem reconhecimento, como “Um Útero É do Tamanho de um Punho”, de Angélica Freitas, a poesia brasileira só continua acontecendo e se fortalecendo dentro de seu próprio gueto. Isso graças a saraus e pequenas editoras, mas também a redes sociais e e-books, que possibilitam a divulgação da interessante produção que ocorre no país.

“A relevância da poesia é paradoxalmente absoluta em qualquer época. Explodir os sentidos básicos e aparentes de tudo que nos cerca, de tudo que nos é interno e externo; e, através desta explosão, criar algo além das sólidas ruínas movediças do cotidiano. A relevância da poesia hoje e em qualquer época é a tentativa de elevar a humanidade além de si mesma. Mas isto não é relevante para a grossa maioria das pessoas, que não percebem o óbvio desta necessidade e que vivem como amebas funcionais”, acredita Adrilles.

Os caminhos possíveis

Outro poeta, Junior Bellé, autor de “Trato de Levante”, argumenta que “vivemos a era dos poetas menores, o que não significa dizer que seja tempo da poesia menor”, com pessoas que não seguem mais, necessariamente, escolas, vanguardas ou correntes artísticas. “Mesmo os coletivos costumam apresentar uma variedade saudável e, ao meu ver, necessária de estilos, estéticas e temáticas.”

Bellé acredita que a poesia “precisa ser mais intragável que a prosa, ela tem um compromisso maior de mexer com vísceras, de revolver as entranhas” e diz ter sorte pelo fato de o número das vendas não ser pré-requisito para que “um livro seja ou não capaz de tocar o coração de alguém. A poesia sempre será relevante e, como disse Cazuza sobre o rock, a poesia também se faz para um e para 1 milhão”.

Apesar disso, o livro do poeta, “Trato de Levante”, conseguiu ir um pouco além de seu público habitual: amigos, amigos de amigos, alguns profissionais especializados e outros poetas. Dois de seus poemas foram musicados –“Teu Homem”, por Daniel Groove, e “Tempo das Horas”, por Saulo Duarte–, e “Trato de Levante” virou um curta-metragem homônimo, dirigido por Ale Paschoalini, com estreia prevista para maio.

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  • Paulo Belote/Divulgação/TV Globo

    Poesia deve ser lida e relida de maneira aprofundada, várias vezes, a fim de que sua miríade de significados e ressignificações possa ser apreendida de maneira mais fecunda

    Adrilles Jorge, poeta e ex-BBB

É Bellé quem indica o caminho que a poesia segue para encontrar seu espaço atualmente no país. “Ela acontece nos milhares de saraus que voltaram a se espalhar pelas capitais, nas feiras, nos encontros literários, nos sebos, nos grupos de leitura e em cada livro. Ela acontece numa postagem de Facebook ou de blog.”

Eventos como saraus, principalmente, vêm ocorrendo com constância tanto no centro de grandes metrópoles quanto em periferias afastadas. Se em São Paulo são mais de cem encontros desse tipo por mês, o mesmo acontece, ainda que em menor número, em cidades de todo o resto do país –seja no interior do Piauí, no litoral catarinense ou em universidades de Porto Velho. São oportunidades para os poetas exibirem seu trabalho, declamarem seus versos, conhecerem parceiros na arte e difundirem e comercializarem a sua obra.

Entretanto, há quem não aprecie muito essa forma de divulgação da poesia. “Acho [os saraus] interessantes, relevantes, mas nunca participei muito. São uma promoção decorativa para uns poucos aficionados, que amplia a vaidade dos autores, mas amplia muito pouco a divulgação da poesia. E confesso um certo preconceito com a poesia falada, declamada. Poesia não é letra de música. Poesia de verdade, de primeira grandeza, nunca é apreendida pela fala imediata”, diz Adrilles, que aposta principalmente na publicação em sites e redes sociais. “Poesia deve ser lida e relida de maneira aprofundada, várias vezes, a fim de que sua miríade de significados e ressignificações possa ser apreendida de maneira mais fecunda.”

Pequenas editoras

Olhando para o caminho convencional, o da publicação por meio de livros, poetas encontram seu espaço principalmente em pequenas editoras, como a 7 Letras, Oito e Meio, Edith, Demônio Negro, Cousa, Penalux, Substância e Kan. Normalmente, essas editoras trabalham com tiragens extremamente reduzidas, que, em alguns casos, não ultrapassam algumas poucas dezenas de exemplares.

A editora Patuá, por exemplo, que publicou o livro de Junior Bellé, tem tiragem inicial média de 120 exemplares. Quem comanda a empresa é Eduardo Lacerda, que, ao falar de poesia, tem uma visão semelhante à de Bellé e Adrilles. “Algumas pessoas estão sempre reclamando da falta de espaços, dos poucos leitores, mas a verdade é que, embora em alguns momentos a arte poética ganhe um pouco mais de espaço e repercussão, ela é uma arte de resistência, que pode passar longos períodos sem fazer parte do cotidiano da vida das pessoas, mas que está acontecendo secretamente e que uma hora explodirá”, acredita.

O editor explica que o mercado para os livros é diferente da produção, leitura e reflexão sobre a poesia. “Se esses três últimos têm deficiências sérias, principalmente a leitura e a reflexão,  já que acredito que a produção é excelente, o mercado de livros é incrivelmente grande. Claro, é preciso contextualizar isso, livros de poesia têm tiragens pequenas e vendem menos ainda, mas a quantidade de poetas querendo publicação faz com que seja um mercado riquíssimo.” Acreditando nisso, a Patuá já conseguiu figurar com obras dentre as finalistas de prêmios de prestígio, como o Portugal Telecom e o Jabuti.

Aposta no virtual

A e-galáxia, por meio da coleção Geleia Real, é outra editora que começa a dar espaço aos poetas, com títulos como “Estado de Despejo”, de Ricardo Rizzo, e “Poemas 1999 – 2014”, de Tarso Melo. Com uma produção alicerçada exclusivamente no digital, ela aposta nos e-books para que os poemas possam circular e ter maior visibilidade no meio virtual, principalmente nas redes sociais, podendo alcançar um grande número de pessoas.

Eduardo Lacerda

  • Algumas pessoas estão sempre reclamando da falta de espaços, dos poucos leitores, mas a verdade é que, embora em alguns momentos a arte poética ganhe um pouco mais de espaço e repercussão, ela é uma arte de resistência, que pode passar longos períodos sem fazer parte do cotidiano da vida das pessoas, mas que está acontecendo secretamente e que uma hora explodirá

    Eduardo Lacerda, editor da Patuá

Segundo Ronald Polito, coordenador da coleção Geleia Real, não há uma maneira melhor do que essa para divulgar poesia. Contrastando com a opinião de Lacerda, ele afirma que o mercado de livros do gênero é praticamente inexistente. “Não vejo como poderia ser de outra forma, tendo em conta que a poesia que me interessa é, por definição, antimercadológica. E não acho que essa situação já tenha sido diferente, como certas leituras nostálgicas e anacrônicas tentam propor. Poesia é um tipo de conhecimento especializado, que interessa a poucas pessoas, ainda mais num país de iletrados, que sequer leem prosa.”

Olhando para a produção contemporânea, Polito explica que, atualmente, os poetas brasileiros dialogam com majoritariamente com a poesia moderna, mas também com a concreta e a marginal. “Essas 'tradições' ainda não esgotaram seus desdobramentos possíveis, ainda que, em minha opinião, este processo esteja chegando ao fim. Nesse sentido, é notória a pouca presença de poéticas pós-modernas entre nós, talvez em decorrência da fixação em torno da pauta da 'realidade nacional' – sabe-se lá exatamente o que seja isso – como matéria para criação poética.”